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Brasil tem 11,4 milhões em favelas; 1 em cada 5 está na Grande São Paulo

OESP, Metrópole, p. C1, C3
22 de Dez de 2011

Brasil tem 11,4 milhões em favelas; 1 em cada 5 está na Grande São Paulo
Foram identificados 6.329 assentamentos irregulares em 323 cidades; 88% dos domicílios do tipo estão concentrados nas metrópoles

FELIPE WERNECK, LUCIANA NUNES LEAL

O Brasil tinha 11,42 milhões de pessoas morando em favelas, palafitas ou outros assentamentos irregulares em 2010. O número corresponde a 6% da população do País, revela o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) na publicação Aglomerados Subnormais, baseada em dados do último Censo. Só a Região Metropolitana de São Paulo, com 2,16 milhões de pessoas vivendo em favelas, responde sozinha por 18,9% de toda a população em submoradias.
A comparação com levantamento realizado há 20 anos indica que quase dobrou a proporção de brasileiros que moram nessas áreas, com precariedade de serviços públicos essenciais ou urbanização fora dos padrões. Em 1991, 4,48 milhões de pessoas (3,1% da população) viviam em assentamentos irregulares, número que aumentou para 6,53 milhões (3,9%) no Censo de 2000. O IBGE ressalva que, apesar de o conceito de aglomerado subnormal ter permanecido o mesmo desde 1991, foram adotadas inovações metodológicas e operacionais no Censo 2010 e que, por isso, a comparação dos dados "não é recomendada". O objetivo da mudança foi aprimorar a identificação de favelas - houve uso de imagens de satélite de alta resolução e uma pesquisa específica para melhorar a informação territorial.
"O grande aumento da população de favelas é algo que já vinha sendo observado nas metrópoles", diz o geógrafo e professor da Universidade Federal do Rio de Janeiro, Claudio Egler, que participou da comissão técnica do estudo. Segundo ele, a informação sobre aglomerados pode estar subestimada nos censos anteriores, mas o aumento acima da média nacional "é real".
Fenômeno metropolitano. Ao todo, foram identificados 6.329 assentamentos irregulares em 323 municípios do País. Trata-se de um fenômeno majoritariamente metropolitano - 88,2% dos domicílios em favelas estavam concentrados em regiões com mais de 1 milhão de habitantes. As regiões metropolitanas de São Paulo, Rio e Belém somadas concentravam quase a metade (43,7%) do total de domicílios em aglomerados subnormais do País.
O IBGE aponta ainda grande diferença no padrão de distribuição desse tipo de moradia. Em São Paulo, predominam áreas de pequeno porte e concentradas na periferia (apenas 20 ficam no centro expandido), ao contrário do Rio, onde há um espalhamento maior pelo território. O Censo também aponta maior predominância de favelas em cidades costeiras ou ribeirinhas.
Perfil. A idade média dos moradores das favelas do País era de 27,9 anos em 2010, ante 32,7 anos nas áreas regulares. A população na faixa de 0 a 14 anos correspondia a 28,3% do total nas favelas. Já nas áreas formais, era de 21,5%. Na faixa de 60 anos ou mais, era de 6,1% nos aglomerados e de 11,1% no restante das cidades. A densidade média de moradores é sempre mais alta nos domicílios em favelas. A Região Norte apresentou as maiores médias: nas favelas do Amapá, chegou a 4,5 moradores por domicílio. As favelas também concentram um número maior de pessoas que se declararam pretas ou pardas. O porcentual chegou a 68,4%, ante 46,7% nas áreas urbanas regulares. Ou seja: dois em cada três favelados são negros.
Em Belém, mais da metade da população (53,9%) vivia em assentamentos irregulares. É a maior proporção do País. No Rio, eram 22%. Na capital paulista, 11% - no total, 1,3 milhão de pessoas vivem em 1.020 aglomerados espalhados por São Paulo, a maior parte na periferia e no limite com outras cidades. Campo Grande foi a capital com menor proporção de população em moradias desse tipo - 0,2% dos habitantes. A Região Sudeste concentrava metade (49,8%) dos domicílios ocupados em aglomerados, enquanto a Região Nordeste tinha 28,7% do total, a Norte 14,4%, a Sul 5,3% e a Centro Oeste 1,8%.

Metade de Belém mora em condições precárias hoje
Censo mostra que um em cada três domicílios não tem estrutura sanitária adequada e 1 em cada 4 só obtém luz por meio de 'gatos'

