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Câmara examina mudanças no Estatuto do Índio

Agência Câmara-Brasília-DF
17 de Set de 2004

A Câmara analisa atualmente seis propostas que alteram o Estatuto do Índio.

A principal delas (PL 2057/91), que tramita há 13 anos na Casa, atualiza vários aspectos do Estatuto (Lei 6001/73). De autoria do ex-deputado e hoje senador Aloizio Mercadante (PT-SP), o PL 2057/91 acabou defasado devido às alterações feitas em legislações paralelas. A proposta tem 51 emendas, 177 substitutivos e quatro projetos apensados.

O projeto estabelece garantias para substituir o regime tutelar contido no antigo Estatuto do Índio. De acordo com a proposição de Mercadante, "a tutela deixou de ser um mecanismo de proteção para se transformar em um instrumento de opressão as sociedades INDÍGENAS". A proposição supera o entendimento de que os INDÍGENAS são relativamente incapazes para a

realização de atos da vida civil.

A proposta também introduz a proteção ao direito autoral e à propriedade intelectual dos índios, para garantir que os conhecimentos e modelos INDÍGENAS só serão utilizados comercial ou industrialmente com o consentimento das próprias comunidades e em seu benefício. O projeto prevê ainda a demarcação imediata de todas as terras já identificadas pelo órgão indigenista, afastando a necessidade de refazer os processos administrativos que resultaram em propostas concretas de delimitação de áreas

(Agência Câmara).

Proj Mozarildo Cavalcanti

PROJETO DE LEI DO SENADO No 188, DE 2004

Dispõe sobre o procedimento administrativo de demarcação de terras indígenas
e dá outras providências.
O Congresso Nacional decreta:
Art. 1o Esta Lei regulamenta o procedimento administrativo de identificação, delimitação, demarcação e declaração das terras indígenas de que tratam o art. 17, I, da Lei no 6.001, de 19 de dezembro de 1973, e o art. 231 da Constituição Federal

CAPÍTULO I

Da Identificação e Delimitação
Art. 2o A identificação e delimitação que instruirão a demarcação
das terras tradicionalmente ocupadas pelos índios serão realizadas com base em trabalhos desenvolvidos por grupo técnico especializado, designado para esse fim.
§ 1o O grupo técnico especializado a que se refere o caput desse artigo realizará estudos de natureza etno-histórica, socioeconômica, jurídica, cartográfica,
ambiental e o levantamento fundiário necessários à delimitação, com a seguinte composição:
I - um antropólogo, indicado pelo Ministério da Justiça, ocupante de cargo público de caráter efetivo, encarregado da coordenação dos trabalhos do grupo especializado;
II - um advogado da União, indicado pela Advocacia- Geral da União, dentre servidores de seu quadro efetivo;
III - um economista, indicado pelo Ministério da Fazenda, dentre servidores de seu quadro efetivo;
IV - um técnico de nível superior, indicado pelo Senado Federal, dentre servidores de seu quadro efetivo;
V - um técnico de nível superior, indicado pelo governo do Estado envolvido, dentre servidores de seu quadro efetivo.

Art. 3o O levantamento fundiário de que trata o art. 2o, § lo, será realizado conjuntamente com o órgão federal ou estadual específico.

Art. 4o Serão obrigatoriamente notificados da instauração do procedimento demarcatório todos os detentores de títulos dominiais de terras situadas na área indígena a ser identificada, bem como os proprietários lindeiros, o Estado e o Município.
Art. 5o O grupo indígena envolvido, representado segundo suas formas próprias, participará do procedimento em todas as suas fases, sendo obrigatório o registro de sua manifestação.

Art. 6o O grupo técnico solicitará, quando for o caso, a colaboração de membros da comunidade científica ou de outros órgãos públicos para embasar os
estudos de que trata este artigo, sendo obrigatório o registro de todas as opiniões colhidas.

Art. 7o Concluídos os trabalhos de identificação e delimitação, o grupo técnico apresentará relatório circunstanciado, no qual será consignada expressamente a posição de cada um de seus membros, caracterizando a terra indígena a ser demarcada.

CAPÍTULO II

Da Fase Instrutória
Art. 8o Aprovado o relatório, será publicado seu resumo no Diário Oficial da União e no Diário Oficial da unidade federada onde se localizar a área sob demarcação, acompanhado de memorial descritivo e mapa da área, devendo a publicação ser afixada na
sede da prefeitura do município da situação do imóvel e comunicados pessoalmente todos os interessados, sob pena de nulidade do procedimento.

Art. 9o Desde o início do procedimento demarcatório até noventa dias após a comunicação pessoal de que trata o art. 8o, poderão, os estados e municípios em que se localize a área sob demarcação, bem assim os demais interessados, se manifestar, apresentando
impugnação contendo razões instruídas com todas as provas pertinentes, tais como títulos dominiais, laudos periciais, pareceres, declarações de testemunhas, fotografias
e mapas, para o fim de pleitear indenização ou para demonstrar vícios, totais ou parciais, do relatório.

