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Crise deve afetar linhão do Madeira

Valor Online - www.valoronline.com.br
Autor: Josette Goulart e Cristiane Perini Lucchesi
07 de Out de 2008

Candidatos pedem que licitação de linhas do Madeira seja adiado

A crise de crédito internacional poderá afetar o leilão das linhas de transmissão das usinas do Rio Madeira que está previsto para se realizar no final de outubro e o próprio governo, nos bastidores, já admite que haverá impactos. Não é oficial, mas os empreendedores começaram a pressionar o governo para que a data de 31 de outubro seja alterada e as condições revistas. Não só o custo de boa parte dos equipamentos, cotados em dólar, subiu drasticamente em função da valorização da moeda americana desde que o governo definiu as condições do leilão, como os recursos para os empréstimos-ponte desapareceram.

Como se trata de uma obra estratégica para o governo, que precisa garantir o fornecimento da energia que será produzida pelas usinas de Santo Antônio e Jirau a partir de 2012, a solução pode passar pelas estatais ligadas ao Sistema Eletrobrás. Foram elas inclusive que arremataram a maior parte dos lotes de linhas de transmissão de pequeno porte que foram leiloadas na última sexta-feira e que vão exigir R$ 500 milhões em investimentos. Muito pouco se considerado os R$ 7,2 bilhões previstos para construir os mais de dois mil quilômetros de linhas que vão ligar as usinas de Porto Velho ao Sudeste do país.

As linhas que vão fazer parte do linhão do Madeira devem ficar prontas entre 36 e 50 meses. Apesar de não serem necessários todos os recursos imediatamente, as empresas precisam de um empréstimo-ponte ou de caixa, que varia entre 10% e 20% do total a ser investido, até obterem o financiamento do BNDES para começar a tocar as obras. Sob pena de multas pesadas se não terminarem o projeto no prazo previsto. As empresas precisam ainda apresentar pelo menos 25% de capital próprio para garantir os investimentos. E os recursos desapareceram do mercado.

Com a completa paralisia do mercado de crédito em dólares - o único provedor de linhas é o Fed, banco central americano -, diretores de dois bancos estrangeiros afirmaram que não haverá financiamento privado para novos projetos de investimento no país, inclusive em energia. Não apenas as empresas brasileiras são afetadas pelo aperto, mas em todos os lugares do mundo, inclusive na Europa. Há quem esteja propondo que o Fed empreste diretamente para as empresas americanas, tamanho o empoçamento de liquidez - quem tem dinheiro, compra títulos do Tesouro americano.

Um diretor de banco europeu sugere ao governo brasileiro que adie qualquer leilão de transmissão de energia neste momento, pois os custos de captação foram para as alturas e inviabilizam investimentos. Só tomam recursos novos as empresas que não têm outra alternativa. As outras empresas estão precisando queimar seu caixa para ficar com liquidez diária e fazer frente a compromissos de curto prazo, disse ele, e não vão querer usá-lo neste momento de incertezas. A escassez é tamanha que esse mesmo diretor lembra ainda que a montagem dos financiamentos para construção de plataformas de perfuração da Petrobras já licitadas, no total de US$ 8 bilhões, está paralisada.

O preço pré-estabelecido do leilão de transmissão também vai dificultar sua realização, visto que os custos financeiros do empréstimo-ponte necessário para participar dele subiram e o dólar disparou, tornando a dívida externa menos atrativa e os equipamentos mais caros. Algumas companhias que são potenciais compradores como Neoenergia, Cemig, Companhia de Transmissão Paulista (Cteep) e Eletrobrás mostraram nos balanços do segundo trimestre um caixa robusto. Mas como se trata de uma fotografia tirada em junho, somente com a divulgação dos resultados do terceiro trimestre é que será possível saber o potencial de investimento dessas empresas, ou seja, se elas têm condições de bancar com recursos próprios os investimentos no linhão.

Pelas regras do edital divulgado no mês passado pela Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel), serão ofertados sete lotes e as empresas poderão optar pela tecnologia de corrente contínua ou por um sistema híbrido (corrente contínua e alternada). A Receita Anual Permitida para os sete lotes não pode ultrapassar os R$ 758 milhões e é com base nesse valor que os empreendedores fazem as contas para dar seus lances. O problema é que os equipamentos para se construir as linhas de corrente contínua são todos importados, já que o país pouco constrói linhões desse tipo. O último investimento realizado foi para Itaipu. A alta do dólar impacta essa conta.

Não se espera que o leilão se esvazie por completo, mas o deságio que em leilões passados foram substanciais, variando entre 20% e 50%, tendem a ficar bem menores. Quanto menor o deságio, maior a receita anual permitida e maior será o preço de energia para o consumidor final. O especialista no setor, Raimundo Batista, da empresa Enecel Energia, lembra que no leilão da semana passada somente um dos lotes teve deságio elevado, de 60%, para uma linha que era de total interesse da Neoenergia. Mas o deságio de outros lotes, arrematados por estatais, foi muito inferior. Em um deles, não chegou a 1%. E os estrangeiros habilitados, Abengoa, Isolux e Cteep, fortes no setor de transmissão, não arremataram nenhum lote.

Além disso, segundo Batista, pela primeira vez um dos lotes não foi vendido em um leilão de transmissão. "A Aneel justificou que o projeto de linhas subterrâneas foi mal precificado", diz Batista. "Mas o fato mostra que as empresas não vão aceitar qualquer preço." O governo terá que acenar com recursos do BNDES. O ministro das Minas e Energia, Edison Lobão, tem afirmado que não vai faltar dinheiro para o setor de energia.

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