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Comitê Intergovernamental da Ompi discute proteção de conhecimentos tradicionais

Coiab-Manaus-AM
29 de Jul de 2003

O Comitê Intergovernamental da Organização Mundial da Propriedade Intelectual (Ompi), órgão da Organização das Nações Unidas (ONU), realizou, no período de 07 a 15 de julho, em Genebra, Suíça a sua V sessão plenária. O Comitê, integrado por delegados de 179 países, discutiu, entre outros temas, a proteção do folclore, dos conhecimentos tradicionais e da biodiversidade.

Integraram a delegação brasileira Leonardo de Athayde, da missão do Brasil em Genebra; Vanessa Dolce de Faria, da Divisão de Propriedade Intelectual do Itamaraty; Vilmar Guarani, da CGDDI - Funai; e o advogado do Warã Instituto Indígena Brasileiro, Paulo Celso de Oliveira / Pankararu, que relatou para o Site da Coiab o desenvolvimento da reunião da OMPI.

O Brasil, coordenador do bloco de países da América Latina e Caribe, apresentou significativas manifestações para a proteção dos direitos indígenas. Parabenizou o Comitê Intergovernamental pela organização e produção de documentos para o evento, acerca dos sistemas nacionais de proteção dos conhecimentos tradicionais e da biodiversidade, banco de dados para registros dos conhecimentos tradicionais e participação indígena junto ao Comitê. Mas também protestou pela falta de tradução de tais documentos do inglês para o Espanhol, visando facilitar a leitura pelos povos indígenas. A Delegação brasileira criticou a criação de bancos de dados, argumentando que isso geraria um ônus para as comunidades indígenas, e defendeu a obrigação de constar a identificação da origem, nos casos de produtos ou processos realizados a partir de conhecimento tradicional indígena. Dessa forma estaria garantindo-se o controle do acesso aos conhecimentos tradicionais e a aplicação de cláusulas contratuais que determinem a repartição de benefícios junto às comunidades indígenas.

O mandato do Comitê Intergovernamental, que concluía nesta sessão, foi motivo de muita discussão, se devia ou não continuar. A discussão obedeceu a lógica da divisão entre países ricos e países em desenvolvimento. Os Estados Unidos e países europeus, estavam mais inclinados à continuidade do Comitê, para que continuasse realizando estudos e debates sobre os mecanismos de proteção dos conhecimentos tradicionais, da biodiversidade e folclore, a partir das legislações nacionais. Os países africanos queriam que fosse logo instaurada a negociação de um instrumento internacional, através de um sistema sui generis, de proteção dos conhecimentos tradicionais. A posição brasileira era mais conciliadora. O Brasil entendeu que é necessário encaminhar a discussão para a criação desse instrumento internacional, mas o Comitê Intergovernamental deveria primeiramente criar as condições básicas para iniciar a discussão de dito instrumento, possibilitando a continuidade dos estudos e debates sobre as legislações nacionais.

No final, os países africanos não abriram mão de sua pretensão. Não havendo consenso, decidiu-se levar os assuntos para a apreciação e decisão da Assembléia Geral da OMPI, a realizar-se em Genebra, no mês de setembro próximo. Caso seja confirmada a continuidade do Comitê Intergovernamental, ele deverá reunir-se novamente no período de 15 a 24 de março de 2004.
A participação indígena

A participação dos povos indígenas no Comitê Intergovernamental foi também discutido. Vários assuntos foram levantados: devem utilizar-se os recursos já existentes na OMPI para custear as despesas de dirigentes indígenas ou se cria um fundo voluntário para financiar a sua participação; os dirigentes indígenas devem ser selecionados internamente em seus países, obedecendo um sistema de rotatividade de países beneficiários, ou se apóiam os membros indígenas do Conselho Permanente da ONU.

Na V sessão, porém, a participação indígena foi bastante restrita, tanto do ponto de vista da presença de dirigentes indígenas, como a respeito da possibilidade deles se manifestarem. Pelo sistema do Comitê Intergovernamental, a mesa diretora franqueia o uso da palavra primeiramente aos representantes dos Estados, que são muitos. Em seguida para representantes de organismos internacionais, como a UNESCO e Conferencia das Partes da Convenção da Diversidade Biológica - CDB. Finalmente, para as ONGs e organizações indígenas, quase no fim da sessão, impedindo espaço para debates. Desta vez, participaram indígenas fazendo parte das delegações oficiais do Brasil, Estados Unidos, México e Panamá, ou representando organizações indígenas das Philipinas, Noruega, Peru, Colômbia e Bolívia.

Algumas dessas lideranças, e ONGs presentes, manifestaram-se, defendendo que a proteção dos conhecimentos tradicionais seja feita através de um sistema sui generis independente do sistema tradicional de proteção da propriedade intelectual; alegaram que dada a peculiaridade dos conhecimentos tradicionais e a necessidade de tratar os povos indígenas enquanto povos, reconhecer seus direitos territoriais e livre determinação e proteger as culturas indígenas diante a globalização, teria que ser realmente um sistema totalmente diferente.

"Nisso discordamos em parte, disse o advogado Paulo Celso de Oliveira / Pankararu, porque é possível criar um ramo especial dentro do atual sistema de proteção dos conhecimentos tradicionais, reconhecendo a natureza coletiva dos direitos indígenas, a necessidade de estabelecer um processo para a obtenção do consentimento prévio e informado das comunidades indígenas e a repartição eqüitativa dos benefícios entre outros itens diferenciados. Além disso, a proteção dos direitos indígenas deve ser discutida considerando a natureza especifica de cada organismo internacional, ou seja, na OMPI a discussão é sobre a proteção dos direitos intelectuais coletivos dos povos indígenas e não é possível ir muito além disso. Contudo, defendemos também que sejam buscados mecanismos para proteger os povos indígenas, seus territórios e suas culturas diante do processo de globalização."

O advogado Paulo Pankararu recomenda que as organizações indígenas passem a participar das discussões da OMPI para proteger seus direitos. No caso deve ser preenchido um formulário com pedido de credenciamento e encaminhado à OMPI. Esse credenciamento dá direito a voz nas sessões do Comitê Intergovernamental. O formulário pode ser conseguido no seguinte endereço: grtkf@wipo.int, ou junto ao Instituto Warã, pelo telefone (61) 3227447

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