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Definição de caminhos

Valor Econômico, Especial Logística, p. F1, F2, F4 e F6
26 de Mar de 2012

Definição de caminhos

Para transportar sua produção da lavoura até um porto de embarque, produtores de soja gastam US$ 85 por tonelada, quatro vezes mais que seus concorrentes na Argentina e nos Estados Unidos. Tivessem uma qualidade de logística semelhante à dos rivais, poderiam embolsar até R$ 6 a mais por saca. No Porto de Santos, somente 1% dos contêineres chega pelos trilhos. A maioria esmagadora vem pelos caminhões, que respondem ainda por quase 60% da movimentação das cargas no país, e trafega sempre em rodovias longe da condição ideal. Dos pouco mais de 1,5 milhão de quilômetros de estradas que cortam o Brasil, apenas 13,5% são pavimentados. Em um contexto de acirramento da concorrência, tanto no mercado interno quanto externo, um dos principais desafios nos próximos anos será desenvolver uma matriz de transportes mais eficiente e com integração entre os vários modais.
De um lado, empresas têm investido para aumentar a eficiência de sua logística. De outro, o governo busca ampliar os recursos destinados para a área. O Programa de Aceleração do Crescimento 2 (PAC 2), iniciado em 2010, prevê investimentos de mais de R$ 100 bilhões em transportes. Na área de ferrovias, prevê-se a construção da Nova Transnordestina e da Ferrovia Norte-Sul; no modal aeroviário, a aposta são as concessões. Nas rodovias, há obras ao longo de pouco mais de 50 mil quilômetros de estradas. "As concessões de aeroportos trarão R$ 16,7 bilhões em investimentos nos próximos anos e há mais de 3 mil quilômetros de obras em ferrovias", afirmou Miriam Belchior, ministra do planejamento, no balanço do PAC.
Com os investimentos, governo e empresas buscam melhorar e equilibrar a matriz de transportes nacional, ampliando a participação de ferrovias, hidrovias e da navegação de cabotagem e aumentando as opções de escoamento da produção. Integrante do PAC, o sistema logístico multimodal de etanol prevê o uso de 1.300 quilômetros de dutos e da hidrovia Tietê-Paraná para transportar até 21 bilhões de litros do biocombustível por ano. Com previsão de início das operações em 2013, o investimento chega a R$ 6 bilhões. "Hoje esse transporte na região metropolitana de São Paulo, Vale do Paraíba e Rio de Janeiro é feito em grande parte por caminhões. Esse novo sistema é um projeto transformador, que reduzirá custos, emissões e o número de caminhões nas estradas", afirma Paulo Roberto de Souza, presidente da Copersucar, uma das sócias da Logum, empresa responsável pela implantação do sistema.
"Os investimentos poderão contribuir para reduzir a presença predominante das rodovias, mas nessa década não haverá grandes modificações e há ainda muitos desafios, principalmente em relação aos projetos do governo", afirma Paulo Fleury, diretor do Instituto de Logística e Supply Chain (Ilos). Um desafio será vencer obstáculos ambientais e jurídicos para avançar com as obras com eficiência. Segundo o último balanço do PAC 2, anunciado neste mês, 8% das ações da área de transporte estão em ritmo preocupante. Trechos da Transnordestina e da Ferrovia Norte Sul mais lentos que o previsto, seja por questões jurídicas, seja por demora em desapropriações.
Para superar os obstáculos, será preciso aumentar investimentos e ampliar as opções modais. Segundo Pesquisa de Rodovias da Confederação Nacional dos Transportes (CNT), em 1975 investiu-se 1,84% do PIB em infraestruturas de transportes, enquanto que no fim da década de 1990 essa média foi de 0,23%. Com o PAC, o número tem crescido e hoje está acima de 0,8% do PIB, um valor abaixo do verificado em outros países emergentes - Rússia, Índia e China -, que investem de 7% a 10% do PIB no setor. "O capital privado é parte essencial da equação de melhoria. As concessões poderiam ser aceleradas, com o aumento de fluxo de veículos, e algumas estradas podem tornar-se viáveis para a iniciativa privada", comenta Paulo Godoy, presidente da Associação Brasileira da Infraestrutura e Indústrias de Base (Abdib).
