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Com pouco controle, arqueologia vive explosão no Brasil

FSP, Ciência, p. C13
10 de Jul de 2011

Com pouco controle, arqueologia vive explosão no Brasil
Crescimento de trabalho em sítios arqueológicos foi impulsionado pelas obras de infraestrutura do PAC
Número de escavações aumentou 19.300% em 20 anos; falta de regulamentação do arqueólogo é problema

Claudio Angelo
De Brasília

Graças ao PAC (Programa de Aceleração do Crescimento), nunca se fez tanta pesquisa arqueológica no Brasil. E nunca se perdeu tanto patrimônio arqueológico.
O aquecimento da economia e a explosão nas obras de infraestrutura fizeram o número de escavações saltar de 5 para 969 entre 1991 e 2010 ""um crescimento de 19.300%.
Somente após 2006, quando o PAC foi lançado, o aumento nas licenças foi de 130%. Este ano deve fechar com 1.300 autorizações ""o uma média de uma nova pesquisa a cada seis horas.
O número de cursos de graduação em arqueologia decuplicou na última década. E o de sítios arqueológicos registrados no Brasil subiu de 15 mil para 20 mil só no último ano, segundo o Iphan (Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional).
Esses números escondem um problema: 90% das pesquisas autorizadas são de arqueologia de salvamento ""a "arqueologia de contrato".
Exigência legal do licenciamento ambiental de uma obra, esse tipo de pesquisa consiste em extrair o máximo de informação possível de sítios que serão destruídos por estradas, hidrelétricas ou por projetos de mineração.
Na semana passada, por exemplo, quando a presidente Dilma apertou o botão que abria as comportas da usina hidrelétrica de Santo Antônio, condenou ao afogamento centenas de petroglifos (murais gravados em pedra pelos índios na pré-história).
Em Santo Antônio, uma empresa contratada por R$ 10 milhões levou 60 arqueólogos ao canteiro de obras e registrou 52 sítios.
"O que conseguimos fazer lá não seria possível na academia", disse à Folha Renato Kipnis, pesquisador da USP e arqueólogo da empresa Scientia, que coordenou o resgate em Rondônia.
Nem todos os sítios têm a mesma sorte. O Iphan frequentemente recebe denúncias de empreendedores que, espremidos pelo calendário das obras, atropelam o trabalho dos arqueólogos.
Em outros casos o problema são os próprios arqueólogos: como a profissão não é regulamentada, qualquer pessoa com especialização pode abrir uma empresa e disputar o mercado.
A SAB (Sociedade de Arqueologia Brasileira) propôs recentemente a criação de uma "autorregulamentação" da profissão de arqueólogo. A ideia é que profissionais qualificados ganhem um "selo" para disputar contratos.
A proposta encontra resistências na comunidade, que diz que faltam arqueólogos: são apenas 700 no país.

Sítio no Tocantins deve ser tombado para ser 'salvo'

DE BRASÍLIA

Pelo menos um sítio arqueológico deve ser salvo das empreiteiras. O Iphan está preparando o tombamento de um conjunto de petroglifos no Tocantins que seria alagado por uma hidrelétrica.
A chamada ilha dos Martírios, no rio Araguaia, divisa entre Pará e Tocantins, abriga mais de 4.000 gravuras rupestres, que se estendem por quase 70 hectares.
O sítio nunca foi escavado nem estudado sistematicamente, e seria destruído pelo reservatório da usina hidrelétrica de Santa Isabel.
Caso seja tombado, o sítio arqueológico não poderá ser mais alterado ""e a usina precisará se mudar. A ilha dos Martírios é um de dez sítios arqueológicos cujo tombamento está sendo preparado pelo Iphan. Alguns processos foram iniciados ainda na década de 1950.
"Durante muito tempo se entendeu que não precisávamos tombar, porque já havia uma lei específica de proteção ao patrimônio arqueológico", diz Maria Clara Migliacio, do CNA (Centro Nacional de Arqueologia) do Iphan.
O resultado é que o país tem hoje apenas 15 sítios arqueológicos tombados, contra 557 sítios históricos. A lei atual, de 1961, só protege o sítio de um empreendimento até a realização de estudos. "É uma proteção relativa", diz Migliacio. (CA)

FSP, 10/07/2011, Ciência, p. C13

http://www1.folha.uol.com.br/fsp/ciencia/fe1007201101.htm
http://www1.folha.uol.com.br/fsp/ciencia/fe1007201102.htm

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