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Dinheiro para quem preservar a natureza

Correio Braziliense-Brasília-DF
02 de Set de 2002

Países em desenvolvimento aceitam reduzir a destruição ambiental em troca de parte do lucro das empresas que exploram a biodiversidade

Os governos de 190 países reunidos na Segunda Cúpula da Terra, na África do Sul, chegaram a um consenso sobre como reduzir a destruição da natureza e compartilhar os benefícios da degradação ambiental. Os países em desenvolvimento concordaram em estabelecer como meta a redução da perda de sua biodiversidade. Em troca, os desenvolvidos concordaram em compartilhar os lucros que suas empresas detentoras de patentes auferem com a exploração da biodiversidade e o conhecimento das populações tradicionais, como os índios.

Ministros do Meio Ambiente e das Relações Exteriores fecharam o acordo às 23h30 do sábado, numa rodada exaustiva de negociações. O texto que estará no Plano de Implementação da Agenda 21, o documento final do encontro, prevê a ''implementação mais eficiente e coerente de três objetivos: até 2010, uma significativa redução da taxa anual da perda de biodiversidade; o provimento de recursos novos e adicionais e recursos técnicos para os países em desenvolvimento; e a distribuição de benefícios para promover e resguardar a divisão justa e eqüitativa dos benefícios oriundos da utilização dos recursos genéticos.''

O termo biodiversidade é definido como a variedade de seres vivos terrestres, marinhos e aquáticos, e o sistema ecológico do qual eles fazem parte - florestas, caatinga, cerrado, etc. O Brasil é o país de maior biodiversidade do planeta. Para o governo brasileiro, um dos benefícios do acordo é a criação de um regime de trocas internacionais e de pesquisas conjuntas, que inibirá a biopirataria.

O consenso em relação a esse assunto é uma vitória para a delegação brasileira na Segunda Cúpula da Terra, que se manteve favorável às metas de redução das perdas de biodiversidade, mas exigiu das empresas de países industrializados a divisão dos lucros obtidos com a exploração desses recursos naturais e do conhecimento das populações locais.

Para Nurit Bensusan, do Instituto Socioambiental brasileiro, o acordo não vai prejudicar o desenvolvimento do país ao propor uma meta de redução da exploração da biodiversidade até 2010. ''Temos que investir no desenvolvimento sustentável. No entanto, esse esforço pode ficar comprometido caso não seja acompanhado de medidas para conter as mudanças climáticas e a produção de energia por matrizes poluentes'', disse Nurit, de Johannesburgo, ao Correio.

Energia nuclear
Numa importante vitória para os países em desenvolvimento, os ministros do Meio Ambiente e das Relações Exteriores aceitaram a inclusão, no Plano de Implementação da Agenda 21, do termo ''responsabilidade comum, mas diferenciada''. Isso significa que cada país deve arcar com o custo da reparação do dano ambiental proporcionalmente ao dano causado. Em outro avanço nas negociações, foram removidos vários obstáculos para a conclusão de um acordo sobre o estabelecimento de metas regionais voluntárias para o uso de fontes renováveis de energia. No entanto, o rascunho do texto final deixa uma brecha para que a energia nuclear seja, em alguns casos, considerada uma fonte limpa.

Caso essa decisão seja aceita pelos presidentes, a proposta original brasileira terá sido derrotada. Ela previa que os países adotassem pelo menos 10% de energia renovável - como a solar, eólica e de pequenas hidrelétricas - até 2010. No entanto, o parágrafo concluído ontem não fala em números, apesar de apoiar as fontes limpas de energia. É uma vitória dos países produtores e dos maiores consumidores de petróleo, como Arábia Saudita e Estados Unidos.

O texto final deverá agradar também ao Japão e à França, que consideram a energia nuclear limpa. ''É um argumento possível'', afirmou o ministro das Relações Exteriores, Celso Lafer, admitindo que o Brasil pode aceitar essa decisão. ''A França vai defender a energia nuclear porque é a energia de que ela dispõe e não vai aceitar que se delimite de forma tão clara seu uso, o que é natural'', explicou o ministro, lembrando que a Constituição brasileira estimula a utilização pacífica da energia nuclear, desde que tomados os devidos cuidados com a segurança.

Marcelo Furtado, coordenador do Greenpeace para a América Latina, é contra a postura da França e do Japão: ''Do jeito que está, o documento não só aprova o uso da energia nuclear nos países desenvolvidos, como a sua transferência para os países em desenvolvimento''. Ele e outros ativistas defendem a eliminação de todo o parágrafo caso permaneça essa formulação.

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