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Criação de reserva acirra conflitos entre madeireiros e ambientalistas

O Liberal-Belém-PA
06 de Nov de 2002

A proposta de criação de uma Reserva Extrativista (Resex) na localidade de Prainha, no município de Porto de Moz, no Nordeste do Pará, vem dividindo opiniões de ambientalistas e representantes das indústrias exportadoras de madeireiras do Estado. A proposição, que está sendo construída pela Comissão de Avaliação de Criação da Reserva Verde Para Sempre, vinculada ao Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama), transforma em reserva uma área de 1,4 milhão de hectares. Seria a maior reserva extrativista do mundo.

Contrária à criação da reserva, a Associação das Indústrias Madeiras Exportadoras do Estado do Pará (Aimex) sustenta que esta não seria a alternativa mais viável para o desenvolvimento da região. O tesoureiro da entidade, Raul Porto, diz que o argumento de que a região, principalmente sua população, estaria sofrendo com a exploração e o desmatamento de grandes extensões de floresta sem o manejo adequado, não tem fundamento.

"Não existe desmatamento, trabalhamos com o desenvolvimento sustentável, os projetos de manejo da floresta", assegura o empresário da madeira, referindo-se ao associados da Aimex, todos, segundo ele, atuando de forma legal, em Porto de Moz.

A Comissão Pastoral da Terra (CPT), entidade que tem assento na comissão que debate a efetivação da reserva, rebate as palavras de Raul Porto. Segundo Jax Pinto, coordenador do movimento ligado à Igreja Católica, a ação predatória do homem na região é muito intensiva. "Se não for criada a Resex até o início de 2003, as florestas das regiões estarão praticamente todas desmatadas", justificou Jax Pinto. De acordo com ele, hoje existem em Porto de Moz cerca de 25 madeireiras explorando cedro e outras madeiras de lei consideradas duras, como angelim.

Para os dirigentes da Aimex, as acusações contra a entidade são mero sensacionalismo de ambientalistas que querem, com o surgimento da Resex, "engessar" a região, impedindo-a de crescer. "É uma utopia o que eles querem. Nós podemos gerar desenvolvimento, emprego e a manutenção da floresta", ressaltou Raul Porto, alfinetando que os ambientalistas estrangeiros do Greenpeace - envolvidos diretamente nas discussões da implementação da reserva extrativista - estão fazendo uma guerra não declarada. "Estão tomando conta das nossas vidas a todo monento", desabafou.

Na verdade, o que se busca com a Resex, na avaliação da CPT, é evitar que madeireiros se apossem ainda mais das extensões de áreas para depredar de forma irracional o ambiente, em pouco espaço de tempo, poluindo rios e matando peixes, assim como acabando com a caça. "A Resex vai garantir que não se destrua a floresta, mas que se preserve a biodiversidade e garanta dignidade e viabilidade de sobrevivência para as comuidades tradicionais. Ela vai permitir a exploração da floresta mas com racionalidade, dando garantia de desenvolvimento econômico", observou Jax Pinto

Cortes nos repasses deixam 50 mil pessoas com fome
Pelo menos em um ponto da discussão a respeito da criação da Resex em Porto de Moz, madeireiros, integrantes das populações tradicionais e ambientalistas estão de acordo. Eles reconhecem que os cortes sistemáticos dos recursos do governo destinados a apoiar as cerca de 50 mil pessoas que vivem no interior de 24 reservas extrativistas hoje existentes no Brasil, foram cruciais para que a fome começasse a rondá-los. Esta população estimada está em uma área de cinco milhões de hectares.

Em decorrência da falta de incentivos, os habitantes vêm sendo levados ao isolamento, pela renda insignificante resultante da prática extrativista compulsória - a produção de castanha e ou de borracha rende R$ 30 mensais -, oriunda de um modelo que seria considerado modelo de sustentação do caboclo no interior da Amazônia.

O problema maior, no entendimento da CPT, foi o abandono imposto pelo governo federal, à iniciativa. Por isso, salienta o coordenador Jax Pinto, é essencial, ao criar a 25ª Resex, em Porto de Moz, que o governo invista na região. "A simples criação da Resex não vai resolver sozinha o problema das comunidades tradicionais. É preciso incentivos", explicou Pinto, esclarecendo que a área é pontencialmente rica para a prática do ecoturismo e a implantação da agricultura familiar.

"A Resex possibilita claramente a garantia mais real de uma preservação do espaço ambiental. Em si, ela não resolve todos os problemas das comunidades tradicionais da região, mas é um elemento indispensável para que estes problemas que existem hoje na região possam ser solucionados", disse Jax Pinto. Para ele, ações dos governos do estado e federal serão essenciais para o desenvolvimento econômico.

Raul Porto, da Aimex, vai mais longe ao afirmar que não seria possível o governo investir na Resex. "Se não tem direito à propriedade, não tem investimento, desenvolvimento", informou. Desta forma, conforme sua compreensão, a possibilidade da sanção do presidente Fernando Henrique Cardoso, ao projeto de criação da Resex, estaria levando a população "a viver em um grande aqüário". Para evitar que isto aconteça, a Aimex vem buscando apoios políticos e mostrando seu ponto de vista aos órgãos competentes.

A proposta da Aimex, alternativa à reserva extrativista, é a criação de uma reserva florestal geranciada pelo Estado, que seria o responsável por emitir as concessões de direito de extração da madeira da região. "Tem muitas outras áreas distantes, onde podem-se promover esse tipo de experiência (Resex), não numa área propícia ao desenvolvimento", ressalvou Porto, revelando que atualmente o Brasil participa com apenas 4% das exportações de madeira no mundo.

O representate da Aimex se queixou que a entidade não foi convidada para participar das discussões sobre a Resex. "Fomos surpreendidos ao sabermos da proposta em fevereiro deste ano", frisou ele, sentenciando: "Queremos 100% da reserva para fazer o manejo florestal sustentável".

Dados da CPT apontam que hoje moram na região da possível Resex em Porto de Moz aproximadamente quatro mil famílias em 125 comunidades rurais. Outra estatística revela que, por mês, saem do setor cerca de 150 mil metros cúbicos de madeira.
A Aimex, por sua vez, lembr que a proposta inicial da Resex englobaria 2,8 milhões de hectares, mas foi reduzida para 1,4 milhão. E que 30% da terras do Pará atualmente pertencem ao Estado. (E. L.)
(Edivanildo Lobo-O Liberal-Belém-PA-06/11/02)

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