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Direitos aos povos indígenas

Amazonas em Tempo-Porto Velho-RO
Autor: Castelo Branco
16 de Set de 2002

Por ocasião da Primeira Conferência de Pajés do Amazonas, realizada na segunda quinzena de agosto, no Instituto de Pesquisa do Amazonas (Impa), uma coisa ficou muito clara: os povos indígenas do Amazonas, representados por 120 mil pessoas, 62 etnias e 27 idiomas diferentes, não aceitam sobre qualquer pretexto nenhuma relação, seja com o missionário, o pesquisador ou com o turista, que eventualmente possa representar ameaça ou prejuízo para o índio.

O motivo é simples: a biopirataria, caracterizada pela expropriação da biodiversidade e dos conhecimentos tradicionais dos povos indígenas. Os números podem ser até exagerados, mas lideranças indígenas, como Jorge Terena, que atualmente é coordenador do Núcleo de Estudos e Análise de Propriedade Individual, garante que 120 produtos de uso clínico na medicina convencional (alopática) estão baseados no conhecimento do índio sobre determinada planta.

Os números vão muito mais além e dão conta de que as indústrias multinacionais movimentam algo em torno US$ 800 bilhões gerados de seus produtos biotecnológicos obtidos, também, do conhecimento indígena.

No Brasil, conforme ressaltou Jorge Terena, esses números despencam para UR$ 1 bilhão. E, quando se refere ao Amazonas, a situação fica mais complicada. Apesar da enorme biodiversidade, ele disse que no Estado são movimentados apenas UR$ 20 milhões por ano de seus recursos naturais.

Além das cifras apresentadas e discutidas na Primeira Conferência de Pajés do Amazonas, o que mais revolta os povos indígenas é a patente de determinados produtos "criminosamente" registrados no nome de pesquisadores que só tiveram o trabalho da coleta de informação e da confirmação do valor terapêutico de determinados vegetais.

"Você acha justo que o timbó, usado como anestésico na pescaria, seja patenteado no nome do pesquisador A ou do pesquisador B? O índio e o próprio ribeirinho do Amazonas usa o timbó para esse fim. Mas a patente é do homem branco. No meu vocabulário isso chama-se biopirataria, roubo, falsidade ideológica, apropriação indébita", revolta-se Terena.

Se a apropriação dos conhecimentos tradicionais dos povos indígenas é motivo de revolta, a bandeira desses produtos é motivo de total indignação. Segundo Terena, a patente ou é norte-americana ou européia. "Não temos conta da quantidade de produtos desenvolvidos nos Estados Unidos e Europa a partir dos conhecimentos de nossos pajés. Posso garantir que são muitos, como a curare, que é uma mistura de plantas venenosas, colocadas na ponta da flecha para imobilizar a caça. Eles nos roubaram o curare, um poderoso anestésico encontrado nos hospitais de todo o mundo", afirma.

Jorge Terena criticou, também, a falta de políticas e leis de proteção do conhecimento tradicional dos povos indígenas necessários para sensibilizar não só a sociedade, mas também os órgãos de pesquisa, universidades, o Estado e as próprias organizações indígenas.

Conforme observou, no Brasil existem catalogados 55 mil espécies de plantas, 524 espécies de mamíferos, 517 de anfíbios, 1622 de pássaros, 468 espécies de répteis, 3 mil de peixe e 15 milhões de insetos - todos à disposição de indústrias multinacionais, que têm auferido fabulosos lucros através de suas composições, como o veneno do sapo, secularmente manipulado pelos índios do Vale do Javari, por exemplo.

"Os povos indígenas não aceitam mais esse tipo de relação, que é dominadora, escravagista, colonial. Eles levam tudo e não deixam nada. Isso tem que acabar. O governo do Amazonas precisa adotar políticas que coíbam esses abusos. O homem amazônico e os povos indígenas não aceitam mais essa dependência, que só tem contribuído para o seu empobrecimento", adverte.

A primeira Conferência dos Pajés do Amazonas foi realizada com o objetivo de propor uma legislação estadual que garanta o direito à propriedade intelectual indígena e a repartição justa e eqüitativa dos benefícios derivados do conhecimento tradicional e da apropriação dos recursos biogenéticos.

Panorama sobre a fauna

Dados da Fundação Estadual de Política Indigenista (Fepi) dão conta de que no mundo existem 33 milhões de espécies, embora apenas 1,4 milhão tenham sido identificados. No Brasil apenas 14% da fauna e da flora são conhecidos.

O comércio de animais silvestre movimenta um volume de recursos da ordem US$ 20 bilhões por ano. Cerca de 12 milhões de animais, entre macacos, araras, jaguatirica, papagaios, serpentes, quelônios, borboletas e peixes tropicais são capturados em florestas, cerrados e em outros ambientes naturais do Brasil.

Já o Ministério do Meio Ambiente (MMA) assegura que aproximadamente 40% dos remédios produzidos mundialmente são oriundos direta ou indiretamente de fontes naturais, dos quais 30% de origem vegetal e 10% de origem animal e de microorganismos.

O Ministério do Meio Ambiente estima ainda que 25 mil espécies de plantas são usadas em todo o mundo para produção de medicamentos. Ele calcula que 120 produtos de uso clínico na medicina alopática são baseados em plantas de uso indígena.

Esses produtos são comercializados em grande quantidade na Itália, França, Reino Único, países asiáticos e nos Estados Unidos.

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