Outra preocupação é fazer com que os investimentos em cada modal sejam feitos de forma paralela. "É essencial que a melhoria dos modais seja acompanhada pelo aumento da capacidade portuária, que é um grande gargalo", diz Luiz Fayet, consultor da Confederação Nacional da Agricultura (CNA). Estima-se que cerca de 45 milhões de toneladas de grãos produzidas nas regiões Norte, Nordeste e Centro-Oeste são deslocadas, principamente por estradas, para portos da região Sul e Sudeste, por falta de opções logísticas próximas às regiões produtoras. Para que o agronegócio continue sendo competitivo, é essencial melhorar a logística. "Hoje grande parte do transporte é feito sobre rodas, pela falta de opção competitiva", analisa.
Um exemplo dos desafios para aumentar as opções modais pode ser visto no mais rico Estado do Brasil: São Paulo. Com 13 quilômetros de cais, o Porto de Santos é o maior do Brasil. Estima-se que a movimentação de cargas pule das atuais 100 milhões de toneladas para 230 milhões em 2024, enquanto a circulação de contêineres deverá passar de 2,8 milhões de TEUs (contêiner de 20 pés) em 2011 para 9 milhões de TEUs em 2024. Para chegar a esse resultado, será preciso ampliar a participação da ferrovia no porto. Para isso, um nó a ser desatado está na região metropolitana de São Paulo, onde trens de carga disputam espaço na mesma linha com vagões de passageiros.
O problema dificulta a chegada dos trens ao Porto de Santos - em alguns casos a travessia das cargas é feita apenas de madrugada, quando o volume de passageiros cai. A solução para o impasse seria a construção do Ferroanel, um anel ferroviário que circundaria a região metropolitana de São Paulo, retirando a circulação de cargas da linha de passageiros. "Esse é um dos maiores gargalos do país", afirma Rodrigo Vilaça, presidente da Associação Nacional dos Transportes Ferroviários.
O excessivo peso do transporte rodoviário é sentido no bolso. Os custos logísticos hoje chegam a 10,6% do PIB, um número quase 50% mais alto do que os 7,7% verificados nos EUA. Se o Brasil tivesse uma matriz de transportes tão eficiente quanto a americana, os empresários economizariam R$ 90 bilhões por ano, segundo estimativas de Paulo Fleury.
Ele lembra que os custos vêm caindo: em 2008, estavam em 10,9% do PIB. Mas será difícil manter a trajetória de queda, já que o preço do transporte, que responde por cerca de 60% dos custos logísticos, deve subir.
"O poder de barganha do caminhoneiro autônomo, que respondia por metade da frota e que chegava a receber 60% do custo do trabalho que fazia, caiu muito por conta de restrições ambientais a veículos mais velhos, maior fiscalização e a redução da informalidade no segmento", afirma Fleury. Quando a economia ia mal, um trabalhador demitido recebia seu FGTS e buscava no caminhão e na informalidade uma forma de ganhar dinheiro. Com a economia em expansão, novas oportunidades surgiram, o que também reduziu o papel dos autônomos no transporte rodoviário de cargas.
Em comparação a países que também têm grande extensão territorial, o Brasil conta com uma matriz de transportes que destoa. Nos EUA, 43% da circulação de cargas é feita por ferrovias e 32% pelas estradas, enquanto na China 50% é feita pelas rodovias e 37% por trilhos. No Brasil, quase 60% das cargas trafegam sobre rodas, sendo que apenas 13,5% de todas as estradas existentes no país são pavimentadas. Essa desigualdade é histórica e vem desde a década de 1950, com a vinda das montadoras. "Mudar esse retrato levará tempo, mas é urgente acelerar os esforços para essa mudança, quanto mais demorar, maior o custo e a dificuldade."

