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Complexo do Açu já muda a vida no norte do Rio

OESP, Economia, p. B9
04 de Mai de 2008

Complexo do Açu já muda a vida no norte do Rio
Emprego deve crescer na região, mas impacto na segurança e no meio ambiente preocupa

Alberto Komatsu

Aos 68 anos, a pensionista Cecília Machado França jamais havia visto um movimento tão grande de caminhões na estrada onde mora. Nascida em São João da Barra, no litoral norte fluminense, ela ainda não se acostumou com o tráfego intenso diante da porta de sua casa, a cerca de dois quilômetros da entrada do que será o Complexo Portuário do Açu, investimento de US$ 2,5 bilhões que começa a ser erguido. São 160 caminhões por dia que trafegam carregados de argila para firmar o terreno de algumas áreas que abrigarão imóveis e máquinas.

"Já está dando para comprar uma carne um pouco melhor", diz Cecília, que tem dois filhos e três genros ex-lavradores trabalhando no porto. Ao lado de seu terceiro filho, Roberto, lavrador de 34 anos, ela diz que, no início, tinha receio das obras e medo de se mudar. "O pessoal (do porto) veio aqui e falou que a vida vai melhorar e que vai ter muito emprego."

O dono do empreendimento, o empresário Eike Batista, já negocia investimentos de pelo menos US$ 12 bilhões só para a instalação de uma siderúrgica. Uma montadora e uma termelétrica também deverão integrar o projeto, que já rende bons resultados para estabelecimentos comerciais locais e até uma cooperativa de costureiras. Moradores foram beneficiados com as melhorias da estrada de terra que leva ao porto, que antes tinha alagamentos.

Letícia Barreto Gomes, vendedora de uma loja de rações, diz que as vendas aumentaram 10% desde o início das obras. A Costurarte, cooperativa de costureiras, negocia com a LLX para produzir uniformes para os funcionários do projeto.

Para autoridades e acadêmicos, a enorme quantidade de trabalhadores que viverão temporariamente nas proximidades de São João da Barra preocupa. O receio é com segurança, prostituição e aumento do custo de vida.

A prefeita local, Carla Machado (PMDB), negocia com a LLX a construção de alojamentos com infra-estrutura para evitar a aproximação dos trabalhadores das pessoas que moram perto do porto. "A idéia é que eles venham a intervir na cidade da menor maneira possível."

O gerente de operação portuária da LLX, Romeu Rodrigues, estima que serão 1,5 mil trabalhadores no pico das obras. Atualmente, já trabalham cerca de 800 pessoas.

MEIO AMBIENTE

Entre especialistas de meio ambiente, porém, a preocupação é com o impacto na área de restinga, vegetação predominante no entorno do porto. "A termelétrica terá capacidade para 2 mil Megawatts (MW). É mais do que as usinas de Angra 1 e 2 juntas. Você não gera energia nessa quantidade impunemente", diz o professor de educação Ambiental do Centro Federal de Educação Tecnológica de Campos dos Goytacazes (Cefet), Hélio Gomes Filho.

Segundo ele, o receio é o de haver uma mudança na temperatura da água do mar, que será utilizada para resfriar as máquinas da termelétrica.

O integrante da ONG Cidade 21, Roberto Moraes, diz que as pedras a serem usadas na construção virão de uma pedreira adquirida pela LLX em Campos, no morro de Itaoca. Ele receia o aumento de tráfego dos caminhões em Campos e região. A areia que será retirada do fundo do mar para o porto receber navios de grande porte também preocupa.

Romeu Rodrigues, gerente da LLX, diz que cerca de 30% da área total do porto, de 7,8 mil hectares, será de preservação ambiental. Para cada árvore extraída da restinga, serão replantadas cinco.

Plano inclui montadora e siderúrgica na região
LLX já assinou com grupo de Cingapura protocolo de intenções para instalação de termoelétrica

Três empreendimentos já estão sendo negociados para se instalarem no Porto do Açu. Um protocolo de intenções para a construção de uma termoelétrica já foi assinado com a holding Temasek, de Cingapura. Eike Batista também negocia com o grupo ítalo-argentino Techint a instalação de uma siderúrgica. O empresário mantém ainda conversas com os indianos da Tata para uma montadora de automóveis.

A negociação com a Tata envolve a venda de até 50% do sistema AVG, jazidas de minério de ferro localizadas em Serra Azul (Minas Gerais). Elas foram adquiridas por US$ 224 milhões em julho do ano passado. De acordo com Eike, como contrapartida pela negociação, a Tata construiria uma montadora no Porto do Açu. Os investimentos e prazos para esse empreendimento, porém, não foram revelados pelo terceiro homem mais rico do Brasil, com uma fortuna de US$ 6,6 bilhões, segundo a revista Forbes.

Em recente entrevista, o presidente da LLX, empresa responsável pelo porto, Ricardo Antunes, informou que apenas a siderúrgica traria um investimento de US$ 12 bilhões. O executivo, no entanto, não revelou o nome do investidor, mas disse que a idéia era uma unidade com capacidade para produzir 10 milhões de toneladas de aço por ano.

Segundo fontes do setor, o investidor seria o grupo ítalo-argentino Techint, cujo objetivo seria investir US$ 3 bilhões numa siderúrgica de 5 milhões de toneladas de aço por ano, principalmente tubos. O interesse seria atender à crescente demanda por esse produto vinda do setor de petróleo, além de obras de saneamento e vendas para o exterior. Representantes do grupo Techint confirmaram seu interesse para a prefeita de São João da Barra, Carla Machado, no fim do ano passado.

O Porto do Açu faz parte do sistema MMX Minas-Rio, que vai ligar as minas de minério de ferro de Eike em Minas Gerais por meio de um mineroduto de 525 quilômetros de extensão. No porto do Açu, haverá uma via de acesso ao mar de 2,7 mil metros de extensão, que terá um píer de 700 metros com seis berços de atracação. Atualmente, estacas metálicas de 35 metros de altura estão sendo colocadas para a construção desse acesso.

O calado do porto terá 18 metros. Para isso, uma draga chinesa de última geração já remove areia do fundo do mar todos os dias - a areia é reposta em outra área do mar. O complexo portuário já tem pronta uma usina de concreto que fará quatro estacas por dia para estruturar o terreno do complexo.

OESP, 04/05/2008, Economia, p. B9

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