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Casca das árvores filtra a poluição

OESP, Metrópole, p. C3
21 de Set de 2009

Casca das árvores filtra a poluição
Por isso, ar é mais puro dentro dos parques do que no entorno

Marcela Spinosa

A tese que será defendida em outubro no Laboratório de Poluição Atmosférica da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (USP) mostra algo já percebido na prática pelos paulistanos. Nosso organismo está mais protegido da poluição dentro dos parques do que nas extremidades ou fora deles.

O estudo aponta que a concentração de metais pesados no ar é maior nos trechos das áreas verdes próximos a avenidas do que no meio dos parques. O que provoca essa diferença são as árvores, principalmente as do entorno. Elas absorvem os poluentes nas cascas, funcionando como um filtro.

A constatação foi feita pela engenheira florestal Ana Paula Martins, de 34 anos, doutoranda do Laboratório de Poluição da USP, que estudou por quatro anos amostras de cascas de árvores de cinco parques da capital: Trianon e Luz, na região central, Previdência, na zona oeste, e Ibirapuera e Aclimação, na zona sul.

O estudo revela que nenhum deles está imune a pelo menos 11 metais, mas mostra que a concentração desses elementos varia de acordo com a localização de cada parque. O índice de chumbo no Ibirapuera, por exemplo, é de 13,5 mg/kg, enquanto no Previdência, que beira a Rodovia Raposo Tavares, a quantidade é de 3,9 mg/kg.

Para chegar aos índices, a engenheira coletou amostras de cascas da camada externa das árvores que ficavam a 1,5 m de distância do solo. "O ar traz os poluentes, que ficam depositados nas cascas", afirma Ana.

As árvores com maior concentração de poluentes beiram avenidas com grande fluxo de tráfego, como a Avenida Paulista, onde fica o Parque Trianon. Com isso, segundo a engenheira, é possível identificar os tipos de veículos que trafegam próximo a cada área verde e confirmar os efeitos nocivos do tráfego na qualidade do ar.

CONCENTRAÇÃO IDEAL

Ana Paula diz que o escapamento, a freada e o arranque dos carros, que soltam pedaços de pneu, liberam partículas de metais. "Enxofre, zinco, chumbo e cobre vêm da poluição veicular", diz. A dosagem dos metais nas cascas das árvores pode ajudar a listar tipos de poluentes no ar. A Cetesb faz a medição somente dos gases e não indica a sua concentração ideal para evitar males à saúde.

"Encapar as avenidas com cobertura vegetal pode diminuir o impacto da poluição na saúde, além de aumentar a qualidade do ar", explica o professor Paulo Saldiva, médico, pesquisador do Laboratório de Poluição da USP e orientador da tese de Ana, recomendando que a população troque o carro pelo transporte coletivo para melhorar a qualidade do ar.

Inalar metais pesados pode trazer mal-estar tanto imediato, como uma tontura, quanto a longo prazo, como dificuldades de aprendizado, embora não existam estudos suficientes sobre o real impacto desses elementos na saúde humana.

Apesar disso, o que se sabe é que essas substâncias são tóxicas para o corpo. "Elas podem induzir a doenças como câncer e distúrbios neurológicos", afirma o pneumologista da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp) Ciro Kirchenchteje. Já algumas partículas grandes de metais ficariam retidas nos pelos do nariz, evitando a sua inalação. "Mesmo assim, podem irritar os olhos e secar a mucosa do nariz."

Paulistanos sentem os efeitos da má qualidade do ar longe das áreas verdes

Marcela Spinosa

Frequentadora assídua do Parque do Ibirapuera, na zona sul da capital, a professora de Educação Física Vanessa Burkhardt, de 31 anos, diz que seu rendimento é muito melhor dentro do parque do que fora dele. "A oxigenação triplica dentro do parque", garante.

A professora vai ao Ibirapuera pelo menos três vezes por semana para correr, andar de bicicleta ou caminhar. Para chegar até lá ela usa o carro. Se pretende pedalar, deixa o carro em casa e usa a bicicleta para chegar ao parque. Mas diz que assim que deixa o Ibirapuera seu organismo sente os efeitos da poluição. "Na pista de corrida, cercada de árvores, não preciso fazer tanto esforço para respirar quanto faço nas áreas próximas às avenidas que rodeiam o parque", conta.

A diferença entre seu rendimento dentro e fora do parque fez com que Vanessa questionasse o que provoca essa sensação. "Sempre pensei que fossem as árvores porque todos dizem que elas melhoram a qualidade do ar", conta.

BAIRROS ARBORIZADOS

O músico Lucas Valença, de 26 anos, chegou à mesma conclusão que Vanessa depois de perceber que pedala melhor em áreas verdes. "Não é preciso nem ir a um parque. Basta se exercitar em um bairro arborizado e comparar a reação do corpo com a maneira como se comporta quando estamos em uma grande avenida", diz.

O jovem, além de fazer exercícios em uma academia, passeia ou pedala com seu cachorro, um boxer, nas ruas próximas ao Aeroporto de Congonhas, na zona sul, nos finais de semana. "Percebo que até ele fica menos ofegante quando estamos em bairros arborizados", revela.

Para evitar que o nariz seque e ele tenha dificuldade para respirar durante os exercícios, Lucas toma muita água para se manter hidratado - seu cachorro também - e evita sair às ruas entre 10h e 16h.

OESP, 21/09/2009, Metrópole, p. C3

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