CARLOS MENDES

Há algo em comum entre a lavadeira Jonilda Ribeiro Silva, de 34 anos, o vendedor de picolé Ronaldo Pereira de Souza, de 27, e o ajudante de pedreiro Iranildo Batista Sena, de 31: os três moram em bairros diferentes, na periferia de Belém, sobrevivem com R$ 400 por mês, ocupam pequenos barracos de madeira sem água, e a energia elétrica só chega em suas casas graças a "gatos". Estão entre 1,1 milhão de pessoas, ou 53,9% da população da capital, que vivem em aglomerados humanos sem nenhum tipo de saneamento, segundo o IBGE. Trata-se do pior quadro do País.
"Lavo e passo roupa para algumas famílias aqui do bairro, mas tem dia que eu não tenho nem o que comer com meus filhos", diz Silva, mãe de cinco crianças. Já Sena está doente, com diagnóstico de apendicite e não consegue guia de internação. "Parece que ser pobre neste País é ser uma praga, um criminoso. Lá no posto eles nem olham na cara da gente e dizem logo que não tem vaga em nenhum hospital para eu fazer a cirurgia", revolta-se.
O ajudante de pedreiro está há dois meses sem trabalhar na obra de um shopping no bairro do Benguí. Mesmo com atestado médico, o patrão avisou que se Sena não aparecer na obra para trabalhar será demitido."
Para Souza, a vida está um pouco melhor, porque a venda de picolé rende por mês R$ 400. Com o dinheiro, ele sustenta a mãe, de 72 anos, e a avó, de 91. Mas o sonho dele é se mudar. "Na Pratinha, em muitas casas, não há água encanada. É preciso caminhar 500 metros para encher o balde em um poço artesiano."
Estrutura. Os dados do Censo 2010 divulgados ontem mostram ainda que uma em cada três moradias de favelas (32,7%) não tem condições adequadas de esgotamento sanitário, o serviço mais precário dos aglomerados. Embora a oferta de energia elétrica seja praticamente universalizada nas favelas, chegando a 99,7% dos domicílios, apenas 72,5% obtêm luz de forma adequada. Um em cada quatro (27,5%) moradias recorre aos chamados "gatos" ou outros caminhos informais de obtenção de energia.

Rocinha, a maior do Rio e do País
IBGE registra 763 favelas na capital fluminense

O Rio é a cidade que reúne o maior número de favelados do País: 1,39 milhão de pessoas em 763 aglomerados subnormais, segundo os critérios do IBGE. Um em cada cinco cariocas (22%) vive em favela. A taxa é o dobro da de São Paulo, que tem 1,28 milhão de habitantes na mesma condição (11% de sua população).
A maior favela do Brasil, a Rocinha, fica no Rio. A terceira colocada no ranking nacional também é carioca: Rio das Pedras, na zona oeste. Se fosse somada à comunidade adjacente, ficaria à frente da favela Sol Nascente, no Distrito Federal, a segunda no ranking oficial. Rocinha e Rio das Pedras foram grandes destinos de imigrantes nordestinos.
Apesar de não agrupadas pelo IBGE, as favelas da região da Maré, na zona norte, formam um complexo que reunia 64,2 mil moradores em 2010. O Complexo do Alemão, também na zona norte, tinha 58,4 mil habitantes, se somadas as populações de favelas contíguas, critério não usado pelo IBGE. Conjuntos habitacionais favelizados não entraram na conta dos chamados aglomerados subnormais. Entre eles, a Vila do João, na Maré, e grande parte da Cidade de Deus.
"O Rio é paradigmático. É uma cidade em que a segregação está em cada bairro", diz o geógrafo e professor da UFRJ Claudio Egler, que participou da comissão técnica do estudo. Egler cita como fatores a falta de uma política habitacional decente e o "grande problema" do sistema de transportes públicos no Rio.
Avanço. Ao contrário de São Paulo, onde predominam áreas de pequeno porte e concentradas na periferia, no Rio há um espalhamento maior pelo território. As ocupações mais antigas encontram-se na área central e nos bairros das zonas sul e norte mais próximos do centro, onde se encontra a maior oferta de trabalho. Na última década, o ocupação irregular cresceu em direção à zona oeste.

Campo Grande: o menor índice entre capitais

JOÃO NAVES DE OLIVEIRA , ESPECIAL PARA O ESTADO , CAMPO GRANDE

A erradicação de favelas em Campo Grande, a capital de Mato Grosso do Sul, está praticamente concluída, segundo o secretário estadual de Habitação e Cidades, Carlos Eduardo Xavier Marun. Existem apenas dois núcleos do gênero, onde vivem quase 1.700 pessoas. "Mas no primeiro semestre estarão habitando as 430 casas de alvenaria que estão em construção."
Em 1997, segundo o governo, Campo Grande tinha 172 favelas, montadas em margens dos córregos e áreas de risco, ocupadas por mais de 10 mil famílias. Mas não foi fácil alterar o quadro - que é o melhor atualmente entre as regiões metropolitanas do País. "Empregamos vigilância cerrada, determinação e investimentos. É por isso que a fila da casa própria para os favelados vem se mantendo decrescente desde 1997", afirma o secretário.
São casos como o do carioca Odin David Valu, de 37 anos, nascido no Morro do Flamengo (RJ), que aguarda sua casa própria. "Éramos meu pai, minha mãe e 9 irmãos. Chegamos há 30 anos e moramos em fazendas, em cortiços em favelas. Agora, só eu ainda aguardo casa."

OESP, 22/12/2011, Metrópole, p. C1, C3

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