Governo prepara novo tipo de concessão
Rodovias. No modelo de PPPs, pagamento de serviço do concessionário é feito pela administração pública

Carmen Lígia Torres

Depois de 15 anos de experiências em concessões de rodovias, e saldo de 5.238 km de federais e 10.471 km de estaduais nas mãos da iniciativa privada, tanto o governo federal como os estaduais cogitam ampliar o modelo de Parceria Público-Privadas (PPP) para a tarefa de manter, conservar, recuperar e ampliar a malha de estradas pavimentadas do país.
Até agora, à exceção de 372 km da estadual MG-050, as concessões brasileiras estão sob o guarda-chuva da Lei 8.987, que prescreve a delegação do serviço público à iniciativa privada mediante licitação e subsequente contrato de concessão com base em definições de tarifa inicial de pedágio, de investimentos e de prazos de cessão. Isto é, o pedágio é a fonte principal de recursos para as obras a serem efetuadas nas vias.
Os dois novos trechos federais definidos para licitação em curto prazo seguirão esse modelo, apesar de estarem em andamento mudanças em alguns critérios dos editais para adequação de fatores como taxa de retorno de investimento, cobrança de qualidade de serviços e outras exigências. Trata-se da licitação de 816,7 km da BR-116, no trecho de Além Paraíba (entre RJ e MG) e Divisa Alegre (entre MG e BA), que deverá sair até o fim deste ano; e do trecho de 936,8 km da BR-040, entre Juiz de Fora e Brasília, cujo edital deverá estar pronto no início de 2013. Considerando que no Brasil existem 174,1 mil km de estradas pavimentadas, somadas todas as concessões (incluindo os dois novos trechos federais), cerca de 10% do total de quilômetros estarão sendo operados pela iniciativa privada.
As sinalizações do poder público para novas parcerias rodoviárias acenam, inicialmente, para as concessões administrativas, previstas na Lei 11.079, de 2004, conhecida genericamente como lei das Parcerias Público-Privadas. A principal diferença deste modelo em relação às concessões comuns é a existência de um contrato em que a administração pública se torna usuária direta ou indireta do serviço, ainda que envolva a execução de obra ou fornecimento e instalação de bens. Assim, quem paga pelo serviço do concessionário é a administração pública e não mais o pedágio.
O novo modelo pode solucionar uma equação que tende a ficar cada vez mais complexa, uma vez que o "estoque" de rodovias de maior fluxo de veículos e, portanto, de maior atratividade ao investidor, está no fim.
Estudo do Instituto de Pesquisas Econômicas (Ipea), divulgado em outubro de 2011, calcula que haja um pequeno percentual da malha federal, por volta de 2%, ainda passível de ser concedido para a iniciativa privada nos moldes de concessão comum. No entanto, o volume de recursos necessários para dotar a infraestrutura da qualidade necessária ao desenvolvimento econômico continua grande, dado o passivo acumulado em dezenas de anos.
O Ipea calcula a necessidade de investimento em rodovias, para os próximos cinco anos, em R$ 183,5 bilhões, ou R$ 36,7 bilhões por ano apenas para conservação e recuperação. Para garantir o desenvolvimento econômico e adequar a malha seriam necessários mais R$ 32,2 bilhões ao ano.
"O investimento público federal em rodovia, em valores constantes, vem aumentando de forma expressiva, mas ainda é bastante insuficiente para a demanda. De 2003 a 2010, os valores passaram de R$ 1,3 bilhão para R$ 10,3 bilhões, o que significou crescimento de 700%. No total, os cofres públicos gastaram R$ 46,6 bilhões no período. Os recursos privados somaram R$ 20,6 bilhões nos últimos oito anos", registra o estudo. Segundo o Ministério dos Transportes, para este ano o orçamento previsto para as rodovias federais é de R$ 11,8 bilhões.
"Estão sendo avaliados diversos outros trechos de rodovias federais a serem incluídas no Programa de Concessão de Rodovias Federais", diz o ministro dos Transportes, Paulo Passos, não descartando mudanças no modelo de parceria com a iniciativa privada. Segundo informações, estão sendo feitos estudos em até 9 mil quilômetros de vias, considerando modelos em que o pedágio não é fonte única de receita. Mas, não há prazo para finalizá-los. "As licitações seguem processos complexos que incluem, além da modelagem econômico-financeira, ampla participação social e de órgãos de controle", afirma o ministro.
Ao mesmo tempo, as empresas privadas se preparam para atender as novas regras. É o caso da Equipav, responsável pela Univias, que opera 1.070 km de vias no Rio Grande do Sul desde 1997, e que mantém equipe qualificada, fazendo benchmarking (mapeamento de experiências similares e referenciais) em outros países para ampliar seu know-how. "Queremos estar prontos para participar das próximas concessões, tanto federais como estaduais", diz Hamilton Amadeo, presidente da empresa, que saúda os novos modelos sinalizados pelo governo federal.
Amadeo acompanhou de perto a PPP mineira da MG- 050 e gostou do que foi feito. "A estrutura garantidora é muito sólida", diz. Segundo ele, existe ambiente no Brasil para desenvolver modelos inovadores de PPPs, que atendam o poder público e deem segurança para o investidor.

