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Ecologistas defendem política ambiental pensada por todas as áreas

Radiobrás
26 de Set de 2006

Ecologistas defendem política ambiental pensada por todas as áreas

Por Lana Cristina, da Agência Brasil

Brasília - Fortalecer o Ministério do Meio Ambiente, politicamente e financeiramente, e incluir a questão ambiental em todas as políticas de desenvolvimento do país é o discurso dos ambientalistas ouvidos pela Agência Brasil. Eles consideram que meio ambiente não faz parte da plataforma política dos candidatos a presidente e criticam a falta de visão dos políticos em geral ao desprezar o tema.

"Acho que para reverter situações como esta não seria necessário um grande plano. Planos já existem. É um problema de diálogo entre as diversas áreas, mas também de poder. O Ministério do Meio Ambiente está fora dos processos das principais decisões de desenvolvimento nacional", lamenta o assessor de Políticas Indígena e Ambiental do Instituto de Estudos Socioeconômicos (Inesc), Ricardo Verdum.

Para ele, isso é fruto de uma visão atrasada de promover o desenvolvimento a todo custo. "Nós podemos ter desenvolvimento, podemos crescer, ter até mais de 4% de crescimento no PIB [Produto Interno Bruto], preservando o meio ambiente", estima engenheiro Gustavo Souto Maior, coordenador do Núcleo de Estudos Ambientais da Universidade de Brasília (UnB).

O pesquisador, que fez mestrado em economia e está no curso de doutorado em ciências ambientais, defende que o governo brasileiro insira o componente ambiental em toda política pública e analise o custo-benefício disso nos programas de desenvolvimento.

"A questão ambiental tem valor econômico. Não se trata de preservar só para fazer bonito. Mas quando a gente desmata, a gente está perdendo. Imagine se, ao derrubar uma floresta, derrubamos a fonte da cura para a Aids, por exemplo? Quanto isso valeria em termos econômicos para a sociedade?", questiona Souto Maior.

Os outros desafios, em termos de política ambiental para o próximo governo, apontados pelo pesquisador, são a destinação e o tratamento do lixo e a qualidade da água. De acordo com ele, são pouquíssimas as cidades brasileiras que têm uma gestão adequada de seu lixo. De recolhimento, tratamento, de onde esse lixo é disposto.

"Em Brasília, a capital da República, por exemplo, não existe um aterro sanitário sequer. E nós temos também um problema sério que é a qualidade da água dos nossos rios. Estamos perdendo alternativas de abastecimento de água devido a poluição. Isso devido a outro problema de ordem ambiental e sanitária, que é o baixo índice de tratamento de esgoto e também por causa da poluição industrial."

Meio ambiente deve ser visto como parte da riqueza nacional, dizem especialistas

Garantir a sustentabilidade ambiental foi um compromisso assumido pelo Brasil quando o governo assinou a Declaração do Milênio, em 2000. O documento, elaborado na Cúpula do Milênio (reunião de líderes do mundo inteiro) serviu para discutir o modelo de desenvolvimento que se pratica hoje e que objetivos devem ser alcançados para chegar ao desenvolvimento sustentável.

A adesão ao documento é um argumento a mais para ambientalistas brasileiros cobrarem dos candidatos a presidente quais são suas propostas na área ambiental. Foi o que fizeram oito organizações não-governamentais ao produzirem o processo de debates Brasil e Seus Rumos.

Os ambientalistas da rede de discussão elegeram temas estratégicos que devem fazer parte da elaboração de políticas públicas: infra-estrutura, energia, biocombustíveis, clima, biodiversidade, agricultura, água e cidades, juventude, rio São Francisco e os biomas brasileiros Cerrado, Amazônia, Caatinga, Mata Atlântica, Pampa e Pantanal. Até o dia das eleições, eles vão entregar aos candidatos o resultado dos debates que se estenderam nos últimos meses.

"Uma questão central para o Brasil seria que uma valorização do patrimônio cultural e natural do país. O Brasil tem um diferencial em relação aos outros países do mundo, suas florestas, a diversidade de povos e biomas, a miscigenação que a gente gerou. E essa riqueza toda não é valorizada pelos políticos, pelos governantes", critica a jornalista e assessora do Instituto Socioambiental (ISA), Adriana Ramos.

O ISA é uma organização não-governamental que atua nas questões ambientais e de inclusão social. Para os ambientalistas que promoveram o debate Brasil e Seus Rumos, a questão ambiental deve ser inserida nos planos de desenvolvimento do país e deve compor o cálculo do Produto Interno Bruto (PIB).

"É um indicador inadequado para medir perspectivas de melhora da qualidade de vida. É utilizado como meta de crescimento, mas na realidade seu aumento decorre normalmente do empobrecimento do capital natural e social do país, sem portanto, refletir sequer o crescimento real da economia", apontam no documento.

No tema infra-estrutura, a sugestão é recuperar e modernizar obras existentes dos setores de transporte e energia, como estradas e hidrelétricas inacabadas. Os ambientalistas esperam que o próximo governante revise a necessidade de construir novas represas, hidrovias e estradas.

