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29 de Abr de 2016
Os povos Deni do rio Xeruã e Katukina do rio Biá, no Amazonas, realizaram duas expedições identificando os pontos mais frágeis a invasões, geralmente motivadas pela busca de recursos naturais como pirarucu, quelônios e caça. Após diversas reuniões sobre vigilância territorial, com seus mapas e GPSs, o grupo Deni seguiu para a região da boca do rio Xeruã, enquanto os Katukina navegaram até o rio Ipixuna e o igarapé Taboca Grande. A partir das atividades, apoiadas pelo projeto "Arapaima: redes produtivas", executado pela OPAN com recursos do Fundo Amazônia, além de constatar os locais de invasão, os indígenas já puderam, in loco, abrir um diálogo melhor com os moradores do entorno e fazer acordos sobre o uso dos territórios.
Desde a autodemarcação de sua terra indígena, o povo Deni desenvolve ações regulares para a manutenção a área. Cientes de que a região da boca do rio Xeruã (encontro com o rio Juruá) chama a atenção de invasores por conta dos lagos de pirarucu, eles fizeram um diagnóstico atual para desenhar novas estratégias de vigilância. No trajeto, uma oportunidade para os mais novos conhecerem o local, os Deni foram anotando tudo, marcando a localização e nomeando os lagos. Também observaram as placas que sinalizam os limites da Terra Indígena (TI) Deni e até revitalizaram algumas delas.
As equipes Deni se dividiram em dois grupos para o trabalho. Um deles logo encontrou indícios de invasão ao se deparar com uma canoa, um motor rabeta, um botijão de gás, uma malhadeira (rede de pesca) e um pedaço de pirarucu já tratado. Os materiais, que pertenciam a comunitários da região, foram apreendidos, sendo realizada, posteriormente, uma reunião entre eles e os indígenas. Na conversa, os Deni pontuaram que não era permitido entrar na TI sem autorização e muito menos para fazer pesca ilegal. Houve consenso e, assim, o material foi devolvido. A reunião teve participação dos indigenistas da OPAN.
Apesar das entradas à TI ocorrerem, isso não acontece por má-fé. "São comunitários que usam tradicionalmente aquele espaço e que estão ilhados entre a Reserva de Desenvolvimento Sustentável (RDS) Uacari, a TI Deni e a cidade [Itamarati]. E eles têm poucos lagos de pirarucu", diz Renato Rocha, indigenista da OPAN. Além disso, essas pessoas têm pouco acesso a benefícios como a aposentadoria e o bolsa-família. É preciso criar oportunidades para inseri-los nas atividades econômicas sustentáveis da região, a partir de uma articulação com outros ribeirinhos e com indígenas por meio da comercialização de alimentos como banana, macaxeira, farinha, e das cadeias produtivas de os óleos vegetais e pirarucu, por exemplo.
O apoio à ampliação do diálogo entre indígenas e ribeirinhos é a base orientadora do projeto "Arapaima: redes produtivas". "Com as ações do Arapaima, pretendemos aproximar indígenas e ribeirinhos em prol da conservação da floresta amazônica. Ambos vivem na e da floresta e necessitam dela para viver", explicou Vinicius Benites Alves, coordenador do projeto. Segundo ele, com o trabalho, pretende-se melhorar a relação com os órgãos competentes, visando garantir fiscalizações anuais nesses territórios, novas placas de identificação das áreas protegidas e incentivo para manutenção das linhas demarcatórias.
A partir da expedição à boca do rio Xeruã, os Deni identificaram a necessidade de realizar rondas naquela área e de aumentar o número de vigilantes. Além disso, planejam incluir os lagos nas atividades do manejo de pirarucu. "A gente está pesquisando, procurando lago e tem muito lago lá, muito pirarucu", explica Mahuru Hava Deni, cacique da aldeia Itaúba. "Acho que a gente vai começar trabalho de manejo lá", conta ele. Caso isso ocorra, será mais um facilitador para percorrer e vigiar a área, garantindo a conservação da TI Deni.
