VOLTAR

Dendê no Brasil: ideia de grandes proporções

O Eco - www.oecoamazonia.com
Autor: Karina Miotto
10 de Jun de 2010

Na primeira semana de maio, o presidente Lula visitou a cidade de Tomé-Açu, no Pará, com a missão de lançar o Programa de Produção Sustentável de Palma de Óleo, cujo objetivo é aumentar a produção de dendê no país sob o lema da sustentabilidade.

Um Zoneamento Agroecológico (ZAE) feito em parceria com a Embrapa define a plantação em áreas degradadas ou desmatadas de 14 Estados: Alagoas, Bahia, Pernambuco e Sergipe no Nordeste, Rio de Janeiro e Espírito Santo no Sudeste e Acre, Amazonas, Amapá, Maranhão, Mato Grosso, Pará, Rondônia e Roraima (todos da Amazônia Legal).

Foram identificados 31,8 milhões de hectares para o cultivo, mais do que o dobro da área mundial, o que deixa clara a magnitude do programa. No entanto, inundar o Brasil de dendê é algo que, para alguns, não é possível. "Dizer que 32 milhões de hectares estão aptos para o plantio não significa que ele será feito em toda esta área", informa José Manuel Cabral, chefe de comunicação e negócios da Embrapa Agroenergia.

"O Brasil não vai saltar para um milhão de hectares de um dia para o outro. Se for muito bem feito, levará uns 15 anos", afirma João Meirelles, diretor do Instituto Peabiru e um dos responsáveis pelo programa Dendê Sustentável, que realiza em parceria com o Grupo Agropalma, maior empresa privada de produção de dendê na América Latina, com sede no Pará.

Para incentivar a produção, o governo prevê linhas de crédito a pequenos, médios e grandes agricultores. Além disso, investirá em capacitação técnica, inovação tecnológica e melhoramento de sementes (neste caso, com R$ 60 milhões vindos de recursos públicos). A produção de dendê pode suprir a demanda interna do país, gerar empregos, fortalecer a agricultura familiar, um hectare de palma adulta armazena 26 toneladas de carbono. No entanto...

De olho nos riscos

Dos quase 32 milhões de hectares identificados, 28 milhões estão na Amazônia Legal, a maior parte no Pará. De acordo com Valmir Ortega, da Conservação Internacional (CI), a monocultura extensiva de dendê pode causar inúmeros impactos na região.

Para citar alguns, mudança de uso do solo, risco de concentração fundiária, perda de biodiversidade, disseminação de pragas e doenças e degradação do solo e da água, além da migração de populações da zona rural e de trabalhadores de outras regiões, o que pressionaria a infraestrutura e a capacidade de serviços públicos locais. "Supondo que para cada dez hectares de palma temos uma mão de obra direta, chegaríamos a quase 3 milhões de pessoas - onde iríamos colocar tudo isso de gente na Amazônia?", questiona Marcello Brito, diretor comercial do Grupo Agropalma.

O aumento da produção de dendê na Amazônia também pode resultar em novos desmatamentos por mãos de pecuaristas, sojeiros e afins. "A indução da mudança do uso do solo, sobretudo através da introdução de monoculturas extensivas, impõe o grande risco de promover o deslocamento de atividades que atualmente ocupam essas regiões, estimulando novos desmatamentos. No caso da Amazônia essa é, sem dúvida, a maior preocupação e a mais difícil de monitorar", afirma Valmir.

Para que isso não aconteça, o governo definiu uma série de mecanismos. Para começar, só entra na linha de crédito o produtor que tiver o Cadastro Ambiental Rural (CAR) em dia. A plantação será proibida em áreas desmatadas depois de 2008 e um Projeto de Lei para vetar novos desmatamentos em função do dendê e para impedir o licenciamento ambiental em áreas não indicadas pelo ZAE foi enviado ao Congresso, mas ninguém diz se e quando ele vai virar lei de fato.

Dendezeiros não poderão ser plantados áreas protegidas - "tudo que é patrimônio do país em termos de conservação da biodiversidade e proteção das populações tradicionais está excluído do processo", afirmou a Ministra do Meio Ambiente.

Tais estratégias barrariam legalmente o avanço do desmatamento, mas "a implementação da lei será um grande desafio", afirma Marcello Brito. "As medidas adotadas são fundamentais, mas insuficientes, sobretudo se considerarmos que o controle ambiental, o licenciamento dos projetos e o monitoramento dos impactos serão realizados por órgãos ambientais estaduais em sua maioria desaparelhados para atender demandas atuais e, portanto, com baixa capacidade para controlar a expansão de novas atividades geradoras de impacto e/ou degradação", complementa Ortega. De acordo com ele, o monitoramento deste programa deve ser feito com transparência pública, acompanhar a expansão dos plantios e avaliar riscos de novos desmatamentos e de impactos sociais sobre as comunidades locais.

A plantação sustentável de palma de óleo no Brasil alia aspectos positivos a grandes riscos. Resta saber se esta nova empreitada do governo, lançada estrategicamente em ano eleitoral, não aumentará o desmatamento da Amazônia. Quando Lula subiu ao palanque em Tomé-Açu, afirmou que "vai ser proibido cortar uma árvore sequer para plantar a palma". Veremos.

O mercado de dendê

O dendê é uma palmeira de origem africana. Seu óleo é utilizado na indústria de alimentos, na produção de cosméticos e na indústria química, onde também é encontrado na composição de biocombustível. De 1998 a 2009, seu consumo saltou de 17 para 45 milhões de toneladas e hoje é um dos óleos mais produzidos do planeta. Pesquisas apontam que países da União Europeia, China e Índia aumentarão o uso de biocombustíveis nos próximos anos, o que exige desde já mais plantios de dendê, pois a palma só dá frutos depois de três anos de plantada.

Acontece que a nova galinha dos ovos de ouro do mundo desenvolve-se muito bem em climas tropicais úmidos com alta pluviosidade. Cresce tão bem em florestas tropicais que tem se transformado no pesadelo de ambientalistas que lutam pela preservação das florestas asiáticas - se na Amazônia o que mais empurra o desmatamento para dentro da mata é o gado, na Ásia é o dendê. Não à toa, Indonésia e Malásia são os dois maiores produtores do mundo, seguidos pela Tailândia. Colômbia aparece em quarto lugar e é o número 1 da América Latina, onde em segundo lugar vem o Equador e, depois, Brasil.

De acordo com a Federação Nacional de Cultivadores de Palma de Óleo (Fedepalma), da Colômbia, a plantação no país não resulta em desmatamento, "já que ocupamos territórios antes utilizados para outras atividades agropecuárias". No Equador, apesar de o avanço da fronteira agrícola estar entre as principais causas do desmatamento, de acordo com Rodrigo Sierra, PhD, pesquisador da organização equatoriana EcoCiencia e do Instituto de Estudos Latinoamericanos da Universidade do Texas, "a maioria das plantações de dendê estão na chamada 'costa pacífica úmida', que não se trata de floresta amazônica".

http://www.oecoamazonia.com/index.php?option=com_content&view=article&i…

As notícias aqui publicadas são pesquisadas diariamente em diferentes fontes e transcritas tal qual apresentadas em seu canal de origem. O Instituto Socioambiental não se responsabiliza pelas opiniões ou erros publicados nestes textos. Caso você encontre alguma inconsistência nas notícias, por favor, entre em contato diretamente com a fonte.