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Brasil desconhece suas áreas de risco

FSP, Cotidiano 2, p. 3
23 de Jan de 2011

Brasil desconhece suas áreas de risco
Governo federal não tem mapeamento de locais vulneráveis a chuvas no país e ignora tamanho da Defesa Civil
Maioria dos Estados também não tem mapas de seus locais críticos; estudo nacional deve ficar pronto neste ano

De São Paulo
De Belo Horizonte
De Recife
De Salvador
De Curitiba

"Ainda bem que o Brasil não tem terremotos, furacões e vulcões." Com variações, a frase ilustrou por um bom tempo o pensamento brasileiro sobre catástrofes naturais e inibiu a formação de uma cultura de defesa civil.
Países que sempre conviveram com suas tragédias naturais, como Japão e Chile, estão anos à frente em organização tanto para prevenção quanto para resposta.
O Brasil, porém, tem deslizamentos, enchentes, vendavais, tempestades, incêndios florestais e, recentemente, até ciclones extratropicais. Só no ano passado, 893 desastres naturais foram notificados à Defesa Civil nacional -em 2009, foram 1.408.
Enquanto isso, o sistema de defesa civil não sabe o tamanho do problema nem a dimensão dos recursos de que dispõe para enfrentá-lo.
Hoje, o governo brasileiro não sabe quantas áreas de risco há no país, quantas pessoas nelas vivem e não tem ideia do aparato de defesa civil de Estados e municípios.
Na semana passada, o ministro Aloizio Mercadante (Ciência e Tecnologia) arriscou um número de 5 milhões de pessoas em áreas de risco, mas depois recuou dizendo ser uma estimativa antiga.
O Ministério das Cidades não tem esse dado, mas sabe que o Censo 2000 apontou 12,4 milhões morando em "assentamentos precários".
O Ministério da Integração Nacional, que abriga a Defesa Civil, também não sabe.Contratou o Centro Universitário de Estudos e Pesquisas sobre Desastres, da Universidade Federal de SC, para fazer um levantamento.
Segundo Irapuan Paulino Leite, diretor de articulação institucional do centro, o trabalho vai resultar em um inédito atlas de desastres naturais e em um mapa de risco.
Das 18 Defesas Civis estaduais ouvidas, 14 disseram não ter um mapeamento. Só Ceará, Goiás, Distrito Federal e Amapá afirmam possuí-lo.
Estados como RJ, SP, PE e SC têm mapeamento só em grandes cidades. A maioria dos órgãos estaduais diz que a responsabilidade pelos mapas cabe aos municípios.
Para Ivan Ramos, coordenador da Defesa Civil de Pernambuco -que tem 52 homens-, o órgão não tem de atuar diretamente em campo. "O que cabe à Defesa Civil em uma situação posterior ao desastre é reunir os meios."

ESTRUTURA
Em 2010, a 1ª Conferência Nacional de Defesa Civil apontou as chagas do sistema: falta de articulação, de estrutura, de treinamento, de dinheiro, de planejamento e de regulamentação: agentes de defesa civil, por exemplo, nem existem como profissão.
Relatório do TCU (Tribunal de Contas da União) de 2009 dizia que "um quadro adequado de pessoal técnico, permanente e especializado, tem se apresentado como dificuldade intransponível".
A União desconhece o número de defesas civis municipais. Estimativas recentes indicam que 3/4 dos municípios não têm defesa civil.
(JOSÉ BENEDITO DA SILVA, RAPHAEL VELEDA, FABIO GUIBU, MATHEUS MAGENTA E JEAN-PHILIP STRUCK)

1,3% das cidades elaboram planos para reduzir risco

Dimmi Amora
De Brasília

Das 5.561 cidades do país, 74 (1,3%) entregaram ou finalizam os Planos de Redução de Risco, mapeamentos das áreas com maior possibilidade de incidentes devido a catástrofes naturais.
Dos 40 maiores municípios, 14 (35%) fizeram seus planos. Desde 2004, o Ministério das Cidades disponibiliza verbas para isso -já foram usados R$ 5 milhões.
Das 74 cidades, 5 também utilizaram recursos de outro programa -para prevenção de catástrofes- entre os anos de 2007 e 2010.
Entre esses municípios, 59 receberam no mesmo período verba do Programa de Urbanização e Regularização de Assentamentos Precários do ministério. Quinze ficaram de fora, entre elas as mais afetadas pelas chuvas no Rio: Petrópolis, Teresópolis e Nova Friburgo.
De acordo com o ministério, os municípios com planos têm prioridade para receber verbas do PAC 2 (Programa de Aceleração do Crescimento) -das 74 cidades, 39 foram selecionadas.
As três cidades do Rio foram contempladas com R$ 22 milhões, sendo R$ 20 milhões para obras e o restante para revisar e ampliar os planos e elaborar projetos.
As poucas prefeituras que fizeram seus planos não executaram todas as obras necessárias. Nas três do Rio, além de parciais, os mapeamentos não tinham servido para realizar nenhuma das intervenções.
Segundo os planos, deveriam ser feitas as remoções de 2.796 famílias, mas nenhuma delas foi removida.

FSP, 23/01/2011, Cotidiano 2, p. 3

http://www1.folha.uol.com.br/fsp/cotidian/ff2301201118.htm
http://www1.folha.uol.com.br/fsp/cotidian/ff2301201119.htm

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