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Ciro pede a CNBB que marque dia para debate

O Globo, O Pais, p.10
08 de Out de 2005

Ciro pede à CNBB que marque dia para debate
Ministro reafirma que vai discutir revitalização do São Francisco mas diz que governo não desistirá da transposição
Com uma entrevista coletiva do ministro Ciro Gomes e uma carta ao presidente da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB) o governo Lula tentou sinalizar ontem disposição de cumprir o acordo que terminou com a greve de fome do bispo de Barra (BA), dom Luiz Flávio Cappio. O ministro propôs ao presidente da CNBB, dom Geraldo Majella Agnelo, que marque hora e local para a reabertura do debate sobre o projeto de revitalização do Rio São Francisco.
— É um compromisso que assumimos, de aprofundar esse debate. Foi uma vitória do diálogo e da transigência do religioso, cuja mensagem captamos com respeito — disse Ciro, que apresentou números para comprovar a segurança do governo acerca do projeto.
O ministro admitiu a possibilidade de o projeto ser modificado, mas disse que espera por bons argumentos. Ele preferiu não fixar limites para o diálogo, e disse que não cairá na armadilha de fixar data para o início da obra.
— Vamos fazer desse diálogo uma coisa honesta. Não estamos fazendo aqui uma conversa fiada. O debate durará enquanto for necessário. A obra só será madura para ser feita quando o diálogo estiver amadurecido.
Ciro citou vários dados técnicos para defender a obra, de órgãos como o Comitê de Bacias do São Francisco e a Agência Nacional de Águas (ANA). E deixou claro que o governo não mudará de idéia:
— Como um ex-governante e hoje auxiliar de governante não creio que se precise de unanimidade na opinião púbica para se fazer uma coisa honesta. Não vamos impor, mas exercitar nossa obrigação da forma mais correta e ética.
O projeto está parado por força de uma liminar que cassou a licença prévia concedida pelo Ibama, que permitia o andamento dos processos de licitação. O governo vai recorrer mas, mesmo saindo vitorioso, o início das obras precisa esperar outra autorização do Ibama, a licença de instalação, ainda em análise. A intenção do governo é começar os trabalhos com equipes do Exército, enquanto tramita a licitação para construção dos 14 trechos de canais.
O ministro fez um histórico das audiências públicas e consultas a entidades da sociedade civil feitas desde o início do governo, mas admitiu que há desinformação e preconceito sobre a proposta. Ele também atribuiu à disputa política boa parte da oposição à obra — dois grandes canais que captam água do São Francisco, atravessando quatro estados: Paraíba, Pernambuco, Ceará e Rio Grande do Norte. Ele citou como um dos mais ferrenhos opositores o governador de Sergipe, João Alves, do PFL, a quem chamou de neoambientalista.

Mau pastor
O BISPO Luiz Flavio Cappio rompeu o jejum político-panfletário, diante da promessa do governo de revitalizar o São Francisco antes de executar o projeto de transposição — se é que isso é factível, considerando-se a urgência da obra.
CAPPIO E os movimentos sócio-indígenas que o apoiaram conseguiram o que praticamente já estava garantido, por meio de uma emenda constiticional que tramita há algum tempo no Congresso, com apoio explícito de autoridades.
DA GREVE de fome, então, restaram o show de manipulação messiânica explícita e um péssimo exemplo de um pastor para seu rebanho.

Bispo de Barra ameaça retomar grave de fome
Ele cobra do governo promessa que o levou a suspender protesto
O bispo de Barra (BA), dom Luiz Flávio Cappio, ameaçou ontem retomar a greve de fome caso o governo não cumpra a promessa feita pelo ministro das Relações Institucionais, Jaques Wagner. Dom Luiz ficou preocupado com declaração do ministro de que o governo não pretende adiar nem suspender a obra de transposição. Em carta ao bispo, o presidente Lula se comprometeu a prolongar o diálogo sobre o projeto, priorizar a revitalização e o saneamento e liberar verba de R$350 milhões para as obras.
— Se o governo não honrar sua palavra eu volto para o canteiro de obras, desta vez não mais sozinho, mas com os (índios) trukás e todos aqueles que me apoiaram, e reiniciaremos a greve de fome — disse o bispo.
Ele começa a se recuperar dos 11 dias de jejum. Ontem, tomou sopa de legumes e água de coco. O frade franciscano deve viajar amanhã para São Paulo, onde pretende descansar em companhia da família. Ontem à tarde dom Luiz foi para Petrolina (PE), e hoje participa de uma assembléia em Juazeiro (BA) com movimentos sociais, para discutir a campanha contra a transposição.
Dom Luiz Cappio atribuiu o acordo feito na tarde anterior à preocupação do governo com sua imagem perante a opinião pública. O bispo, no entanto, demonstrou confiança de que o presidente Lula cumprirá o prometido.
Ele disse que aceitará o convite de Lula para uma audiência em Brasília, quando pretende ver reafirmado o acordo de que a obra só começará após uma ampla discussão com a sociedade e, sobretudo, com as populações envolvidas. A data da viagem ainda não foi definida.

O Globo, 08/10/2005, p. 10

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