O uso direto da energia solar para o aquecimento dos chuveiros é uma proposta apresentada pela geóloga Lúcia Ortiz, coordenadora-geral da ONG Núcleo Amigos da Terra. "Isso poderia representar uma economia de até 20% do crescimento do consumo de energia elétrica no horário de pico", afirmou. Segundo ela, a economia gerada será suficiente para abastecer todo o Rio Grande do Sul.

Outra preocupação de Lúcia na área energética é a possibilidade real de expansão da produção de biocombustíveis como o álcool e os óleos vegetais que devem ser adicionados ao diesel. De acordo com o programa de biodiesel do governo, deverá haver uma mistura de 2% de óleos vegetais a todo diesel consumido no país a partir de 2007 e um aumento para 5% no percentual de adição do combustível renovável em 2012.

"É um tema que é climático, é energético e é da agricultura. Acho que é o momento de questionar as práticas agrícolas do setor e incentivar a recuperação de passivos trabalhistas e ambientais", observou Lúcia.

O físico Délcio Rodrigues, ambientalista e pesquisador do Instituto Vitae Civilis, colaborou para a discussão do processo Brasil e Seus Rumos e registrou a necessidade de repensar o modelo que se quer para a produção de biocombustíveis.

Em seu texto de conclusão dos debates, Rodrigues lembra que a produção de combustíveis renováveis é positiva do ponto de vista climático porque propicia a redução da emissão de gás carbônico, substância responsável pela produção do efeito estufa.

Por outro lado, o físico registra que o uso de biocombustíveis implica em problemas sociais e ambientais. "A produção de etanol, a partir da cana-de-açúcar é uma história de concentração de terra na mão de poucos, de uso inclemente de monoculturas que diminuíram a biodiversidade e deslocamento de homens do campo para a periferia das cidades".

A sugestão dos ambientalistas é o aproveitamento de áreas degradadas para o plantio de culturas que geram biocombustíveis e a elaboração de uma política de agroenergia que estimule a produção agrícola familiar.

Os ambientalistas que participaram do Brasil e Seus Rumos concluem que eficiência é a palavra-chave quando o assunto é desenvolvimento.

"O Brasil não é eficiente. Nós temos que ser eficientes em todas as áreas, energia, transporte, agricultura, pecuária. Nós podemos, por exemplo, aumentar a eficiência agrícola ocupando áreas que já foram desmatadas e produzindo mais por cada hectare plantado", afirmou o biólogo Alcides Faria, diretor da Ong Ecologia e Ação (Ecoa).

Para os ambientalistas, o próximo governo tem que conter o avanço da fronteira agrícola e recuperar áreas degradadas, inclusive com políticas de crédito específicas para o uso dessas terras.

Desmatamento será principal problema do novo governo, segundo ambientalista

Reduzir o desmatamento será o principal desafio do próximo governante em termos de política ambiental, acredita o engenheiro Gustavo Souto Maior, coordenador do Núcleo de Estudos Ambientais da Universidade de Brasília (UnB). Não resolver o problema, para o pesquisador, poderá ter efeito até na política externa brasileira.

"Existe uma possibilidade grande de o Brasil sair da lista de país beneficiado do Protocolo de Quioto e passar para a lista de países que devem cumprir metas. Afinal, estamos em quarto lugar no rol dos que emitem gases causadores do efeito estufa", avaliou Souto Maior.

Segundo ele, como o Brasil não foi responsável por grandes índices de emissão de gás carbônico nos últimos 40 anos, o país pode 'vender' créditos de carbono a outros países que têm metas a cumprir na redução de suas emissões.

Assinado em 97 por países que integram as Nações Unidas (ONU), o Protocolo de Quioto entrou em vigor no ano passado com a adesão da Rússia e prevê a redução da emissão dos gases que provocam o chamado efeito estufa e, portanto, associados às mudanças climáticas registradas nos últimos anos.

A previsão do pesquisador se baseia no fato dos índices de desmatamento em todo território brasileiro serem cada vez mais crescentes. Em 500 anos, já se perdeu 300 milhões de hectares de cobertura vegetal.

Na Amazônia, região responsável por 75% dessas perdas, a taxa média de desmatamento anual entre 1990 e 2004 foi de 1,7 milhões de hectares. Ou seja, em 14 anos, perdeu-se o equivalente a 1,7 milhões de campos de futebol em florestas só na região amazônica.

O cerrado, a caatinga e a mata atlântica são outros biomas também pressionados. Há estudos de organizações não-governamentais e também de empresas de pesquisa vinculadas ao governo mostrando que a situação do Cerrado é crítica. Com o avanço da soja, o bioma perde 30 mil quilômetros quadrados por ano.

"Praticamente três quartos do desmatamento brasileiro são produzidos na Amazônia, mas há estudos desenvolvidos recentemente mostrando que, se o desmatamento no Cerrado continuar no ritmo atual, daqui a 40 anos, não vamos ter um metro quadrado sequer de cerrado no Brasil", alerta. A soja também avança na Amazônia, onde o desmatamento é causado ainda pela exploração madeireira e pela pecuária.

Radiobrás, 26/09/2006

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