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11 de Abr de 2025
Efeito 'motirô' é inspiração para engajar sociedade civil na COP de Belém
Organização da conferência recorre à tradição indígena para unir esforços de diversos grupos no enfrentamento da crise climática
11/04/2025
Juliana Causin
Na cultura tupi-guarani, o "motirô" representa a reunião de pessoas para construir algo coletivo, em prol do benefício comum. Diante das limitações nas engrenagens da diplomacia climática, e em um contexto político pouco auspicioso, a presidência brasileira da COP30 tem recorrido à tradição indígena para tentar desenhar uma espécie de "mutirão global" que una esforços de diferentes setores no enfrentamento crise climática.
O engajamento multissetorial foi evocado na primeira carta enviada à comunidade internacional pelo embaixador André Corrêa do Lago, presidente da COP30, semanas atrás. O documento convoca um esforço que inclua organizações da sociedade civil, setor privado, academia e representantes de povos originários. Ao citar 2024 como o ano mais quente da história, o diplomata admite que os mecanismos tradicionais de negociação se mostraram insuficientes. Diante disso, propõe que a COP30 seja um marcador de participação social, o que chamou de "movimento de movimentos".
Na prática, o país tem criado uma agenda de ações que inclui acordos setoriais, cúpulas paralelas e estratégias de financiamento.
O esforço de cooperação aos moldes "motirô" envolve alguns eixos, entre eles a criação de instrumentos de observação sobre compromissos internacionais. Em fevereiro, a Secretaria-Geral da Presidência criou um Grupo de Trabalho Técnico de Participação Social para coordenar iniciativas que fortaleçam a participação social na COP30.
No plano internacional, uma das iniciativas foi a proposta de criação do Balanço Ético Global, uma estrutura inédita e complementar às negociações formais que irá avaliar se a resposta climática global está à altura da urgência do momento atual. O fórum é inspirado no Global Stocktake, mecanismo que a cada cinco anos avalia o progresso dos países nas metas climáticas. O balanço pensado pelo Brasil, no entanto, vai em uma direção política: pretende ser uma espécie de "termômetro moral" no processo climático.
A avaliação, além de pesquisadores e técnicos, contará com representantes da sociedade civil global - ativistas jovens, representantes de povos indígenas, líderes religiosos, cientistas, artistas e filósofos.
Outra iniciativa brasileira para ampliar a capacidade de influência externa na conferência é a criação do Círculo de Liderança Indígena, que integra líderes de diferentes países. A intenção é que representantes de povos originários atuem como conselheiros dos negociadores em um espaço que se torne permanente para as próximas COPs.
'COP da esperança'
Organizações têm alertado que, para boa parte dos territórios indígenas, incluindo os da Amazônia, a crise climática não é uma ameaça do futuro, mas uma realidade para populações inteiras. As lideranças estimam a participação de 3 mil a 4 mil indígenas de todo mundo na COP30, projeção que supera em pelo menos 15 vezes a presença na COP de Dubai, até então aquela que mais teve a representatividade de povo tradicionais.
- Está sendo uma COP da esperança, por causa de pautas importantes. O evento é estratégico não só pelas estruturas diplomáticas em si, mas também pela articulação com outras alianças e pelo apoio para luta do movimento indígena como um todo - avalia Kleber Karipuna, coordenador executivo da Articulação dos Povos Indígenas do Brasil.
Embora as iniciativas em andamento possam ampliar os canais de escuta, elas têm caráter consultivo já que, pelas regras da Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre a Mudança do Clima, somente os países - e seus representantes oficiais - têm poder de decisão sobre os documentos finais da conferência.
A estrutura é similar aos fóruns de debate promovidos na presidência brasileira do G20: trazem engajamento da sociedade civil, juventude, movimentos indígenas, mas não garantem influência em decisões finais.
O desafio será injetar alguma ambição em texto final e pressionar negociadores por avanços. O trabalho envolve a busca por espaço na agenda de negociadores para tratar de temas como demarcação de terras indígenas e revisão das estratégias com combustíveis fósseis
Após três edições da conferência em países com restrições à liberdade de manifestação, a realização do encontro no Brasil tem reacendido a esperança de uma participação social mais ampla e ativa. Mesmo que o cenário geopolítico esteja marcado por barreiras à cooperação climática e pela baixa ambição nas metas nacionais, há entusiasmo nos bastidores da mobilização.
Para ativistas, empresas, organizações sociais e povos originários, um dos grandes desafios é identificar onde estão as oportunidades de incidência entre negociadores, com pautas que sejam incluídas nos chamados "itens de agenda".
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