VOLTAR

Desembargadores federais ouvem indígenas da Raposa Serra do Sol

Cimi-Brasília-DF
Autor: J. Rosha -
10 de Mai de 2004

Para conhecer o trabalho realizado pelo Exército Brasileiro na Amazônia, a realidade da faixa de fronteira e avaliar o seu valor estratégico, a convite do Comando Militar da Amazônia, uma comitiva constituída do Ministro Fernando Gonçalves, do Superior Tribunal de Justiça, de Desembargadores Federais do Tribunal Regional Federal - TRF, da Primeira Região e membros da Advocacia da União e do Ministério Público Militar, esteve em Roraima, na terra indígena Raposa Serra do Sol, no dia 7 de maio, onde também manteve contato com lideranças indígenas. No dia seguinte a comitiva visitou o Batalhão Especial de Fronteira em Surucucus, na Terra Indígena Yanomami. A comitiva esteve em Uiramutã - localizado a cerca de 400 quilômetros da capital, Boa Vista -, participando em duas reuniões: uma organizada por políticos e organizações contrários à homologação, e outra com a presença de mais de 700 indígenas de comunidades das regiões das Serras, Surumu, Baixo Cotingo e Raposa, que reafirmaram o desejo pela homologação em área contínua da terra Raposa Serra do Sol.

Passava das 16 horas quando a comitiva chegou, escoltada por soldados armados com fuzis e oficiais da Primeira Brigada de Infantaria de Selva e do Sexto Pelotão Especial de Fronteira - este último sediado em Uiramutã, próximo a malocas. Um coral de crianças recebeu os visitantes cantando em Macuxi. Após a saudação feita pelo coordenador do Conselho Indígena de Roraima - CIR, Jacir José de Souza, os desembargadores - a maioria vestindo uma camiseta camuflada do Exército - foram convidados a se apresentar. Um oficial do Exército tomou a palavra e anunciou que eles nada iriam falar. "Eles vieram aqui para ouví-los. Não é só para visitar a questão da Raposa Serra do Sol. A finalidade principal da viagem da comitiva é conhecer o trabalho do Exército na Amazônia, entender a problemática da região, principalmente o que ocorre na faixa de fronteira", disse o oficial Jaborandy.

Sem sequer dizer umas poucas palavras de saudação aos indígenas, os representantes do Judiciário ouviram, certamente, o que os oficiais militares não queriam. No pronunciamento das lideranças indígenas, principalmente das malocas próximas à sede do quartel, e no documento entregue ao presidente do TRF, Aloíso Palmeira, por várias vezes foram citados conflitos resultantes da presença de militares em meio às comunidades.

A reclamação dos indígenas é que a presença dos soldados e os exercícios militares - como as operações "Caçador I" e "Caçador II" - causam intimidação e medo aos moradores, perseguição, dentre outros casos. A coordenadora da Omir - Organização de Mulheres Indígenas de Roraima, Lavina Salomão, disse que os soldados também já engravidam as moças das aldeias. O exemplo disso é o caso da jovem Renuildes Pereira da Silva, que engravidou de um soldado e encontra dificuldade para o reconhecimento de paternidade do filho Deivison Roni, fruto de um relacionamento com um soldado que serviu no 6o Batalhão Especial de Fronteira (ver www.cir.org.br/noticias_030605.asp).

"Não somos contra o Exército. Já existe um quartel em Normandia - localizado a cerca de 100 quilômetros de Uiramutã - e eles (os militares) podem ficar lá que não vai incomodar", explicou o tuxaua de Uiramutã, Orlando Pereira da Silva. "Nós tememos que a construção do quartel sirva para trazer outros não indígenas para cá, como fazendeiros, comerciantes, marreteiros e outros", disse o tuxaua Orlando.

Para Jecinaldo Barbosa, coordenador da Coiab (Coordenação das Organizações Indígenas da Amazônia Brasileira), é preciso buscar, com o Exército e com o Estado Brasileiro, um relacionamento claro, coerente que respeite esse país multicultural. "É uma vergonha o que passamos no Brasil dito de todos", critica Jecinaldo. "A regularização do território Raposa Serra do Sol para os povos indígenas da Amazônia e do Brasil, é o divisor de águas que vai mostrar para onde vai caminha a política do Governo. Para isso é preciso que se anule a liminar concedida pelo juiz Helder Girão. Acreditamos na sensibilidade do Poder Judiciário para com a questão social. Tudo isso que vocês viram de negativo foi por omissão do Estado", concluiu o coordenador da Coiab.

A comitiva de desembargadores do TRF da 1ª Região era composta pelo presidente do TRF, Aloísio Palmeira, e pelos desembargadores Daniel Paes Ribeiro, Jirair Aram Megueriam, Luiz Gonzaga Barbosa Moreira, Selene Maria de Almeida e Sebastião Fagundes de Deus. Também integraram a comitiva, além do já citado Ministro Fernando Gonçalves do STJ, o Consultor Geral da União, Manoel Wolkmer de Castilho, a Procuradora Geral da Justiça Militar, Maria Ester Henriques Tavares, o Corregedor-Geral do Ministério Público Militar e a Procuradora Regional da União da 1ª Região, Hélia Bettero. Selene Maria de Almeida é a relatora dos três Agravos de Instrumento interpostos pela Funai, pelo Ministério Público Federal e pelas comunidades indígenas contra a decisão liminar concedida, na ação popular proposta contra a demarcação da terra indígena Raposa Serra do Sol. A decisão liminar foi concedida pelo juiz Helder Girão Barreto, da Primeira Vara Federal de Roraima, no dia 04 de março passado, suspendendo parcialmente os efeitos da Portaria no 820/98, do Ministro da Justiça que delimitou a terra indígena Raposa Serra do Sol e determinou sua demarcação administrativa, efetivada em 1998 e em 1999.

Além do CIR, estavam presentes à reunião na maloca Uiramutã representantes da Organização de Mulheres de Roraima - Omir, Associação dos Povos Indígenas de Roraima - Apir e organização Taurepang, Wapixana e Maxuci - TWM.

As notícias aqui publicadas são pesquisadas diariamente em diferentes fontes e transcritas tal qual apresentadas em seu canal de origem. O Instituto Socioambiental não se responsabiliza pelas opiniões ou erros publicados nestes textos. Caso você encontre alguma inconsistência nas notícias, por favor, entre em contato diretamente com a fonte.