Diário de Cuiabá
04 de Dez de 2002
Esta decisão esta relacionada com a área do Parque Crsitalino.
MPF acusa Estado de "regularizar", assentar famílias e criar parque usando matrícula cancelada desde 1998.
A Justiça Federal está colocando fim a uma das maiores farras já promovidas com terras da União em toda história de Mato Grosso. Em decisão assinada anteontem, o juiz Julier Sebastião da Silva determinou o seqüestro judicial dos 423 mil hectares da área que compreende todo o município de Novo Mundo e uma pequena parte de Alta Floresta e Paranaíta, a chamada gleba Divisa. A decisão atendeu ao pedido do Ministério Público Federal, em parecer emitido numa ação discriminatória do Incra.
Na gleba, ao longo dos anos, o governo do Estado utilizou uma matrícula de terra sem nenhuma validade, segundo o Ministério Público, para criar o projeto de assentamento Divisa, o Parque Estadual do Cristalino e promover a "regularização fundiária" de dezenas de milhares de hectares já ocupados mas até então sem título. Matrícula é o número do imóvel registrado em cartório, sem o qual o posseiro não é o proprietário de direito da terra, mesmo que tenha escritura e a posse pacífica.
As operações de regularização fundiária, aliás, são alvo de suspeita do autor do pedido, o procurador da República Pedro Taques, que enxerga nos processos o uso de laranjas com o objetivo de legalizar terras para poderosos ligados ao governo. Ao final da ação discriminatória, o Ministério Público espera convocar os beneficiados pela regularização a fim de identificar a presença de possíveis laranjas e abrir processos criminais contra os responsáveis.
"Constitui acontecimento deplorável, do ponto de vista juridico-institucional, observar a Assembléia Legislativa expedir inúmeras resoluções autorizando a regularização de ocupação fundiária de imóvel que não pertence ao ente público", diz o juiz Julier Sebastião da Silva.
O seqüestro judicial vai desfazer regularizações consideradas escandalosas pelo Ministério Público, com o caso do fazendeiro paulista Antônio José Rosa Junqueira, "agraciado com 106.831 hectares de terras públicas federais".
O ex-presidente do Intermat, Aparecido Alves, rebate dizendo que, apesar de aprovadas pela Assembléia, as regularizações não foram efetivadas porque o governo ainda não expediu os títulos definitivos. "Existem outros trâmites legais a serem efetivados. Além do mais, somente alguns processos foram aprovados", responde Alves.
Com a decisão, todos esses atos tornam-se nulos e o domínio volta para o Incra, que será o depositário fiel dos 423 mil hectares. Assim, até mesmo o decreto de criação do Parque Cristalino, um ecossistema sensível que abriga 600 espécies de pássaros, torna-se judicialmente nulo.
Decretado ao longo do rio Cristalino, o parque estadual é uma das garantias do Estado para a obtenção dos recursos do Proecotur, um programa criado para desenvolver o turismo ecológico pelo qual o governo irá receber US$ 20 milhões. Com o seqüestro judicial da gleba, a liberação de tal verba poderá esbarrar em um obstáculo legal. Para piorar, no decorrer da ação o Ministério Público descobriu que em razão de uma sobreposição de títulos, o parque Cristalino tem efetivamente 90 mil hectares e não os 158 mil propalados pelo Estado. Será mais uma dor de cabeça para o governo, já que tal notícia deverá desagradar ambientalistas, governo federal e, especialmente, o Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID), financiador do Proecotur.
A decisão não pára por aí. No terceiro item, o juiz manda que a Comissão de Terras da Assembléia reveja todos os processos de regularização fundiária e que seja proibida de praticar qualquer ato envolvendo o patrimônio fundiário da União na gleba Divisa. A Comissão de Terras da Assembléia tem, entre outras atribuições, a de aprovar processos de regularização fundiária, mas somente em terras do Estado.
Mais à frente, Julier determina que o Intermat suspenda qualquer ato de instalação de trabalhadores rurais no assentamento Divisa, onde centenas de pessoas vivem atualmente.
Aparecido Alves mais uma vez contesta as informações do Ministério Público e diz que a matrícula em nome do governo continua valendo. "Não há qualquer irregularidade no processo. O que há no caso da matrícula é um mal entendido", diz Alves. A informação que consta no processo, entretanto, é clara. Ali, na página 1.688, está escrito que a matrícula 2.204 foi cancelada pela Justiça de Peixoto de Azevedo em novembro de 1998.
(ANSELMO CARVALHO PINTO-Diário de Cuiabá-Cuiabá-MT-04/12/02)
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