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Bolsonaro diz que divulgação de dados ambientais do Inpe 'dificulta' negociações comerciais

G1 - http://g1.globo.com/
Autor: Por Guilherme Mazui e Fabiano Costa, G1 - Brasília
22 de Jul de 2019

Bolsonaro diz que divulgação de dados ambientais do Inpe 'dificulta' negociações comerciais

Em nova crítica, presidente afirmou que autonomia do Inpe para divulgar dados sobre desmatamento pode prejudicar 'a questão do Mercosul'. Bloco fechou acordo com a UE.

Após questionar dados de desmatamento na Amazônia, o presidente Jair Bolsonaro afirmou nesta segunda-feira (22) que a divulgação de informações ambientais diretamente pelo Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe) "dificulta" negociações comerciais conduzidas pelo governo brasileiro com outros países e citou o acordo fechado recentemente entre o Mercosul e a União Europeia.

Bolsonaro declarou que, na medida em que, atualmente, o mundo todo "leva em conta" a questão ambiental, não pode ocorrer divulgação de dados sobre desmatamento sem que ele tenha conhecimento previamente para não ser surpreendido e correr o risco de "pego de calças curtas".

"A questão ambiental, o mundo todo leva em conta. Outros países que estamos negociando a questão do Mercosul, ou até acordos bilaterais, nos dificulta com a divulgação desses dados. Temos que ter responsabilidade", disse o presidente a repórteres nesta segunda-feira após participar de um almoço com oficiais da Aeronáutica, em Brasília.

Mais tarde, o porta-voz da Presidência, Otávio Rêgo Barros, afirmou que Bolsonaro não tem a "intenção" de impedir a divulgação de dados do Inpe.

"Absolutamente, o Planalto sempre trabalha pelo princípio da transparência. A intenção do senhor presidente é identificar desde pronto no relatório quais são as demandas e quais são as ações prospectivas para corrigir, se for o caso, e para potencializar eventuais dados que ali ocorram no relatório", afirmou.

Bolsonaro questionou os dados divulgados pelo Inpe sobre o aumento do desmatamento na Amazônia na última sexta-feira (19). Na ocasião, ele afirmou a jornalistas estrangeiros que, se existisse toda a devastação que o mundo acusa o Brasil de estar fazendo e de ter feito no passado, "a Amazônia já teria se extinguido".

Na mesma entrevista, o presidente levantou suspeita de que o diretor do Inpe Ricardo Magnus Osório Galvão estaria "a serviço de alguma ONG".

O dirigente do instituto respondeu ao presidente no dia seguinte negando as acusações e reafirmando a veracidade dos dados sobre desmatamento divulgados pelo Inpe.

Também no sábado (20), o Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais afirmou, por meio de nota, que sua política de transparência permite o acesso completo aos dados e acrescentou que a metodologia do instituto é reconhecida internacionalmente.

A declaração de Bolsonaro colocando em dúvida a credibilidade dos dados sobre desmatamento divulgados pelo Inpe motivou uma manifestação pública de apoio ao instituto por parte do Conselho da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC).

A entidade divulgou neste domingo (21) um manifesto em apoio ao instituto no qual destacou que, "em ciência, os dados podem ser questionados, porém, sempre com argumentos científicos sólidos, e não por motivações de caráter ideológico, político ou de qualquer outra natureza".

"Críticas sem fundamento a uma instituição científica, que atua há cerca de 60 anos e com amplo reconhecimento no país e no exterior, são ofensivas, inaceitáveis e lesivas ao conhecimento científico", diz trecho do manifesto divulgado pelo conselho que reúne cientistas brasileiros.

De acordo com números divulgados pelo Inpe no início deste mês, o desmatamento na Amazônia Legal brasileira atingiu 920,4 km² em junho, um aumento de 88% em comparação com o mesmo período do ano passado.

Ainda de acordo com o instituto, as áreas da Amazônia que deveriam ter "desmatamento zero" perderam território equivalente a 6 cidades de São Paulo em três décadas.

O estudo também mostrou que, fora das áreas protegidas, a Amazônia perdeu 39,8 milhões de hectares em 30 anos, o que representa 19% sobre toda a floresta natural não demarcada que existia em 1985, uma perda equivalente a 262 vezes a área do município de São Paulo. Nas áreas protegidas, a perda acumulada foi de 0,5%.

'Hierarquia e disciplina'
Ao voltar ao assunto no final de semana, Bolsonaro disse no domingo que, na avaliação dele, antes de divulgar dados sobre desmatamento no Brasil, o diretor do Inpe deveria, no mínimo, procurar o ministro da Ciência e Tecnologia, Marcos Pontes, para informar antecipadamente o conteúdo que seria divulgado. O Inpe está subordinado ao Ministério da Ciência e Tecnologia.

"No mínimo, se o dado for alarmante, ele [Ricardo Magnus Osório Galvão, diretor do Inpe] deveria, em tom de responsabilidade, respeito e patriotismo procurar o chefe imediato, no caso o ministro, e dizer: 'Olha ministro, temos uns dados aqui, vamos divulgar, devemos divulgar, o senhor se prepare. Assim que deve ser feito e não de forma rasa como ele faz, que coloca o Brasil em situação complicada. [...] Um dado desse aí, a maneira de divulgar, prejudica a gente", opinou o presidente.

Nesta segunda-feira, Jair Bolsonaro afirmou que está acostumado com "hierarquia e disciplina" e que, na visão dele, "não pode, na ponta da linha, alguém simplesmente resolver divulgar esses dados [de desmatamento]". Para ele, "pode haver algum equívoco" na divulgação das informações ambientais sem um crivo prévio do governo, sob o risco de "um enorme estrago para o Brasil".

"Você pode divulgar os dados, mas tem que passar pelas autoridades para não ser surpreendido, até por mim. Eu não posso ser surpreendido com uma informação tão importante como essa daí. Eu não posso ser pego de calças curtas", alegou Bolsonaro.
O ministro da Ciência e Tecnologia divulgou uma nota nesta segunda-feira informando que está solicitando ao Inpe dados consolidados sobre o desmatamento da Amazônia nos últimos 24 meses. Marcos Pontes comunicou ainda que o diretor do instituto foi convidado para "esclarecimentos e orientações".

Procurado pelo G1, o Inpe informou que a reunião ainda não foi agendada pelo ministério e que voltará a se manifestar após este encontro. O ministro reafirmou o conteúdo da nota e disse que não tem mais informações disponíveis.

https://g1.globo.com/natureza/noticia/2019/07/22/bolsonaro-diz-que-divu…

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