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Centro de formação é destruído por opositores da TI Raposa-Serra do Sol, em Roraima

ISA-Socioambiental.org-São Paulo-SP
Autor: Oswaldo Braga de Souza.
19 de Set de 2005

Cerca de cem homens encapuzados e pintados, entre índios e não-índios, invadiram e destruíram os dois prédios da escola. Segundo a Polícia Federal (PF), quatro pessoas ficaram feridas. A invasão aconteceu quatro dias antes do início das comemorações da homologação da TI, assinada, em abril deste ano, pelo presidente Lula.

Cerca de cem homens encapuzados e pintados, entre índios e não-índios, invadiram e destruíram, por volta das 2h da madrugada do último sábado, dia 17 de setembro, a maior parte dos dois prédios do Centro Indígena de Formação e Cultura Raposa-Serra do Sol, na comunidade do Barro, na Terra Indígena (TI) Raposa-Serra do Sol, a aproximadamente 200 quilômetros de Boa Vista (RR). Segundo a Polícia Federal (PF), quatro pessoas ficaram feridas. Elas foram encaminhadas para a capital para receber atendimento médico e prestar depoimento na Superintendência da PF, que já abriu um inquérito sobre o caso. A escola é mantida pela Diocese de Roraima, mas deve passar às mãos do Conselho Indígena de Roraima (CIR), em janeiro do ano que vem.

A invasão aconteceu quatro dias antes do início das comemorações pela homologação da TI, assinada, em abril deste ano, pelo presidente Luís Inácio Lula da Silva (saiba mais). São aguardadas para festa aproximadamente 9 mil pessoas, entre elas ministros de Estado e outras autoridades do governo federal.

Igreja, hospital, secretaria, refeitório, dormitórios e sala de coordenação da escola foram queimados. Os invasores arrombaram e depredaram salas de aula, cantina, oficina, marcenaria, depósito, cozinha e dispensa. Eles também quebraram os vidros e tentaram incendiar uma ambulância que, na hora, saía do local para levar um paciente rumo à Boa Vista. Os cinco passageiros, inclusive o doente, foram agredidos pelo bando. Alimentos e roupas de alunos e professores também foram inutilizados.

Igreja do centro de formação foi depredada e incendiada

No hospital, equipamentos e móveis revirados e destruídos

Segundo informações colhidas no local pelo CIR, o ataque teria sido coordenado por Anísio Pedrosa, vice-prefeito de Pacaraima, município localizado na TI São Marcos, ao lado da TI Raposa-Serra do Sol. Genilvaldo Macuxi, vereador e tuxaua (liderança indígena) da aldeia de Contão, também teria participado da invasão. Os dois seriam ligados ao prefeito de Pacaraima, Paulo César Quartiero (PDT), maior produtor de arroz da região e um dos principais opositores da homologação da TI.

Em junho passado, o Ministério Público Federal (MPF) em Roraima protocolou uma ação contra os envolvidos nos ataques às comunidades de Jawari, Brilho do Sol, Lilás e Homologação, ocorridos no dia 23 de novembro de 2004. Quartiero foi denunciado pelo MPF como um dos organizadores do crime. Ao todo, 34 casas foram destruídas - queimadas ou derrubadas por tratores - e 131 pessoas ficaram desabrigadas. Um índio foi espancado e baleado. Um posto de saúde e alguns criatórios de animais também foram demolidos. Roupas, redes, mantimentos e plantações foram consumidos pelo fogo e vários animais de criação abatidos (confira).

A grande maioria dos mais de 16 mil indígenas que moram na região é favorável à homologação em área contínua, conforme definida pelo decreto presidencial assinado em abril, mas alguns grupos foram cooptados por políticos, fazendeiros e empresários que não concordam com a medida e defendem que alguns trechos de território sejam excluídos da TI. Com o reconhecimento oficial definitivo do direito dos índios, grandes produtores rurais, principalmente de arroz, terão de deixar a área. O governo federal já iniciou o trabalho de cadastramento, retirada e reassentamento das famílias de não-índios moradoras da TI. O Palácio do Planalto também vem negociando a transferência de cerca de 150 mil hectares em terras federais para o Estado. O governo estadual resiste à oferta e reivindica três milhões de hectares.

"Eles pensaram em fazer isso para atrapalhar a festa. Apesar de terem destruído a escola, não vamos desanimar", afirma Marinaldo Justino Trajano Macuxi, coordenador-geral do CIR. Ele conta que recebeu informações de que os supostos responsáveis pelo ataque estiveram em algumas comunidades da região nos últimos dias para combinar a invasão. Trajano confirma o início da festa da homologação para esta quarta-feira, dia 21 de setembro, e conta que a PF está preparando um esquema especial de segurança para o evento. "Continuam fazendo ameaças de novos ataques. Aqui a Justiça só funciona para quem tem dinheiro e como não temos as coisas ficam difíceis".

O Centro de Formação destruído no sábado tem mais de 50 anos e importância histórica na luta dos índios da região pelo reconhecimento de suas terras. Foi lá que, há quase 30 anos, os tuxauas iniciaram as primeiras reuniões para organizar o movimento pela criação da TI Raposa-Serra do Sol. Atualmente, a escola abriga 38 alunos do curso profissionalizante de agropecuária e mais 17 de mecânica.

"É no centro que estão sendo formados os técnicos e lideranças da Terra Indígena. O futuro da Raposa-Serra do Sol passa por essa escola", conta Luís Ventura Fernandes, que faz parte da coordenação do Centro. Ele lembra também que, além de ser reconhecida formalmente pela Secretaria Estadual de Educação, a escola é citada como instituição de importância estratégica em vários projetos previstos pelo governo federal para a TI em áreas como conservação ambiental, desenvolvimento sustentável e melhoramento de rebanhos, por exemplo.

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