Modelo para licitação de hidrovias ficará pronto em três meses

Rosangela Capozoli

Primeiro foi o transporte pelo rio Amazonas, levando 240 mil pessoas por ano entre as cidades de Monte Alegre e Parintins. Seis anos depois, os negócios se estenderam para o rio Guaíba, no Rio Grande do Sul, transportando passageiros de Porto Alegre para a outra margem. No Pará, a empresa se chama Tapajós, no Sul é CatSul, as duas pertencem ao Grupo Ouro e Prata, que pretende ampliar sua participação no Pará e tem planos de avançar pelos rios de outros Estados. A empresa iniciou o transporte fluvial no sul após vencer licitação do governo gaúcho. Com isso, Porto Alegre ganhou em outubro de 2011 seu primeiro terminal hidroviário, localizado no Armazém B3 do Cais Mauá.
"A concessão será por 30 anos. A extensão é de 15 quilômetros e estima-se transportar 60 mil pessoas por mês. Os investimentos nessa operação somaram R$ 7 milhões entre a aquisição de duas catamarãs e áreas de embarque e desembarque", diz Carlos Bernaud, diretor de operações da Catsul.
Instalado em Porto Alegre, no Rio Grande do Sul, o Grupo Ouro e Prata é conhecido por sua atuação na área rodoviária. "Estamos há 70 anos no segmento rodoviário e decidimos há alguns anos investir também em hidrovias." O grupo está interessado em novas concessões de hidrovias e o governo pretende transferir para a iniciativa privada boa parte das hidrovias.
O plano está sendo detalhado no Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes (Dnit). A intenção do diretor-geral do Dnit, general Jorge Fraxe, é estimular investimentos nos canais de navegação de maneira mais eficiente. O contrato diz que o vencedor da licitação assumirá a tarefa de preparar o rio para a navegação e cuidar da manutenção durante sua vigência do contrato. Para Fraxe, trata-se de uma terceirização da administração e não de privatização das hidrovias.
Para Metom Soares, presidente da Federação Nacional das Empresas de Navegação Marítima, Fluvial, Lacustre e de Tráfego Portuário (Fenavega), as condições de navegações fluviais brasileiras - não fosse "o esquecimento do governo em investir na navegação hidroviária" - permitiriam hoje ao país contar com uma extensão quase quatro vezes superior a atual.
Segundo ele, "na região amazônica, por exemplo, no rio Madeira, há falta de sinalização, falta de calado, os portos não atendem devidamente e os ribeirinhos estão sofrendo com isso. Ao invés de cerca de 15 mil quilômetros poderíamos ter mais de 50 mil quilômetros navegáveis", afirma. As concessões hidroviárias são motivos de preocupação para o presidente da Fenavega. "Acho que é preciso primeiro pensar, seriamente, em como podemos transformar as hidrovias brasileiras em um verdadeiro meio de vida para todos aqueles que dependem do sistema hidroviário nesse país. Já perdemos a navegação de longo curso, que hoje está nas mãos de estrangeiros. Estamos perdendo a navegação de cabotagem que também está nas mãos de estrangeiros. É preciso ter cautela", diz.
Para o general Fraxe, o agente privado é que deverá assegurar as condições mínimas para navegação, o que envolve todos os trabalhos de dragagem e contenção de margem. No entanto, ele diz que quem receber o direito de administrar a hidrovia licitada não poderá cobrar qualquer pedágio dos usuários. A remuneração do empreendedor, segundo ele, será paga pelo governo relacionada ao custo de manutenção do trecho do rio que deverá ser ofertado. Segundo ele, "essa administração hidroviária terá um custo, que é normal para administrar uma hidrovia. Em princípio, vamos contratar e pagar por esses serviços". O Dnit estabeleceu um prazo de três meses para finalizar o modelo de licitação e antes de abrir a concorrência pública deverá convencer os ministérios dos Transportes e do Planejamento sobre a viabilidade econômica do modelo idealizado.
"O principal obstáculo ao livre trânsito nas hidrovias é a dragagem. Já solicitamos ao governo que além da dragagem se coloque em dia a sinalização, mas nada disso aconteceu", diz Fernando Ferreira Becker, diretor da Navegação Aliança Ltda, de Porto Alegre. Apesar das críticas, ele está entusiasmado com a possibilidade de expandir os negócios da Aliança. "Existem vários projetos de empresas que querem se instalar na beira dos rios na região e isso exigirá investimentos. Tão logo os planos sejam concretizados, a empresa investirá o valor necessário para atender essa demanda", diz. Enquanto aguarda o sinal verde das companhias interessadas em se instalar na região, a Aliança investirá em 2012 cerca de R$ 10 milhões em reformas de barcos.

