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Brasil se torna "fóssil do dia" em Nairóbi

FSP, Ciência, p. A26
11 de Nov de 2006

Brasil se torna "fóssil do dia" em Nairóbi
País é criticado por ONGs em encontro internacional por atrapalhar negociação de substituto do Protocolo de Kyoto
"Premiação" ocorreu ontem, dia em que presidente Lula apresentou a proposta brasileira para as florestas que será levada à reunião

DA REDAÇÃO

No mesmo dia em que o presidente Luiz Inácio Lula da Silva apresentou oficialmente a proposta brasileira que será levada na semana que vem à reunião internacional sobre mudança climática de Nairóbi, ambientalistas presentes ao encontro no Quênia criticaram a posição do país sobre a extensão do Protocolo de Kyoto.
O Brasil recebeu da rede de ONGs CAN (Climate Action Network) o troféu "fóssil do dia", uma honraria dúbia concedida aos países que mais tentam atravancar as negociações sobre o acordo internacional que substituirá o protocolo, que expira em 2012. O "prêmio" foi concedido ontem em Nairóbi, durante a COP-12 (12ª Conferência das Partes) da Convenção do Clima da ONU.
Segundo a CAN, o país levou o abacaxi devido a sua "argumentação dura e espúria" contra o uso de um dos artigos do texto do Protocolo de Kyoto para "fortalecer e ampliar os esforços globais de proteção do clima no período pós-2012".
O Brasil é um dos líderes do bloco dos países em desenvolvimento, que se recusam a assumir metas de redução de gases que causam o efeito estufa, como o gás carbônico (CO2).
O mundo subdesenvolvido não é obrigado pelo acordo de Kyoto a cortar suas emissões de poluentes, já que o aquecimento atual do planeta foi causado pela queima de petróleo e carvão que levou os países hoje industrializados ao desenvolvimento. Mas os gigantes do Terceiro Mundo acabaram virando parte do problema -a China cresce 10% ao ano e em três anos se tornará o maior emissor de CO2- e há pressões para que eles assumam metas obrigatórias no pós-Kyoto.
Segundo a delegação brasileira na COP-12, a escolha do Brasil como fóssil do dia resultou de um "mal-entendido" entre a posição brasileira e CAN. Ao defenderem que a revisão de Kyoto não poderia ser uma "porta que se abrisse para os países que não gostam do protocolo", o Brasil teria sido "interpretado erroneamente", segundo um delegado.

Lula
Em reunião ontem do Fórum Brasileiro de Mudanças Climáticas, no Palácio do Planalto, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva afirmou que o país adquiriu uma "maturidade política" no tema ambiental suficiente para cobrar aquelas nações que, segundo ele, estavam acostumadas só a cobrar o Brasil. Segundo Lula, o país "pode hoje entrar de cabeça erguida em qualquer debate".
Durante a reunião foi apresentada a proposta brasileira para a COP-12. A base da proposta é a criação de um "mecanismo de incentivos para países em desenvolvimento que reduzirem suas emissões de gases de efeito estufa por desmatamento". O mecanismo deve ter o formato de um fundo voluntário, com contribuição de países industrializados para compensar os detentores de florestas tropicais que reduzirem suas emissões.

Emissão de gás do efeito estufa quadruplicou

STEVE CONNOR
DO "INDEPENDENT"

O crescimento das emissões globais de dióxido de carbono proveniente da queima dos combustíveis fósseis foi quatro vezes maior entre 2000 e 2005, se comparado com os dez anos anteriores (década de 1990). Essa avaliação foi apresentada ontem pelos cientistas do Projeto Carbono Global.
Os dados das emissões de dióxido de carbono mostram que a taxa de crescimento global foi de 3,2% nos cinco anos finais analisados, e de apenas 0,8% em todo o período entre 1990 e 1999, apesar de o Protocolo de Kyoto ter entrado em vigor durante o segundo intervalo.
Muito desse aumento, provavelmente, está relacionado com a expansão da economia chinesa nos últimos 15 anos, assentada fortemente na queima de carvão vegetal e em outras fontes de energia de origem fóssil.
Mike Raupach, chefe do Projeto Carbono Global, alertou ontem que as emissões dos principais gases que contribuem para o aumento do efeito estufa estão totalmente fora de controle.
"É um sinal muito atormentador. Ele indica que os recentes esforços para reduzir as emissões, virtualmente, não têm nenhum impacto no crescimento das emissões e que atitudes mais efetivas são urgentes e necessárias", disse Raupach.
Os níveis correntes de dióxido de carbono na atmosfera são de 380 ppm (partes por milhão), aproximadamente 100 ppm acima do que havia antes da Revolução Industrial, 200 anos atrás.
"A velocidade de crescimento das emissões de carbono nos últimos cinco anos sugere que daqui a pouco será impossível escapar de um cenário trágico" disse Josep Canadell, diretor executivo do Projeto Carbono Global.
"No atual curso das coisas, teremos dificuldades para estabilizar as emissões em 450 ppm. Mesmo em 550 ppm será desafiador".
A última vez que o planeta experimentou níveis tão elevados foi há 30 milhões de anos, aproximadamente, quando o nível do mar estava cem metros acima do atual.

FSP, 11/11/2006, Ciência, p. A26

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