Art. 10. Sobre as impugnações dos interessados, manifestar-se-ão grupo técnico especializado responsável pela elaboração do relatório, em parecer conclusivo que mencionará obrigatoriamente todos os pontos aventados.

Art. 11. Os autos serão conclusos à autoridade competente para, em até trinta dias, proferir decisão fundamentada, acolhendo ou rejeitando, total ou parcialmente,
as impugnações oferecidas e:
I - declarando os limites da terra indígena e determinando
a sua demarcação;
II - prescrevendo diligências adicionais que julgar necessárias;
III - desaprovando a identificação ou delimitação.

Art. 12. É assegurado o direito de recorrer da decisão que rejeitar a impugnação.
Parágrafo único. O recurso mencionado no caput será apreciado por instância administrativa independente,
cuja composição obedecerá ao disposto no art. 2o, § 1o.

CAPÍTULO III

Da Fase Decisória
Art. 13. A demarcação das terras indígenas será submetida à aprovação do Senado Federal.
Art. 14. As demarcações administrativas aprovadas pelo Senado Federal submeter-se-ão à homologação por decreto expedido pelo Presidente da República.
Parágrafo único. Se a área identificada e delimitada estiver localizada na faixa de cento e cinqüenta quilômetros de largura ao longo das fronteiras do Brasil com outros países, antes de homologar a demarcação o Presidente da República convocará o Conselho de
Defesa Nacional para os fins do art. 91, § 1o, inciso III,
da Constituição Federal.

CAPÍTULO IV

Disposições Finais e Transitórias
Art. 15. São anulados todos os procedimentos de demarcação em curso na data da publicação desta lei.
Art. 16. O imóvel rural de domínio público ou particular objeto de esbulho possessório ou invasão motivada por conflito indígena de caráter coletivo não será incluído nos estudos a que se refere o art. 2o, § 1o, nos dois anos seguintes à sua desocupação, ou no dobro desse prazo, em caso de reincidência; e deverá ser apurada a responsabilidade civil e administrativa de quem concorra com qualquer ato omissivo ou comissivo que propicie o descumprimento dessas vedações.
Art. 17. A entidade, a organização, a pessoa jurídica, o movimento ou a sociedade de fato que, de qualquer forma, direta ou indiretamente, auxiliar, colaborar,incentivar, incitar, induzir ou participar de invasão de imóveis rurais ou de bens públicos, ou em conflito
indígena de caráter coletivo, não receberá, a qualquer título, recursos públicos, sem prejuízo da apuração da responsabilidade civil e penal dos envolvidos.
Parágrafo único. Se, na hipótese do caput, a transferência ou repasse dos recursos públicos já tiverem sido autorizados, assistirá ao Poder Público o direito de retenção, bem assim o de rescisão do contrato, convênio ou instrumento similar.

Art. 18. Esta lei entra em vigor na data de sua publicação.

Justificação

No bojo das discussões travadas no âmbito da Comissão Temporária Externa do Senado Federal para "ir aos Estados de Roraima, Mato Grosso do Sul, Santa Catarina, Mato Grosso e Rondônia, averiguar a situação fundiária daqueles Estados", diversos pontos
falhos na atual política indigenista brasileira foram detectados.
Um deles é justamente o procedimento vigente para demarcação das terras "tradicionalmente ocupadas pelos índios", que, hoje, possui trâmite eminentemente
administrativo, atento principalmente ao informe antropológico, não envolvendo, com poder de deliberação, instâncias parlamentares ou de unidades administrativas estaduais ou municipais.
Essa perspectiva, embora privilegie ponto de partida natural, cientificamente, qual seja, a percepção antropológica sobre o viver indígena, não exaure, na prática, posturas de forças sociais de interesses igualmente legítimos no processo de formação dos territórios
indígenas, a começar pelos próprios indígenas. Outro ator pouco ouvido é o Estado, o que causa profundo impacto federativo, já que a conseqüência homologatória
envolve a transformação de área estadual em bem da União, por vezes grandes áreas, pertencentes a particulares detentores de títulos dominiais por duas ou três gerações.
Outrossim, a partir do comando inequívoco do art. 91, § 1o, III, da Carta Magna, o Conselho de Defesa Nacional deve, a fim de fundamentar a decisão presidencial, ser ouvido em situações de demarcação de terras indígenas em faixa de fronteira. Afinal, esse órgão não só possui competência constitucional para abalizar decisões com impacto sobre a soberania nacional, como fornece equilíbrio na burocracia estatal para grandes questões, pois é formado pelo Vice- Presidente da República, pelo Presidente da Câmara dos Deputados, pelo Presidente do Senado Federal, pelos Ministros da Justiça, da Defesa, das Relações Exteriores, do Planejamento e pelos Comandantes da Marinha, do Exército e da Aeronáutica.
A presente proposta é fruto do esforço da Comissão no sentido de oferecer ao país uma solução para os conflitos decorrentes da demarcação de terras indígenas, estabelecendo um procedimento administrativo de demarcação de terras indígenas mais justo e razoável, atendendo a todos os atores envolvidos de forma equânime e respeitando os sagrados princípios constitucionais que regem a matéria.

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