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Documento divulgado pelo Cimi critica governo Lula e afirma que "esperança cedeu lugar à perplexidade"

Folha de S. Paulo-São Paulo-SP
Autor: PAULO PEIXOTO
07 de Nov de 2003

Conselho indigenista vê governo "vacilante"

O presidente do Cimi, Franco Masserdotti (à esq.), e o arcebispo dom Luciano Mendes de Almeida

O Cimi (Conselho Indigenista Missionário), um braço da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil, acusou ontem o governo Lula de "continuísta e vacilante" e "sem compromisso" com a questão indígena. Para a entidade, a não-demarcação das terras indígenas seria a responsável pelos 23 assassinatos de líderes indígenas em dez meses de governo.
As acusações estão em um duro documento que tem como título "Governo Lula: A Morte Ameaça os Povos Indígenas". Foi o primeiro documento elaborado no Fórum Social Brasileiro, aberto ontem em Belo Horizonte.
O fórum brasileiro é um evento preparatório para o Fórum Social Mundial, que será realizado na Índia, em janeiro de 2004.
"Os povos indígenas, os pobres e os excluídos, sonhadores de uma nova sociedade, depositaram sua esperança no governo Lula. Porém, diante do quadro das violências, do não-cumprimento das promessas de campanha eleitoral e dos compromissos históricos de construção de uma nova sociedade, a esperança cedeu lugar à perplexidade."
Em entrevista, o presidente do Cimi, dom Franco Masserdotti, bispo de Balsas (MA), tendo ao seu lado o arcebispo de Mariana (MG) e ex-presidente da CNBB, dom Luciano Mendes de Almeida, comentou as mortes: "Nós estamos muito preocupados. Não pretendemos milagres, para tudo tem que haver tempo, mas a gente não vê sinais de mudança. A gente só vê continuísmo".
Segundo o Cimi, as mortes de índios na atual gestão representam quase o dobro da média de mortes ocorridas nos oito anos da gestão FHC (1995-2002), de 12,9 por ano. "A origem principal de tanta violência e morte, invasões e conflitos, saques e destruição tem sido a política da não-demarcação e garantia das terras indígenas", diz o Cimi, que afirma ainda que, das 23 mortes, apenas uma já chegou à Justiça. "Isso demonstra descaso", disse dom Franco.
No documento, o Cimi diz que a Casa Civil, comandada pelo ministro José Dirceu, "agravou" o problema ao submeter "arbitrariamente" a demarcação das terras a instâncias não identificadas com as questões indígenas, "numa clara demonstração de optar por caminhos que dificultem ou impeçam o reconhecimento constitucional das terras".
Segundo o órgão, essa questão deveria estar a cargo, por exemplo, de um conselho superior de política indigenista, com "participação decisiva" dos índios. Alega o Cimi que essa foi uma promessa de campanha de Lula.
Dom Luciano corroborou as acusações ao afirmar que, nos últimos 16 anos, 960 pessoas morreram no país por questões relativas aos conflitos por terras. Afirmou que, "se o governo decepcionou até agora", os movimentos sociais não podem ficar sem "progressividade". "A sociedade é mais do que governo. O governo é feito pela sociedade. Senão não é governo representativo, é governo autoritário", disse dom Luciano.
O Cimi diz ter sido "derrotado" com a demissão de Eduardo Almeida da Funai (Fundação Nacional do Índio), um órgão, segundo dom Franco, "reduzido na sua possibilidade de atuar".
O documento aponta também como agravante a "ingerência de governadores, prefeitos, deputados, senadores e vereadores, representando interesses econômicos, políticos e militares". Diz que o Poder Judiciário é "moroso e nem sempre isento".
O documento diz que o governo se submeteu à agenda do FMI e trocou o social pelo econômico.

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