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Editora UnB usou verba de índios para pagar tour pela Ásia

Correio Braziliense
Autor: Renato Alves
30 de Mar de 2008

Os documentos recolhidos pelos promotores, aos quais o Correio teve acesso com exclusividade, apontam que a viagem à Ásia e os gastos da comitiva que acompanhou o vice-reitor da UnB, Edgar Mamiya, no tour foram autorizados pelo então diretor-executivo da Editora UnB, Alexandre Lima (veja fac-símile). Ele também autorizou outros gastos considerados irregulares pelo Ministério Público do Distrito Federal (MPDF). São R$ 65 mil, que teriam sido usados em pagamentos de passagens aéreas, festas e artigos de luxo. Esse outro caso, já revelado pelo Correio, envolve o reitor da UnB, Timothy Mulholland. O MPDF acusa a Funsaúde de ter pago passagens aéreas para a mulher de Timothy, Lécia Mulholland, e para familiares de Alexandre Lima.

Segundo o dossiê em mãos dos promotores, o dinheiro destinado à melhoria da saúde dos índios das tribos ianomami e xavante (no norte do país) teria sido usado para pagar jantares que custaram cerca de R$ 40 mil. Pelo menos cinco aparelhos de TV de LCD, no valor de R$13,7 mil, e nove canetas Mont Blanc, ao preço de R$ 9 mil, também teriam sido financiadas. As passagens de Lécia Mulholland - ida e volta de Brasília a Teresina (PI) - custaram R$ 746. Segundo o Ministério Público, quem autorizou a despesa foi Alexandre Lima.

A Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) das ONGs convocou o ex-diretor-executiv o da Editora UnB para explicar a liberação de R$ 14 milhões, destinados a pagamento de serviços de terceiros, para a Funsaúde. Alexandre Lima, no entanto, faltou à sessão, realizada na última terça-feira. Ele alegou problemas de saúde, mas não informou de qual doença sofria nem seu estado clínico. O Correio ligou diversas vezes para o telefone celular de Lima, desde a última quarta-feira. Ele não atendeu nem retornou as ligações. Lima entregou, há uma semana, uma carta pedindo o afastamento do cargo e da coordenação do projeto até que as denúncias sejam apuradas. O reitor aceitou o pedido.

Empresários

Os donos da Faculdade Michelângelo que receberam, juntos, R$ 21 mil de diárias pela viagem à Ásia, são Stuart do Rêgo Barros Carício e Eliane Macedo Barreto Carício. O Correio tentou entrevistá-los durante os últimos quatro dias. Funcionários da faculdade pediram, quarta-feira, para a equipe do jornal enviar um e-mail à direção da instituição com as perguntas. Confirmaram o recebimento da mensagem na tarde de quarta-feira, mas, até a noite de ontem, ninguém havia respondido as questões.

Além das diárias, Stuart e Eliane ganharam da Editora UnB mais R$ 6 mil cada, em 6 de dezembro último. No portal Transparência Brasil, do governo federal, consta que o dinheiro foi destinado a "funcionamento de cursos de graduação", por meio do Programa Universidade do Século 21. A Faculdade Michelângelo oferece sete cursos de graduação, sendo quatro de bacharelado e três de licenciatura. Nenhum é da área de saúde. As aulas são dadas na sede da instituição, no terceiro andar do Blobo B do Shopping Venâncio 2000 (Setor Comercial Sul).

Ninguém da UnB concedeu entrevistas. As explicações foram dadas pela Secretaria de Comunicação (Secom) da universidade, por e-mail. Ela alegou que, dos seis integrantes da comitiva que não trabalham na universidade, um era intérprete. Já Stuart Carício "atuou em atividades associadas ao Projeto Parque Tecnológico Capital Digital", segundo a Secom. Stuart "organizou, junto ao escritório comercial de Taiwan em Brasília, encontros com empresários da área de Tecnologia da Informação de Taiwan, visando estabelecer parcerias técnico-cientí ficas e empreendedoras" , continua o e-mail encaminhado pela Secom da UnB.

Diárias

O órgão, no entanto, não explicou a presença de Eliane Macedo Barreto Carício na comitiva nem a função desempenhada por ela na viagem. Sobre o pagamento das diárias ter sido feito pela Funsaúde, a Secom afirmou não haver qualquer irregularidade "porque se trata de uma fundação de apoio e que visa apoiar projetos." A UnB entende que o giro pela Ásia era importante por ser um "investimento potencializado pela parceria entre estado, universidade e setor produtivo". Destaca ainda que a universidade terá parques científicos e tecnológicos na futura Cidade Digital.

A UnB alega desconhecer alterações na taxa de administração do contrato assinado entre a universidade e a Funsaúde, mas o reitor da instituição, Timothy Mulholland, mandou abrir sindicância para apurar o caso. Por meio de nota encaminhada pela Secom, ele rechaçou qualquer acusação que envolva seu nome no episódio. Sobre o pagamento de passagens para a mulher do reitor, a UnB informou ter sido um "equívoco" da empresa de turismo e que o dinheiro foi devolvido aos cofres públicos.

GASTOS EM 2007
Ao todo, a editora recebeu R$ 49 milhões do Ministério da Educação em 2007. Os maiores gastos com despesas correntes da Editora UnB no ano passado foram repasses para fundações de apoio à universidade. Só a Funsaúde ganhou R$ 13 milhões (26,5%). Quase todo esse valor é justificado como gastos em "atenção à saúde dos povos indígenas".

Por sua vez, a Fepad recebeu R$ 4,4 milhões da Editora UnB. Já a Fundação Universitária de Brasília (Fubra) ganhou R$ 1 milhão e, mais uma vez, esse montante também foi quase todo destinado à "atenção à saúde dos povos indígenas".

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