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E proibido cortar. E a castanheira morre em pe

OESP, Vida, p.A27
25 de Set de 2005

É proibido cortar. E a castanheira morre em pé
Protegida por lei, mas sem floresta em torno, árvore-símbolo da Amazônia seca
Cristina Amorim
A proibição legal de derrubar a castanheira-do-pará, símbolo da Amazônia, cria cemitérios de árvores mortas em pé que cobrem a região de Marabá, no sudeste do Pará. Tudo por conseqüência do desmatamento à sua volta. A maioria da árvores é o que sobrou da exploração madeireira legal e ilegal.
O local era um pólo de castanhais até a década de 1950. Hoje, pequenas serrarias, espalhadas em cidades como São Domingos do Araguaia e São Geraldo do Araguaia, mantêm o corte a despeito do que diz a lei. Em uma operação de fiscalização do Ibama, os técnicos encontraram três serrarias dentro da zona urbana de São Domingos. Elas já haviam sido multadas antes por serrarem castanheira e serviam como depósito para árvores derrubadas.
Deitadas no chão, toras com 1,5 metro de diâmetro esperavam a vez para serem transformadas em material para construção civil. Marcas recentes no chão de terra mostravam que toras tinham passado por ali recentemente. No fundo, um monte com mais de 2 metros de altura de serragem vermelha, sobra de castanheira, virou palco de brincadeira das crianças.
Segundo o engenheiro florestal do Ibama Norberto Neves, as árvores encontradas ali eram bastante jovens, com cerca de 25 anos. Apesar da tenra idade, todas mostravam sinais de morte precoce.
A castanheira-do-pará (Bertholletia excelsa), em condições normais, pode viver de 500 a 600 anos dentro da floresta, produzindo frutos continuamente do alto de seus 50 metros de altura. A mata ao redor é essencial para sua sobrevivência, pois fornece proteção contra o vento, alimento para o solo e um caminho para que as abelhas polinizadoras façam seu trabalho.
A retirada progressiva da floresta em volta da castanheira a deixa isolada. A queimada que se segue, usada pelo homem para 'limpar' a área de cipós, pequenas plantas e animais, empobrece o já fraco solo amazônico e agrava a saúde da árvore. Combalida, ela resiste por pouco mais de uma década.
'Claro que existem castanheiras em pé há mais de dez anos depois da retirada da mata ao redor. Mas elas têm um sucesso reprodutivo reduzido ou igual a zero.' A explicação vem do pesquisador Carlos Peres, natural de Belém, mas trabalhando atualmente na Universidade de East Anglia, na Grã-Bretanha. Segundo ele, de pouco adianta manter a árvore em pé se não existe floresta para acompanhá-la, pois a abelha não chega até ela e não consegue carregar o pólen, interrompendo o fluxo gênico.
A área de vida, ou de distribuição, da espécie toma todo o bioma, inclusive na porção dos países vizinhos. Abundância mesmo ocorre no Brasil, onde a extração da castanha atinge 45 mil toneladas por ano, o que equivale a US$ 33 milhões. Só que a árvore tem rareado, e muito, em toda o arco do desmatamento, que compreende a área sul e leste da Amazônia.
Existem iniciativas para replantar a B. excelsa, como o projeto do 'tio João', em Marabá, e explorá-la de forma sustentável, como no Alto Cajiri, no Amapá.
Só que nem uma coisa nem outra tem sido feita sempre da melhor maneira.
A exploração indiscriminada e intensiva atinge principalmente as árvores jovens, o que não permite que haja renovação das velhas - um modelo que pode entrar em colapso em médio prazo.
Já o reflorestamento não funciona se não houver o plantio de outras espécies de mata nativa junto ou em uma área de mata secundária. 'A castanheira é uma árvore de floresta. Não adianta proteger um sem o outro', diz Peres. ?

OESP, 25/09/2005, p. A27

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