País redesenha o mapa ferroviário
Infraestrutura. Capilaridade da malha será ampliada com obras em 3 mil km de trilhos

Roberto Rockmann

O mapa ferroviário brasileiro vai mudar. No momento, cerca de três mil quilômetros de obras sobre trilhos estão em construção no país, o que ampliará a capilaridade da malha existente. Nos próximos quatro anos, poderão ser investidos mais de R$ 40 bilhões no segmento. No Nordeste, a Nova Transnordestina - investimento orçado inicialmente em R$ 5,4 bilhões - e que terá 1.728 quilômetros para interligar a cidade de Eliseu Martins (PI) aos portos de Suape (PE) e Pecém (PE) - está avançando.
Segundo o último balanço do PAC, anunciado neste mês, trecho da estrada férrea no Estado de Pernambuco, entre Salgueiro e o porto de Suape, com 522 quilômetros de extensão, está com quase 50% das obras de infraestrutura e 38% das obras de arte já realizadas. A conclusão da ferrovia, projetada para 2014, poderá criar uma nova opção de escoamento para a nova fronteira agrícola do Maranhão e Piauí e atrair novas cargas, como cimento e combustível.
Empreendimento da estatal Valec, a Ferrovia Norte-Sul - que prevê a interligação do Centro Oeste com o Sudeste - tem cerca de 1.300 quilômetros em obra. O trecho Sul I, entre as cidades de Palmas (TO) e Anápolis (GO), com 855 quilômetros, está 95% realizado e a previsão de conclusão é para julho. Já o trecho Sul II, com 682 quilômetros de trilhos entre Anápolis (GO) a Estrela D'Oeste (SP), está com mais de 15% das obras executadas e é previsto para ser inaugurado em junho de 2014. "Essa ferrovia poderá ter impacto para o agronegócio, que pode ser capaz de escoar 20 milhões de toneladas de grãos em dez anos por ali", afirma Luiz Fayet, consultor da Confederação Nacional de Agricultura (CNA).
Em paralelo, a Valec também trabalha na construção da Ferrovia Integração Oeste-Leste (Fiol), que vai ligar Ilhéus, no litoral baiano, a Figueiropólis, no Tocantins, cortando toda a Bahia de leste a oeste.
As duas novas linhas férreas da Valec trarão uma novidade para o marco regulatório do setor: a estatal deverá ser responsável pela infraestrutura e manutenção dos trechos, enquanto operadores e usuários poderão comprar capacidade de carga, trens e vagões para transportar seus produtos, pagando o direito de passagem à Valec. "Isso reforça a figura do usuário investidor, que deverá se tornar um player importante no setor, abrindo mais uma fonte de recursos", diz Luis Baldez, presidente da Associação Nacional dos Usuários de Carga (Anut). Na Fiol, uma mineradora já se comprometeu a comprar dez milhões de toneladas a ser transportada pela nova ferrovia.
No Centro-Oeste, a ALL está investindo R$ 750 milhões no projeto de expansão de sua malha norte, com a construção de 260 km de trilhos entre o terminal do Alto Araguaia e Rondonópolis (MT). Neste ano, devem ser aplicados R$ 150 milhões para a conclusão do empreendimento, que vai entrar em operação até o fim do ano. Isso deve permitir que o modal seja usado para escoamento da safra que começa a ser transportada no início de 2013. Com a estrada de ferro, os produtores poderão ter ganho de R$ 30 a R$ 35 por tonelada de grão, em relação à rodovia.
