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CO2 tem de começar a cair logo, diz IPCC

FSP, Ciência+saúde, p. C7
03 de Nov de 2014

CO2 tem de começar a cair logo, diz IPCC
Em seu relatório mais contundente, painel do clima da ONU aponta ações para conter aquecimento abaixo de 2oC
Evitar limite 'arriscado' da mudança climática requer que emissões caiam até 70% em 2050 e zerem antes de 2100

Rafael Garcia de São Paulo

O painel do clima da ONU lançou seu alerta mais contundente até agora dizendo que, se as emissões de CO2 não começarem a cair nesta década, será difícil impedir o planeta de ficar 2oC mais quente, limite mais arriscado do aquecimento global.
Para que o planeta tenha 66% de chance de evitar cruzar essa fronteira, as emissões de carbono precisam cair até 70% por volta de 2050 e chegar a zero em 2100, aponta o relatório-síntese do IPCC (Painel Intergovernamental de Mudança Climática).
O documento, lançado ontem em Copenhague (Dinamarca), encerra o AR5 (5o Relatório de Avaliação) do painel resumindo conclusões de três grandes dossiês que o grupo de cientistas publicou nos últimos 12 meses.
Apesar do tom grave adotado pelo documento, apontando que a atual trajetória ascendente das emissões resultará em impactos "irreversíveis", o relatório tentou passar uma mensagem otimista. Dos muitos cenários avaliados em simulações do AR5, só uma pequena fração parecia impedir um aumento de 2oC, mas foi essa que o IPCC escolheu enfatizar agora.
"Tudo o que precisamos é vontade de mudança, a qual esperamos ser motivada pelo conhecimento e entendimento da ciência", disse Rajendra Pachauri, chefe do IPCC, em entrevista coletiva.
O painel do clima insiste em dizer que "não é prescritivo", e que países são livres para decidir o que fazer das emissões de CO2, mas emite seu racado a apenas um mês da próxima reunião do clima com representantes de governos, em Lima (Peru). Manuel Pulgar-Vidal, ministro do ambiente peruano, que presidirá o encontro, estava no lançamento do relatório.
Os cientistas decidiram incluir na síntese final do trabalho uma estimativa de quanto custará a transição para a economia limpa.
Investimentos em combustíveis fósseis deverão cair US$ 30 bilhões ao ano durante as próximas duas décadas, mas energias renováveis aumentariam seu financiamento em US$ 147 bilhões ao ano no mesmo período. Ainda será preciso investir em eficiência energética algo em torno de US$ 350 bilhões por ano.
São números realistas, argumenta o painel, realçando que setor energético já investe US$ 1,2 trilhão por ano.
Se o planeta crescer de 1,6% a 3% por ano no século 21, o impacto da substituição de combustíveis fósseis por tecnologias como energia solar e eólica seria de apenas 0,06%, diz o IPCC, sem considerar os prejuízos que um clima fora de controle traria.

CIÊNCIA E POLÍTICA
Se aquilo que a ciência diz será traduzido em ação política é uma incógnita. "Faltam políticas e instituições apropriadas", diz Youba Sokona, coautor do relatório. "Quanto mais esperarmos para tomar uma atitude, mais caras ficam a adaptação e mitigação da mudança climática."
O relatório-síntese do IPCC é compilado a partir de três grandes dossiês lançados nos últimos 12 meses (um sobre a física do clima, outro sobre impactos do aquecimento e adaptações, outro sobre mitigação). Esta versão também menciona um trabalho especial sobre eventos climáticos extremos e outro sobre energias renováveis.
Mesmo não trazendo tecnicamente nenhuma novidade, o texto do relatório-síntese foi bem disputado por ser considerado um recado mais político, dizem representantes que participaram das reuniões a portas fechadas.
"Houve muita discussão sobre se deveriam dar mais ou menos peso para mitigação ou adaptação", diz Suzana Kahn Ribeiro, do Painel Brasileiro de Mudanças Climáticas. "Países produtores de petróleo em geral não querem que se fale tanto da importância dos combustíveis fósseis. Países como o Brasil querem ressaltar que a importância relativa das mudanças de uso da terra e do solo [desmatamento] está reduzindo."
Segundo Kahn, houve grande preocupação em dar ao documento uma aparência de algo não impositivo. "Tudo o que estava descrito como medida' foi trocado por opções', porque medida dá a conotação de ser uma medida política a ser tomada", diz. A palavra "perigoso", antes associada ao aquecimento de 2oC, quase não aparece mais. Foi preterida por "risco" na maior parte do texto.

FSP, 03/11/2014, Ciência+saúde, p. C7

http://www1.folha.uol.com.br/fsp/cienciasaude/193729-co2-tem-de-comecar…

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