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Documentos atestam que Juca deu fazendas como garantia

FSP, Brasil, p.A4
31 de Mar de 2005

Papéis contradizem a versão apresentada pelo ministro
Documentos atestam que Jucá deu fazendas como garantia
Documentos que integram processos judiciais contradizem a defesa apresentada pelo ministro da Previdência, Romero Jucá (PMDB-RR), desde a revelação de que deu como garantia fazendas inexistentes, no interior do Amazonas, em empréstimo contraído no Basa (Banco da Amazônia).
Segundo o ministro, ele não é o responsável pela apresentação das garantias porque, na época do envio da relação dos bens ao banco, a empresa Frangonorte, de Boa Vista (RR), pertencia a Luiz Carlos Fernandes de Oliveira.
"As fazendas, portanto, foram dadas em garantia por Luiz Carlos, e não pelo ministro. Jucá apenas transferiu suas cotas na empresa ao novo proprietário, há oito anos, por meio de um documento citado pelo jornal [Folha]", diz nota divulgada pela assessoria do ministro na segunda.
Os papéis que integram o empréstimo, contudo, mostram que Jucá, além de fiador e pagador da operação, era o dono da Frangonorte na época da apresentação das fazendas aos representantes do Basa, em 12 de agosto de 1996.
O quinto instrumento de alteração contratual da empresa demonstra que, em 27 de agosto de 1996, 15 dias depois da assinatura do ato que tratou das novas garantias, Jucá seguia proprietário da empresa, ao lado do ex-governador de Roraima Getúlio Cruz. Nessa data (27 de agosto) eles aceitam pela primeira vez Oliveira como sócio, mas permanecem proprietários da empresa.
O sexto instrumento, portanto posterior ao quinto e ao dia 27 de agosto, não é datado. É apenas nele, que por sua vez nada fala sobre fazendas no Amazonas, que Jucá e Cruz cedem as cotas a Oliveira.
Quando é feito o registro do sexto instrumento de alteração contratual da Frangonorte, em janeiro de 1997, já havia se passado seis meses desde a apresentação das fazendas como garantia.
O fato de serem donos da Frangonorte em 12 de agosto leva Jucá e Cruz a assinarem o documento na qualidade de "fiadores e principais pagadores". Cruz também assina como responsável pela Frangonorte. Como Oliveira não era dono da empresa, aparece como "hipotecante interveniente" (terceiro que indica propriedade para hipoteca como garantia de pagamento de dívida de outros).
Essa figura, segundo especialistas ouvidos pela Folha e acórdãos de diferentes tribunais, não exonera a responsabilidade dos reais devedores. Jucá e Cruz são réus na ação de execução de dívida (R$ 18 milhões) movida pelo Basa na 11ª Vara Cível de Belém (PA).
O segundo ponto da defesa do ministro é relacionado à natureza do documento que trata da apresentação das garantias.
Em síntese, Jucá alega que o documento era parte de "consolidação das dívidas" da empresa com o banco e transferência de cotas entre sócios (de Jucá para Oliveira). Assim, Oliveira apresentou as garantias para o banco porque seria o novo responsável pela dívida. Contudo, o documento de que fala o ministro, de 12 de agosto de 1996, nada menciona sobre mudança de sócios ou consolidação de dívida, apenas relaciona as fazendas como nova garantia.
Em agosto, o banco cobrava garantias mais valiosas, pois a dívida aumentava. Por se tratar de apresentação de novas garantias, o banco acolheu os bens e concordou em assinar o papel, por meio de dois representantes: o gerente-geral interino, José Ferreira Neto, e a gerente de negócios interina, Marilda Okamura Abensur.Relatórios do Basa contrários à saída de Jucá da empresa mostram que dificilmente a instituição assinaria documento que tratasse de "transferência de cotas" a Oliveira, como diz agora Jucá.
A principal evidência de que o banco nunca aceitou, por escrito, a transferência das cotas foi produzida pelo próprio ministro. Em maio de 2004, ele abriu uma ação judicial contra o Basa na Justiça de Belém justamente com o objetivo de que o banco reconhecesse a transmissão das cotas para Oliveira, livrando o ministro do ônus da fiança e da responsabilidade pelo débito. Caso fosse correta a tese de que Jucá assinou o documento de transferência de cotas "com o banco" no momento em que Oliveira incluiu suas fazendas como garantia, simplesmente seria desnecessária a ação que ele próprio moveu anos depois.

Outro lado
Ministro evita comentar caso em entrevista coletiva
O assessor de comunicação do ministro da Previdência, Romero Jucá (PMDB-RR), procurado ontem e anteontem para falar sobre o pedido de esclarecimentos feito ao ministro pelo procurador-geral da República, Claudio Fonteles, não foi localizado.
Anteontem, Fonteles enviou ofício ao ministro lhe concedendo um prazo de 20 dias para que encaminhe, se achar necessário, documentos que considere relevantes a respeito do empréstimo.
No ofício, Claudio Fonteles informou que, pelas contas do Ministério Público, Jucá recebeu R$ 4,6 milhões em empréstimos do Banco do Brasil e do Basa (Banco da Amazônia) na época em que foi dono da empresa Frangonorte, de Boa Vista (RR), entre 1994 e 1996.
Foram deixados recados no telefone celular do assessor de Jucá ontem e anteontem. A assessoria de comunicação social do Ministério da Previdência, também procurada, não respondeu ao pedido de informações.
Em entrevista coletiva concedida ontem, em Brasília, o ministro não fez declarações sobre o empréstimo.(RV)

Procurador requisita ao Basa dados de operação
A representação do Ministério Público Federal no TCU (Tribunal de Contas da União) enviou ontem ofício ao Basa (Banco da Amazônia) requisitando dados sobre os empréstimos à Frangonorte, à época de Romero Jucá (Previdência). O banco tem dez dias para responder ao pedido.
O pedido se baseia em reportagens que a Folha vem publicando. Elas demonstram que Jucá tomou empréstimos do Basa para a Frangonorte apresentando garantias que não existem. O banco e o Ministério Público Federal já investigam o caso. Anteontem, o procurador-geral da República, Claudio Fonteles, deu prazo de 20 dias para que Jucá se explique.
Se identificarem indícios de irregularidade, o TCU deverá abrir processo contra Jucá para ressarcir os cofres públicos. O tribunal não tem competência de avaliar se houve crime e aplica apenas sanções administrativas.
O procurador Marinus Eduardo Marsico realizou ontem pesquisa no banco de dados do TCU para verificar se havia alguma ação do tribunal sobre os empréstimos, mas não encontrou nada. Por isso, decidiu solicitar ao banco os dados das operações.

FSP, 31/03/2005, p. A4

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