Expedição dos Katukina
Na TI Rio Biá, os moradores das aldeias Janela, Sororoca e Bacuri pautaram uma expedição ao rio Ipixuna, pois estavam preocupados com os conflitos que existem com comunitários da região, que também utilizam parte da área dos Katukina. Apesar de guardarem alguns acordos com esses moradores, a incerteza sobre os limites oficiais da TI gera instabilidade e dificuldade de controle sobre o território. Na época da demarcação, uma área tradicional ficou de fora, deixando os próprios indígenas em dúvidas sobre o perímetro do território. Diante disso, para deixar melhor sinalizado o limite oficial, durante o percurso da expedição, de olho no rio e no mapa, eles marcaram as fronteiras, observando onde seria necessário colocar placas de identificação.
Assim como na TI Deni, os Katukina também realizaram conversas com os moradores do entorno para chegar a novos pactos. Eles possuem relação comercial com alguns deles para a compra de produtos como açúcar, café e combustível. O indigenista Edemar Treuherz contou que essas relações são muito complexas e incluem amizade e confiança. Muitas vezes, as pessoas de fora ajudam os Katukina com questões de saúde, por exemplo, tão precária na TI Rio Biá. "Não tem uma verdade absoluta na relação entre os indígenas e as pessoas de fora", pontuou ele. A partir das conversas, os Katukina e os moradores do entorno conseguiram firmar um acordo sobre o uso da área, compreendendo uns aos outros.
Wana An Katukina
A outra expedição dos Katukina, foi ao Taboca Grande, o Wana An, uma região tradicional e bastante utilizada para a coleta de cipó, argila, tucum, caça e pesca. Nesse local, em que não perceberam indícios de invasão, os indígenas foram identificando durante o percurso locais da cultura e da história. Durante a viagem, alguns Katukina apontaram locais de nascimento e de morte dos mais antigos, relatando as epidemias de sarampo que, no passado, dizimaram grande parte da população. Contaram sobre antigas lideranças. O tuxaua da aldeia Gato, Kododon Katukina, lembrou que na época do seu pai, uma viagem ao Taboca Grande era feita a remo e demorava cerca de quatro meses.
"A expedição fluiu bem porque estavam em um grupo bom de pessoas, composto por casais e crianças. Todos foram conversando e, assim, ficou ainda mais forte a antiga relação da OPAN com os Katukina", disse o indigenista Edemar Treuherz. A participação das mulheres foi importante porque elas também construíram conhecimento na expedição, e provavelmente irão ajudar a fortalecer a conservação. "Se os homens quiserem fazer besteira, como pescar pirarucu e tracajá em lugares que não devem, as mulheres não vão deixar", diz Edemar Treuherz.
Agora, após as expedições, os Katukina vão se reunir nos próximos meses para pensar de que forma fazer a vigilância em seu território. "Não é uma viagem de vigilância que vai fazer a coisa ser diferente. Em cima disso, quando voltar, tem que retomar o que ocorreu na viagem, ligar os pontos", explica Edemar. O sucesso da expedição se deveu justamente à incorporação às questões culturais, ambientais e de extrativismo do povo Katukina.
A vigilância no projeto Arapaima
O apoio à vigilância territorial está sendo realizado também nas TIs Acapuri de Cima, Macarrão, São Domingos de Jacapari e Estação e Espírito Santo, que já fizeram as primeiras reuniões sobre o assunto, junto à OPAN e ao Conselho dos Povos Indígenas de Jutaí (Copiju). As atividades irão englobar, ainda, também de forma direta, a Reserva de Desenvolvimento Sustentável (RDS) Cujubim e ao longo do trabalho, outras comunidades extrativistas do entorno.
Vinicius Benites Alves explicou que o trabalho da OPAN junto às comunidades visa atender as necessidades apontadas pelos próprios indígenas que têm dúvidas sobre as formas de abordagem e que encaminhamentos devem ser tomados num momento de invasão. "O nosso objetivo está em deixar claro qual é o papel de quem: indígenas e extrativistas fazem a vigilância - rondas territoriais nas principais áreas de pressão - e os órgãos competentes como Funai, polícia ambiental, Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio) e Instituto de Proteção Ambiental do Amazonas (Ipaam) fazem fiscalização - apreensão e multas", explica.
Com o projeto Arapaima foram entregues aos Deni, aos Katukina e aos extrativistas da RDS Cujubim equipamentos para apoio à vigilância territorial, como canoa com motor rabeta 5,5 HP e 13 HP, combustível, materiais de apoio à pesca. Algumas comunidades também receberam kits de radiofonia para melhorar a comunicação no local.
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