A primeira etapa da obra, entre Alta Araguaia e Itiquira, foi entregue recentemente e aguarda, agora, as licenças ambientais para dar início à operação. Essa região não tinha logística ferroviária, sendo que boa parte da produção era escoada pela BR-163. Nesse ponto, poderá ser escoado de 1 milhão a 1,5 milhão de toneladas de milho e soja. Até o fim de 2012, segundo o diretor-superintendente, Eduardo Pelleissone, será entregue o trecho final da obra, o que permitirá a maior proximidade com os agricultores de Rondonópolis, uma das maiores fronteiras do agronegócio no Centro-Oeste. O projeto tem estimulado investimentos em outros elos da cadeia.
No Centro-Oeste, a ALL investe R$ 750 milhões no projeto de expansão de sua malha norte, com a construção de 260 km
Uma área de 400 hectares para terminais perto da ferrovia já teve grande demanda de empresas. Estima-se que haja apenas 20 hectares disponíveis. "Vai ser um dos maiores complexos intermodais do país, com terminais de transbordo de grãos e fertilizantes, esmagadoras de sojas", afirma Pelleissone. A ferrovia também poderá ser uma opção para produtores de algodão do Mato Grosso, que hoje só acessam as estradas, e para fabricantes de alimentos localizadas na região. Outra carga em potencial que poderá ganhar os trilhos é o biodiesel, do qual o Mato Grosso é um dos maiores produtores. "Com esse trecho, passamos a ter ligação com Rondonópolis, ficamos mais perto da produção de biodiesel e isso deverá permitir que a gente cresça nesse segmento, que ainda é incipiente", destaca.
A MRS também prepara investimentos. Neste ano, devem ficar em torno de R$ 1,6 bilhão, com alta de 32% em relação a 2011. Os principais projetos são: implantação do novo sistema de sinalização chamado CBTC; a aquisição de equipamentos de via para a modernização dos processos de manutenção; a conclusão da Segregação Leste para melhorar o acesso ao Porto de Santos; a utilização das novas locomotivas GE, fabricadas em Contagem (MG), para aumentar a capacidade de transporte; e a chegada das primeiras máquinas para o Sistema Cremalheira, localizado na Serra do Mar, entre São Paulo e Santos.
A concessionária prevê para este ano o início da operação das novas locomotivas produzidas pela Stadler Rail, na Suíça, para o Sistema Cremalheira. A previsão é de que as duas primeiras, de um total de sete, cheguem ao Brasil no fim de agosto e fiquem em teste até dezembro, em sistema de operação assistida por técnicos do fabricante. Em janeiro de 2013, a MRS receberá outras duas máquinas, e as últimas três, em março. O processo de substituição será gradual, porque é preciso garantir a eficiência das novas máquinas sem afetar a produção. Inicialmente, as locomotivas antigas, fabricadas na década de 1970, vão continuar a operar, simultaneamente, com as novas. As novas locomotivas apoiarão o crescimento da produção estimado para este trecho, passando de 500 toneladas para 750 toneladas brutas por viagem, com maior agilidade na operação.
Para aumentar a capacidade de produção para 500 milhões de toneladas métricas de minério de ferro nos próximos quatro anos, a Vale investe na ampliação de sua capacidade portuária e na expansão da ferrovia de Carajás. A segunda maior mineradora do mundo investirá mais de US$ 2,9 bilhões para ampliar a capacidade do terminal portuário de Ponta da Madeira (MA) e a estrada de ferro de Carajás: 605 quilômetros de trilhos da linha férrea serão duplicados e a linha ferroviária será ampliada em 100 km para conectar-se à serra sul de Carajás.
A empresa também irá interligar 56 pátios ao longo dos trilhos de Carajás, o que reduzirá o tempo de paradas e fará com que os trens possam ter velocidades médias de até 80 km/h.

