VOLTAR

Carteira Indígena promove segurança alimentar e nutricional

Coletiva - www.coletiva.org
Autor: Anna Marques
07 de Mai de 2015

Resultado da demanda dos próprios índios, o Programa Carteira Indígena é voltado para ações na área de segurança alimentar e nutricional das comunidades. Tal necessidade foi reforçada pela divulgação de dados oficiais da Organização Mundial de Saúde (OMS) e da Fundação Nacional de Saúde (Funasa) na década de 2000, que revelaram índices alarmantes de subnutrição e mortalidade infantil entre crianças indígenas no Brasil.

Iniciado em 2004, a Carteira Indígena é um projeto do Ministério do Meio Ambiente e do Ministério de Desenvolvimento Social e Combate à Fome. Trata-se do primeiro de âmbito nacional que oferece recursos diretamente às associações indígenas. Segundo Lylia Galetti, que coordenou o programa desde sua criação, seu objetivo é "promover a segurança alimentar e nutricional nas comunidades indígenas e a gestão ambiental de suas terras". Para isso, ela apoia iniciativas indígenas de produção sustentável de alimentos, artesanato e práticas agroextrativistas e de melhoria das condições ambientais.

Envolvendo 95 etnias, a Carteira atende mais de 22 mil famílias e apoia 311 projetos. Entre os parceiros governamentais estão o Ministério do Desenvolvimento Agrário (MDA), Ministério da Educação (MEC), Ministério da Cultura (MinC) e a Fundação Nacional do Índio (Funai). Já foram investidos, aproximadamente, 15,5 milhões de reais apenas no fomento direto aos projetos para atender as comunidades.

Até 2009, as demandas chegavam ao projeto de forma espontânea por meio de organizações regionais e associações comunitárias indígenas. A partir de 2010, o Programa passou a operar por meio de Chamada Pública com foco em temas e demandas, a exemplo da Chamada Pública de Projetos junto às mulheres indígenas.

Lylia ressalta que o protagonismo político desses povos na elaboração e execução de projetos e gestão dos recursos é primordial para a Carteira. "É um programa para que os índios construam, encaminhem e executem suas propostas, respeitando a diversidade e o desejo das comunidades, preocupado com o fortalecimento da sua autonomia", diz.

Como forma de desenvolver capacidades entre os indígenas para a execução das atividades e gestão dos recursos, o projeto oferece uma capacitação inicial aos envolvidos. Mas a coordenadora pontua que ainda há deficiência no acompanhamento local continuado e numa assistência técnica adequada para os povos indígenas.

O acompanhamento depende de parcerias, que variam de acordo com o estado em que o programa está inserido. A articulação com os representantes regionais da Funai também é outro fator que influencia o andamento do projeto. "A Carteira nunca teve o objetivo de atuar isoladamente: ela já se inicia como uma ação articulada entre diferentes órgãos de política indigenista do Governo Federal", frisa Lylia.

Ações no Nordeste

Ao contrário do que ocorre na Amazônia, as associações indígenas do Nordeste jamais haviam tido acesso aos recursos públicos diretamente em suas contas para o desenvolvimento de projetos. É o que garante a coordenadora da Carteira, ressaltando o ineditismo dos investimentos do programa na região considerada "a mais agraciada".

Dos 311 projetos apoiados no país, 110 se encontram no Nordeste. Foram investidos cerca de 5,5 milhões de reais, o que representa um terço dos recursos até 2010. Pernambuco e Ceará são os estados que apresentam o maior número de projetos, com 45 e 38, respectivamente.

As atividades realizadas pelas 7.864 famílias envolvidas são variadas, mas a maioria está focada no aumento da produção de alimentos. Além disso, muitos projetos levaram água para comunidades que não tinham acesso. É o caso de Buíque, cidade do agreste pernambucano, onde os Kapinawá passaram a ter o recurso. A partir daí, a comunidade começou a plantar no intuito de levar sua produção à feira todo sábado.

Na visão da representante do Nordeste no Comitê Gestor da Carteira Indígena, Ceiça Pitaguary, os projetos do Carteira Indígena foram uma reivindicação da região frente aos apoios que a região Norte tinha. Ela afirma que eles ajudaram a dar visibilidade aos índios nordestinos, pois não estão inseridos apenas em terra indígena regularizada, como acontece na maioria dos programas.

Além dessa inovação, Ceiça considera como avanço o comitê que analisa os projetos, formado por uma bancada de indígenas e outra governamental. "Esses projetos deram uma melhor condição de vida às comunidades, pois é um recurso que chega até as aldeias, não se perdendo pelo caminho, pois quem elabora e recebe o recurso são as próprias comunidades", destaca.

Articulação e diálogo

O investimento na promoção da autonomia dos índios ressalta o caráter inovador do Programa Carteira Indígena. O antropólogo e assessor da Associação Nacional de Ação Indigenista (Anaí), José Augusto Sampaio, explica que o Estado sempre buscou tornar os povos indígenas seus dependentes diretos. Ele salienta que "há um passivo secular de relações tutelares e assistencialistas do Estado para com os povos indígenas que programas como o Carteira Indígena buscam superar".

Apesar de haver alguns setores governamentais resistentes ao diálogo com os índios, o antropólogo garante que, na última década, houve um avanço significativo junto a setores importantes do executivo federal e de alguns executivos estaduais. "É um diálogo que pode ser aprimorado com a qualificação e a mobilização das próprias organizações indígenas, que estão, de fato, cada vez mais aptas a isso", explica.

A articulação entre os índios para garantir os seus direitos é crescente, mas as dificuldades não deixam de existir. Mesmo contando com uma grande riqueza de experiências, a variedade de culturas e de situações de contato com a sociedade nacional é um exemplo de desafio na luta dos indígenas.

De acordo com Sampaio, muitas organizações indígenas estão investindo na qualificação de líderes mais jovens graduados nas instituições de ensino tradicionais. Tais organizações acreditam que os novos líderes serão mais aptos a lidar politicamente com o mundo não indígena. "Eu penso que o sucesso da articulação na defesa dos direitos indígenas será maior quanto melhor possa se dar o entendimento e os diálogos entre líderes com esse novo perfil e líderes tradicionais", diz.

http://www.coletiva.org/site/index.php?option=com_k2&view=item&id=33:ca…

As notícias aqui publicadas são pesquisadas diariamente em diferentes fontes e transcritas tal qual apresentadas em seu canal de origem. O Instituto Socioambiental não se responsabiliza pelas opiniões ou erros publicados nestes textos. Caso você encontre alguma inconsistência nas notícias, por favor, entre em contato diretamente com a fonte.