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Brasil terá feijão transgênico em 2014

FSP, Mercado, p. B8
16 de Set de 2011

Brasil terá feijão transgênico em 2014
Semente é resistente a praga que provoca perdas de até 280 mil toneladas por ano; tecnologia pode elevar oferta
Comissão Nacional de Biossegurança aprova variedade, mas organizações dizem que faltaram testes

TATIANA FREITAS
DE SÃO PAULO

A CTNBio (Comissão Técnica Nacional de Biossegurança) aprovou ontem a primeira semente de feijão transgênico para cultivo no país. Ela deve estar disponível para o plantio em 2014.
Desenvolvida pela Embrapa (Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária), a variedade transgênica é a primeira totalmente produzida por uma instituição pública.
O feijão geneticamente modificado é resistente ao vírus do mosaico dourado, um dos principais inimigos dos agricultores. Estima-se que essa praga provoque a perda de 90 mil a 280 mil toneladas de feijão por ano -o país produz 3,5 milhões de toneladas. "Na média, a perda seria suficiente para alimentar 10 milhões de pessoas", diz Francisco Aragão, pesquisador da Embrapa e um dos responsáveis pelo projeto.
A nova tecnologia pode, portanto, resultar em maior oferta de feijão no país e oscilações menos bruscas de preço ao consumidor. O feijão foi um dos vilões da inflação em 2010 e a previsão é que a alta se repita nos próximos meses.
A adoção da semente transgênica pelo agricultor também pode diminuir o número de aplicações de inseticidas, o que resultará em economia de custo e aumento na renda do produtor.
Segundo Aragão, a semente transgênica deve ser vendida por valor próximo ao da convencional, pois não haverá cobrança de royalties.

POLÊMICA
A CTNBio aprovou o feijão transgênico por 15 votos a favor, duas abstenções e cinco pedidos de diligência (necessidade de complementação). Mas o debate sobre o tema deve continuar acalorado.
Com posição contrária à liberação, Darci Frigo, coordenador da ONG Terra de Direitos, pretende levar o caso à Justiça Federal, pois considera que houve irregularidades no processo de aprovação.
"Não foram realizados testes suficientes para garantir a segurança do produto. Esse é um assunto sério, pois envolve a alimentação básica do brasileiro", afirma.
O Consea (Conselho Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional), órgão que assessora a Presidência da República, também se opõe à aprovação da semente.
"Não foi seguido o princípio da precaução, de que é melhor obter estudos mais avançados antes do plantio comercial", diz Renato Maluf, presidente do Consea.
Segundo Aragão, foram realizados testes de 2004 a 2010 em todos os ecossistemas onde o feijão comum é cultivado. "Temos convicção de que não há danos à saúde e também não identificamos diferenças nos fatores nutricionais mais importantes, como ferro e proteínas", diz.

Técnica usa fragmentos de RNA para 'silenciar' genes

CLAUDIO ANGELO
DE BRASÍLIA

O feijão desenvolvido pela Embrapa é a primeira planta transgênica comercial baseada em tecnologia revolucionária: a interferência de RNA, que deu a seus descobridores o Nobel de Medicina em 2006.
A técnica desenvolvida há 13 anos pelos americanos Andrew Fire e Craig Mello usa minúsculos fragmentos de RNA (ácido ribonucleico) para "silenciar" genes.
No caso do feijão, os pesquisadores Francisco Aragão e Josias Faria criaram em laboratório uma sequência de DNA introduzida na planta que é capaz de produzir moléculas de RNA que interferem (daí o nome) no funcionamento de um gene que o vírus do mosaico dourado usa para adoecer o feijoeiro.
As vantagens da RNAi sobre a transgenia convencional são várias. Primeiro, não há a produção, pela planta, de toxina (como nos transgênicos Bt) ou de outra proteína estranha capaz de causar alergia em humanos.
O RNA de interferência fica inativo na planta em forma de DNA, e só começa a "trabalhar" quando o feijão é infectado pelo vírus. Depois, é degradado por enzimas na célula vegetal -não deixa resíduo que possa ser considerado perigoso.
Outra vantagem é o custo: Aragão estima que o desenvolvimento da variedade, iniciado há 11 anos, tenha custado R$ 3,5 milhões. Uma variedade convencional, desenvolvida por multinacionais, custa mais de 40 vezes isso.
Mas a principal vantagem da interferência de RNA talvez seja comercial: ao utilizar a técnica, a Embrapa se livra de usar -e pagar royalties por- genes já patenteados por multinacionais.
A RNAi abre uma avenida de pesquisas em instituições públicas para a produção de transgênicos mais seguros e livres de patentes. A técnica, porém, tem aplicação limitada: ela pode ser usada contra infecções ou em melhoramento nutricional, mas não dá para produzir uma planta com características complexas -como resistência à seca.

FSP, 16/09/2011, Mercado, p. B8

http://www1.folha.uol.com.br/fsp/mercado/me1609201122.htm
http://www1.folha.uol.com.br/fsp/mercado/me1609201123.htm

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