VOLTAR

Consorcio desiste de asfaltar

O Liberal
31 de Jul de 2005

Consórcio desiste de asfaltar
Queda no preço da soja e altas dívidas tiram os sojeiros do projeto de asfaltamento da rodovia
Ronaldo Brasiliense (Da Sucursal de Brasília)
A queda dos preços da soja no mercado internacional e o alto endividamento dos produtores de soja do Centro-Oeste, que já ultrapassaria R$ 20 bilhões, inviabilizaram o sonho do Consórcio de Sojeiros de asfaltar a rodovia Santarém-Cuiabá (BR-163), uma das principais promessas de campanha do presidente Luiz Inácio Lula da Silva nos palanques paraenses. A mesma promessa, feita também pelo ex-presidente Fernando Henrique Cardoso (PSDB), também não foi cumprida nos seus oito anos de mandato. A inviabilidade do asfaltamento da rodovia, pelo menos por ora, é mais um obstáculo para tirar a região oeste do Pará do isolamento, contra o qual se mobilizam segmentos empresariais, políticos e sociais da região, que clamam por socorro ao Poder Público (veja matéria na página seguinte).
O governo federal, através dos ministros Ciro Gomes, da Integração Nacional, e Alfredo Nascimento, dos Transportes, vinha incentivando o Consórcio da Soja a asfaltar a Santarém-Cuiabá, no que seria a primeira Parceria Público-Privada da gestão do presidente Lula. As vantagens competitivas de escoar a produção agrícola do Centro-Oeste pela BR-163, porém, acabaram criando uma briga de foice entre as tradings e os produtores de soja.
O asfaltamento da BR-163 foi incluído no plano plurianual do governo Lula. Isso acirrou o interesse das principais esmagadoras de soja do País, que, em parceria com os produtores, tentaram retomar o projeto de um consórcio com grandes empreiteiras para concorrer à licitação que seria aberta ainda este ano.
Entre as tradings interessadas no projeto apresentaram-se o Grupo André Maggi, da família do governador do Mato Grosso, Blairo Maggi - tido como o rei da soja” -, e as multinacionais americanas Cargill, Bunge e ADM. Também as empresas do setor eletroeletrônico instaladas no distrito industrial da Zona Franca de Manaus poderiam habilitar-se ao projeto, uma vez que o transporte de bens pela Santarém-Cuiabá diminuiria em até três dias o tempo para se chegar com os produtos aos concorridos mercados do Sudeste e Sul do País.
O prefeito Otaviano Pivetta, de Lucas do Rio Verde, município do norte do Mato Grosso, foi encarregado de organizar o consórcio para a conclusão da rodovia. A idéia do consórcio seria tomar empréstimos a serem concedidos pelo governo federal, através do Banco Nacional do Desenvolvimento Econômico-Social (BNDES) e dos fundos constitucionais do Centro-Oeste e do Norte. Depois de concluída a obra, passaria a cobrar pedágio por um prazo inicial de 25 anos para quitar a dívida, segundo plano apresentado ao governo federal pelo governador Blairo Maggi. O pedágio para os produtores de soja custaria entre US$ 5 e US$ 8 por tonelada. Segundo o gerente da BR-163, o engenheiro do Ministério dos Transportes, José Maria da Cunha, havia a expectativa de que as obras se iniciariam ainda em 2005 e estariam concluídas em três anos.
Custo previsto de US$ 175 milhões poderia ser coberto com tranqüilidade
Os volumes anuais de movimentação de produtos agrícolas previstos para a rodovia Santarém-Cuiabá são expressivos e mostram que em pouco tempo, entre sete e dez anos, dependendo do preço do pedágio, o custo previsto da obra, de US$ 175 milhões, seria coberto com tranqüilidade. Para esse cálculo, o prefeito Otaviano Pivetta, de Lucas do Rio Verde (MT), considera pedágio de US$ 5 por tonelada e volume de 5 milhões de toneladas de produtos por ano. Somados os custos para manutenção da estrada e os juros, o prazo pode até ultrapassar os dez anos.
A maior polêmica em torno do projeto ficou em torno da decisão do Consórcio da Soja de asfaltar a estrada somente até Miritituba, às margens do rio Tapajós, no município de Itaituba, de onde a produção agrícola seria transportada em barcaças até os portos de Santarém e Macapá. A exclusão do asfaltamento até Santarém mereceu o veemente repúdio do governador do Pará, Simão Jatene (PSDB), e da prefeita de Santarém, Maria do Carmo Martins (PT).
O argumento dos produtores de soja para não levar o asfalto até Santarém - a maior cidade do Baixo-Amazonas - seria a economia de até R$ 100 milhões. Na verdade, deixar Santarém de fora dos benefícios do asfalto seria uma artimanha para prejudicar a gigante Cargill, que investiu US$ 20 milhões e já opera um terminal de grãos no porto em Santarém com capacidade para 800 mil toneladas de soja/ano. Sem a BR-163 asfaltada, a Cargill movimenta atualmente apenas metade desse volume, com a soja que chega pelo rio Madeira e é adquirida no oeste do Mato Grosso.
Os grupos Amaggi e Bunge - este, o maior esmagador de soja do Brasil -, rivais da Cargill, já são parceiras na logística da soja. Além de serem sócias no projeto do Terminal Graneleiro de Grãos (TGG) em Santos (SP), assinaram contrato pelo qual a Amaggi aluga parte de sua capacidade no porto de Itacoatiara, no Amazonas, para a Bunge, abrindo as portas à multinacional norte-americana para garantir o escoamento de soja pelo norte do Brasil. (R. B.)

