VOLTAR

Dinheiro de leilão pagará dívidas com garimpeiros, diz cacique Pio Cinta Larga

Site do ISA-Socioambiental.org-São Paulo-SP
Autor: Bruno Weis.
04 de Fev de 2005

A liderança índigena afirma que, ao pagar pelo aluguel das máquinas utilizadas no garimpo de diamantes, os índios deixam de investir em melhorias na saúde e educação de suas aldeias.

A maior parte dos R$ 716 mil arrecadados no leilão de diamantes organizado pela Caixa Econômica Federal (CEF), realizado na última quarta-feira (2/2) no Rio de Janeiro, será destinada à liquidação de dívidas dos Cinta Larga que vive na Terra Indígena Parque Aripuanã e Roosevelt (RO/MT) com os proprietários das máquinas utilizadas no garimpo. A afirmação é do cacique Nacoça Pio Cinta Larga da TI Roosevelt. "A gente vai pagar nossas dívidas e investir o que sobrar em infra-estrutura para o gado, como ração e cerca".

A extração mineral em Terra Indígena está prevista na Constituição Federal, desde que autorizada pelo Congresso Nacional, e submetida à consulta prévia das comunidades indígenas afetadas e à participação destas nos resultados da lavra. No entanto, a garimpagem por terceiros nestas terras é proibida. A Constituição prevê, ainda, que uma lei ordinária estabeleça as condições específicas para a mineração por parte dos índios. Essa lei ainda não foi aprovada. Por essa razão, a realização do leilão só foi possível por meio de uma Medida Provisória (MP) expedida pelo Governo Federal depois que 29 garimpeiros foram mortos na TI Parque Aripuanã, em abril de 2004.

Pio Cinta Larga é um dos dez índios indiciados pela Polícia Federal no inquérito que apura o assassinato dos garimpeiros. A investigação ainda não foi concluída e o inquérito corre em segredo de justiça na 1ª Vara Federal em Porto Velho. O cacique afirma que os Cinta-Larga desejam a regulamentação definitiva da atividade de extração dos diamantes. Isso permitiria, em sua opinião, a sustentabilidade econômica das comunidades indígenas. "Hoje falta de tudo nas aldeias, principalmente remédios".

Garimpo ilegal provoca conflitos e mortes

A Agência Brasileira de Inteligência (Abin) e a Polícia Federal estimam que US$ 20 milhões em diamantes extraídos do TI Roosevelt sejam contrabandeados para fora do Brasil. A TI - que ocupa uma área de 2,6 milhões de hectares nos estados de Rondônia e Mato Grosso - é considerada uma das dez maiores minas de diamante do mundo e está incluída na rota dos grandes traficantes internacionais de pedras. O garimpo ilegal nas terras indígenas atrai ladrões, prostitutas e traficantes para a região e já provocou a morte de dezenas de garimpeiros, índios e contrabandistas, além de causar graves danos ambientais, como o assoreamento do rio Roosevelt.

Pio Cinta Larga diz que o garimpo na Roosevelt está "quieto", mas que a relação com os donos das máquinas utilizadas na extração dos diamantes permanece desfavorável aos índios. "De cada 30 mil reais tirados das minas, 65% fica com os brancos e apenas 25% com nosso povo". Ele diz que os 10% restantes são destinados a cobrir os custos da atividade. A indigenista Maria Inês Hargreaves, que trabalha com os Cinta Larga em Rondônia e no Mato Grosso há 23 anos, afirma que eles precisam de um plano de gestão financeira para aproveitar os recursos oriundos da venda das pedras - caso a atividade seja regulamentada definitivamente.

Maria Inês esteve em dezembro passado nas terras Cinta Larga. Ela conta que os índios não acreditavam que o leilão da Caixa Econômica Federal fosse de fato reverter em algo significativo para suas comunidades. Para a indigenista, a quantidade leiloada - 665 quilates - é uma fração do que é comprado pelos contrabandistas. "Como os Cinta-Larga dependem dos chefes do contrabando, já que tentam dar conta disso sozinhos e não conseguem são pressionados a não negociar com órgãos oficiais e têm dificuldade em confiar no Governo Federal, provavelmente os grandes estoques não foram negociados", afirma.

O cacique Nacoça Pio Cinta Larga conta que nenhum representante de seu povo foi às cidades no entorno da TI Roosevelt para acompanhar o leilão, e tampouco viajou ao Rio de Janeiro. "O pessoal ficou com medo, achou que era uma armadilha, pois tem gente que acha que o índio é rico e pode querer assaltar". Os 727 diamantes leiloados pelo Governo Federal esta semana foram vendidos em 57 lotes. O dinheiro arrecadado será depositado nas contas dos Cinta Larga que, após entregar as pedras à Caixa Econômica Federal, tiveram contas abertas para essa finalidade. Após a edição da MP, a CEF montou por duas semanas postos para o recolhimento das pedras. Saiba mais sobre os Cinta Larga.

As notícias aqui publicadas são pesquisadas diariamente em diferentes fontes e transcritas tal qual apresentadas em seu canal de origem. O Instituto Socioambiental não se responsabiliza pelas opiniões ou erros publicados nestes textos. Caso você encontre alguma inconsistência nas notícias, por favor, entre em contato diretamente com a fonte.