Participação da iniciativa privada entra na agenda
Portos. Há expectativa de que o governo privatize as atividades também na parte de infraetrutura.

Fernanda Pires

A privatização dos aeroportos pavimentou o caminho para o governo colocar na agenda a transferência da gestão dos portos à iniciativa privada, avaliam especialistas. A possibilidade já é prevista em lei.
A percepção é que o pragmatismo dispensado ao setor aéreo deve ser replicado no portuário, sem o quê o sistema não deslanchará. "Passam pelos portos quase 95% das nossas exportações. Mas nós não conseguimos fazer um programa de modernização portuária. O que falta? Abrir para a privatização e deixar que o setor privado faça investimentos sob concessão", diz José de Freitas Mascarenhas, presidente do conselho temático de infraestrutura da Confederação Nacional da Indústria (CNI).
Hoje, apenas a operação de cargas realizada nos terminais está nas mãos da iniciativa privada. A gestão do porto (assim denominado o complexo aquaviário onde os terminais estão abrigados) é feita por estatais. Elas são responsáveis por fornecer a infraestrutura, como os acessos (dragagens) e os berços de atracação. Mas as estatais mal conseguem executar o orçamento. Estão engessadas por um modelo sem autonomia administrativa e inseridas num cenário inflacionado por ritos burocráticos.
A Lei dos Portos, de 1993, foi o grande marco do segmento. Permitiu o arrendamento privado dos terminais por até 50 anos e admitiu também a concessão das administrações portuárias, as chamadas companhias docas.
"O programa de arrendamentos avançou no início, mas depois estagnou", diz Mascarenhas. Desde 2001, quando a Agência Nacional de Transportes Aquaviários (Antaq) foi criada, apenas seis terminais foram licitados. Já as concessões dos portos não evoluíram. Dos 34 portos marítimos, apenas Imbituba (SC) é gerido por uma empresa privada.
O problema é que o governo não dá sinais claros sobre o futuro do setor. Em 2008, retirou as administrações portuárias do Programa Nacional de Desestatização. Depois, em 2011, a Secretaria de Portos (SEP) anunciou que lançaria os editais para a concessão privada de quatro novos portos: Manaus (AM); Porto Sul (BA); Águas Profundas (ES); e Vila do Conde (PA). O processo mais adiantado era o de Manaus, com promessa de o edital ser lançado em abril deste ano. A data, porém, não será cumprida.
"Estamos analisando com cuidado. Vamos mostrar qual o caminho devemos fazer para melhorar a condição de movimentação nos portos. Agora, a modelagem de concessão ainda não está definida", afirmou o ministro dos Portos, Leônidas Cristino. No fim de 2011, a SEP disse que renegociará os contratos dos portos delegados a Estados e municípios. São 16 portos dos 34 existentes. "O governo quer aumentar a intervenção, o que é um retrocesso. Ao governo deve ser reservada a fiscalização e o incentivo à competição entre os portos", diz Mascarenhas.
A abertura das administrações portuárias é considerada a medida mais importante para melhorar a operação no Estado da Bahia, diz Paulo Villa, diretor da Associação de Usuários dos Portos da Bahia (Usuport). "Temos 19 anos da lei e, na Bahia, houve apenas a licitação de um terminal, em 1999. Nós ficamos indignados com essa postura". A falta de alternativas tem penalizado a indústria baiana e o produto brasileiro. Em 2011, o setor produtivo do Estado amargou R$ 400 milhões em custos adicionais por conta do sistema portuário. Dos R$ 400 milhões, R$ 259 milhões foram gastos com a transferência de contêineres e granéis para portos de outros Estados. Outros R$ 40 milhões foram com gastos de tarifas "excessivas" e mais R$ 100 milhões com pagamento de sobrestadia de navios.
Segundo a Antaq, existem R$ 9,4 bilhões aplicados em terminais arrendados à iniciativa privada ou prestes a serem licitados. O investimento subdividi-se em: projetos em análise (R$ 3,3 bilhões); melhorarias em terminais existentes (R$ 2,4 bilhões); estudos em elaboração (R$ 1,4 bilhão); projetos aprovados, mas não licitados (R$ 502 milhões); e os seis terminais licitados desde 2001 (R$ 1,8 bilhão).
No segmento dos terminais privativos - que não dependem de licitação - outros seis estão em construção, somando R$ 6,5 bilhões. Somente o Superporto do Açu (RJ) demandará R$ 3,8 bilhões. O complexo, que entra em operação no segundo semestre de 2013, terá capacidade para movimentar 350 milhões de toneladas por ano, o equivalente a 42% do que o sistema portuário brasileiro inteiro escoou em 2010 - último ano completo de estatística disponível.
"Não existe impedimento legal em ter investimento privado nas companhias docas. Mas acho que a tendência não é essa para as atuais estatais", diz Mauro Penteado, sócio do Machado, Meyer, Sendacz e Opice Advogados. Ele avalia que o cenário pende mais para uma reorganização das docas, de forma que elas se tornem mais eficientes. Já na criação dos novos portos, Penteado aposta numa maior participação da iniciativa privada na gestão.

Valor Econômico, 26/03/2012, Especial Logística, p. F1, F2, F4 e F6

http://www.valor.com.br/especiais/2586362/definicao-de-caminhos

http://www.valor.com.br/especiais/2586374/governo-prepara-novo-tipo-de-…

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