VOLTAR

Coordenador Geral da Coiab exige homologação da Terra Indígena Raposa Serra do Sol em área contínua

Coiab-Manaus-AM
Autor: Jecinaldo Barbosa Cabral / Satere Mawe
10 de Jun de 2003

O Coordenador Geral da Coiab - Jecinaldo Barbosa Cabral, do povo Satere Mawé, que participa da Mobilização convocada pelo Conselho Indígena de Roraima - Cir, por ocasião da visita do Ministro da Justiça Márcio Thomaz Bastos a este Estado, e que pretende ouvir os índios e outros setores sociais e políticos, exigirá do Governo Federal ²que homologue a Terra Indígena Raposa Serra do Sol em área contínua e que não continue expondo os direitos dos povos indígenas de Roraima a forças políticas locais vinculadas a interesses econômicos contrários à homologação de terras indígenas." Leia, a seguir, na íntegra o discurso do Coordenador Geral da Coiab.

A necessária homologação da terra indígena raposa serra do sol
Excelentíssimo Sr. Ministro da Justiça
Dr. Márcio Thomaz Bastos
Autoridades presentes
Tuxauas e demais lideranças dos povos
e organizações indígenas de Roraima
Senhores e senhoras:

A Coordenação das Organizações Indígenas da Amazônia Brasileira - COIAB, instância máxima de articulação dos povos e organizações indígenas nos nove Estados da Amazônia Legal, com uma base política de 165 povos indígenas e 74 Organizações Regionais, que por sua vez tem na sua base dezenas de organizações locais, preocupada com o impasse que cerca o processo demarcatório da Terra Indígena Raposa Serra do Sol e pelas sucessivas tentativas de impedir a homologação desta terra conforme determina a Constituição Federal e a legislação especifica, através da minha pessoa quer manifestar:

Para a COIAB, o retardamento da homologação da Terra Indígena Raposa Serra do Sol, identificada e delimitada pela Portaria da Funai No 09/E, de 18 de maio de 1993, e declarada posse permanente aos povos Ingaricó, Macuxi, Patamona, Taurepang e Wapichana, através da Portaria Ministerial de No 820, de 11 de dezembro de 1998 (DOU 14/12/98), só contribui para agravar o quadro de discriminações e preconceitos, de ameaças e manifestações de violência, inclusive através de assassinatos, violações, enfim, de direitos humanos praticados ao longo dos anos contra os povos indígenas de Roraima.

As diversas manobras e barganhas que visam obstaculizar e tentam impedir que o presidente da República assine o Decreto de Homologação da Terra Indígena, subestimando as fases cumpridas do processo demarcatório e desrespeitando claramente a Constituição Federal que reconhece os direitos originários dos povos indígenas sobre as terras que ocupam tradicionalmente, induzem lamentavelmente a uma inversão de direito, ao contrariar o texto constitucional e o procedimento de demarcação das terras indígenas estabelecido em lei e que não prevê nenhum outro procedimento fora a identificação, delimitação, demarcação física e homologação, antes do devido registro no Departamento de Patrimônio da União.

O presidente Luís Inácio Lula da Silva homologou nos primeiros meses de seu governo várias terras indígenas. No entanto, tem retardado a homologação da Terra Indígena Raposa Serra do Sol, sob a justificativa que a situação desta área é peculiar, porque nela existem vilas e pessoas que estão lá há muitos anos e que essa situação precisaria de uma inspeção especial presidida pelo Sr Ministro da Justiça. Ora, nesse ponto de vista se esquece, propositalmente, que os índios já estavam lá, muito bem antes dos brancos, que incentivados normalmente por políticos vinculados a setores econômicos poderosos avançaram sobre a terra dos índios, desrespeitando a sua cultura e direito originário, e não poucas vezes a sua integridade física e psicológica.

Ceder a essas pressões, e não homologar a Raposa Serra do Sol implicará, sabemos por experiência, em incentivo aos invasores da Terra Indígena, e no agravamento da discriminação, do preconceito e dos atos de violência praticados contra os povos indígenas. E poderá, ainda, ser interpretado como um ato de concessão a interesses contrários aos direitos indígenas e como uma expressão de falta de vontade do governo em reparar a dívida social do Estado e da sociedade brasileira para com os povos indígenas.

A Raposa Serra do Sol já custou muito sofrimento e mortes aos povos indígenas de Roraima, como o mais recente assassinato do índio macuxi Aldo da Silva Mota, executado no início do mês de janeiro de 2003, dentro da fazenda Retiro do vereador Francisco das Chagas, e enterrado em cova rasa pelos assassinos.

Por conta de tudo isso, a COIAB exige do Governo Federal:

Que homologue a Terra Indígena Raposa Serra do Sol em área contínua e que não continue expondo os direitos dos povos indígenas de Roraima a forças políticas locais vinculadas a interesses econômicos contrários à homologação de terras indígenas.

Que o Governo cumpra com o compromisso de "articular um programa especial e emergencial visando demarcar, homologar e registrar todo o atual passivo de terras indígenas não-demarcadas, corrigir processos demarcatórios e desintrusar as Terras Indígenas ilegalmente ocupadas por não-índios".

Que respeite o procedimento de demarcação das terras indígenas, segundo o qual percorrido todos os passos legais deve proceder a assinar o Decreto de homologação das terras indígenas, com mais razão, se lembrarmos que estas já tiveram seus limites determinados e foram demarcadas fisicamente, com verbas públicas e da cooperação internacional, evitando assim desperdícios no uso dos recursos públicos.

Os atos concretos de demarcação das terras indígenas, senhores e senhoras, carecem de confirmação do Poder Legislativo, e de quaisquer outras artimanhas e procedimentos políticos, uma vez que decorrem de imperativo constitucional, expresso no artigo 231 da Constituição Federal em vigor, que manda a União demarcar as terras indígenas, e garante a posse indígena contra qualquer outra, pois "são nulos, extintos e incapazes de produzir efeitos jurídicos os atos que tenham por objeto a ocupação, o domínio e a posse das terras tradicionalmente ocupadas pelos índios".

Depois de tantos anos, entendemos que nada justifica tanta morosidade na regularização fundiária das terras indígenas, que só se traduz no agravamento da situação de conflito a qual vivem submetidos os índios.

Esperamos que o governo do Presidente Luis Inácio Lula da Silva estabeleça claras diferenças com os seus antecessores e mostre que não é submisso aos interesses contrários aos direitos indígenas no Estado de Roraima e no resto do país. Com todos os problemas, continuamos acreditando nas palavras que ao longo destes anos o hoje Presidente Lula nos dirigiu. Não gostaríamos de ver nossos sonhos e esperanças serem vencidos pelo medo, nem que articulações políticas como as aqui citadas conduzam para um possível rompimento político do Governo Brasileiro com os Povos Indígenas. Que a esperança vença o medo.

As notícias aqui publicadas são pesquisadas diariamente em diferentes fontes e transcritas tal qual apresentadas em seu canal de origem. O Instituto Socioambiental não se responsabiliza pelas opiniões ou erros publicados nestes textos. Caso você encontre alguma inconsistência nas notícias, por favor, entre em contato diretamente com a fonte.