Pavimentação é sonho acalentado sobretudo por produtores agrícolas
A rodovia Santarém-Cuiabá começou a construída em 1973, à época do milagre brasileiro”, durante o governo do general Emílio Garrastazu Medici. Mas, dos seus mais de 1.700 quilômetros de extensão, apenas 850 km foram efetivamente pavimentados, a maior parte no Estado do Mato Grosso. Atualmente, durante o inverno amazônico”, entre dezembro e junho, a rodovia fica intransitável, principalmente em território paraense.
O asfaltamento da BR-163 é o sonho dos produtores agrícolas do Centro-Oeste, principalmente dos instalados no do Mato Grosso. Escoar as safras de soja por portos fluviais nos Estados do Pará e Amapá diminuiria significativamente o custo com frete para a exportação. A economia com frete seria de até R$ 50 milhões por ano. Atualmente, a maior parte da safra de grãos do Mato Grosso é escoada por caminhões - ou pela ferrovia Ferronorte -, até os portos de Paranaguá, no Paraná, e Santos, em São Paulo.
Além do asfaltamento da BR-163, os produtores de soja do Centro-Oeste também defendem a ampliação da Ferronorte e a hidrovia do rio Madeira como obras prioritárias para solucionar o gargalo na logística de escoamento da soja produzida pelo Mato Grosso. Se mantiver o ritmo atual de crescimento de safra, o Estado do Mato Grosso alcançará 45 milhões de toneladas em 2010.
Essas quatro vias são muito importantes para o nosso Estado, que não possui recursos para a sua conclusão. Daí a necessidade das PPPs”, defende o governador Blairo Maggi.
Com a conclusão da BR-163, os produtores acreditam que poderão incorporar pelo menos mais de 3 milhões de hectares à lavoura de soja. Embora os agricultores garantam que a expansão não se dará em nenhuma área de floresta, as principais organizações não-governamentais (ONGs) com atuação na Amazônia temem que a BR-163 desencadeie um processo de ocupação predatório da floresta amazônica, abrindo uma nova frente de desmatamentos sem freios. (R. B.)

O Liberal, 31/07/2005

As notícias aqui publicadas são pesquisadas diariamente em diferentes fontes e transcritas tal qual apresentadas em seu canal de origem. O Instituto Socioambiental não se responsabiliza pelas opiniões ou erros publicados nestes textos. Caso você encontre alguma inconsistência nas notícias, por favor, entre em contato diretamente com a fonte.