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Crise da água impõe responsabilidade a todos

O Globo, Opinião, p. 16
20 de Out de 2015

Crise da água impõe responsabilidade a todos
Fenômenos naturais provocam estiagem, mas leniência e irresponsabilidade do poder público, das autoridades e da população agravam o problema

Os longos períodos de estiagem têm sido inclementes com boa parte do território fluminense - por extensão, com a Região Sudeste do país. No fim da semana passada, a prefeitura de Angra dos Reis decretou estado de emergência hídrica para enfrentar uma crise de abastecimento no município, onde as principais barragens da cidade trabalham com apenas 20% a 30% de sua capacidade, insuficientes para atender às demandas dos bairros.
As medidas adotadas, dentro de um realista modelo de racionamento, incluem a proibição de lavar veículos, barcos, calçadas, ruas, regar jardins, encher ou esvaziar piscinas etc. Angra talvez seja a cidade que primeiro acorda para o gravíssimo risco de desabastecimento, mas a crise da água é um fantasma que assusta outras regiões do Rio de Janeiro. A falta de chuvas, que seca nascentes, já castiga moradores de 20% dos municípios fluminenses. Isso cobra responsabilidades.
Pouca chuva compromete o armazenamento de água, fundamental para o abastecimento e a geração de energia. Na crise atual, juntam-se os efeitos do El Niño, particularmente intenso neste período. Mas jogar unicamente na conta da sazonalidade de fenômenos naturais as causas de uma crise que põe em risco a própria população não só dificulta a impositiva busca por soluções adequadas, como pode até mesmo inviabilizá-la.
É crucial que se reveja também o papel do homem como elemento dessa perigosa equação. Ele, em geral, tem sido mais negativo que positivo. De um lado, por exemplo, ações deletérias potencializam as condições que levam à seca do leito de rios, como a destruição de matas ciliares em bacias que dependem diretamente das chuvas. No sentido contrário - o da inação -, a leniência, a irresponsabilidade gerencial e o proselitismo político do poder público fecham o quadro de desserviço no combate à crise. A população também tem parte da culpa.
É possível que nem todas as regiões tenham de tomar medidas tão radicais quanto as de Angra. Mas é inescapável que todas encarem o problema com a seriedade necessária. Episódios recentes no terreno das ações humanas projetam expectativas preocupantes. Já avançada a crise hídrica de São Paulo, ano passado, o governador Geraldo Alckmin mitigou o tamanho da ameaça para que ela não respingasse em sua candidatura à reeleição; em nível federal, a presidente Dilma, também buscando a recondução, camuflou a extensão do problema para evitar que a falta d'água revelasse a dimensão do risco de colapso energético.
A crise exige de todos ações responsáveis. Da população, a revisão de hábitos que resultam em desperdício; do poder público, ações gerenciais, como campanhas, e adoção de políticas de infraestrutura que reduzam o risco de desabastecimento. Dentro desse quadro, deve-se lembrar que 2016 é ano de eleição: será desastroso que, mais uma vez, a busca por votos fale mais alto que a necessidade de o país cuidar desse recurso, vital para o ser humano.

O Globo, 20/10/2015, Opinião, p. 16

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