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Bispo exige que governo cumpra promessas

FSP, Brasil, p.A16
08 de Out de 2005

Um dia após encerrar greve de fome, frei Luiz diz não ter motivos para se sentir enganado por ministro
Bispo exige que governo cumpra promessas
Fábio Guibu
O bispo de Barra (BA), dom Luiz Flávio Cappio, 59, disse ontem, em Cabrobó (a 600 km de Recife), que não se sente enganado pelo governo e que vai cobrar do presidente Luiz Inácio Lula da Silva o cumprimento do acordo que encerrou, após dez dias, sua greve de fome contra a transposição do rio São Francisco.
"Ele [Lula] deu ao ministro [Jaques Wagner, de Relações Institucionais] o poder de decidir por ele. Então, foi o presidente que sancionou aquilo que desejávamos", disse Cappio. "Foi uma guerra de foice chegarmos até onde chegamos. Fomos o mais fiéis possível ao que desejávamos."
O bispo disse não ter motivos para se sentir enganado pelo governo "porque nada ainda aconteceu". Cappio entende que o acordo garantiu a suspensão do início das obras até que haja consenso sobre o projeto. Já o ministro afirmou que o adiamento ou a suspensão não foram discutidos.
A pressa do governo em negociar o fim do protesto, afirmou Cappio, "não ocorreu porque estavam com dó". "Ele [o governo] não estava preocupado com a minha fome, estava preocupado com a repercussão nacional, internacional, com a pressão que estava acontecendo."
"O governo Lula não iria assumir o ônus de ter que levar para o resto da história a pecha, a responsabilidade pela morte do bispo", disse Cappio, reafirmando a disposição de retomar o jejum se o acordo fechado com o governo for descumprido.
Sanções
O bispo declarou ainda que, mesmo sabendo dos "riscos de sanções eclesiais", estava disposto a seguir "até o fim". "Quem está disposto a morrer não tem medo de sanções. Eu estava livre, sem receio de nada."
Representante do Vaticano no país, o núncio apostólico do Brasil, dom Lorenzo Baldisseri, viajou a Cabrobó e disse que a igreja não aprova a atitude do bispo. Segundo ele, o jejum até a morte é contra a moral cristã.
Para o frei Luiz, o fim da greve de fome -iniciada às 12h de 26 de setembro- sinaliza "a hora das mobilizações populares". "Agora, cada um deve fazer a sua parte. O pessoal não vai desistir. Eu tenho esperança. Uma iniciativa que contou com a bênção de Deus não vai acabar em pizza."
Canja de galinha
O bispo, que passou por exames médicos e recebeu dois frascos de soro na quinta-feira, bebeu ontem água de coco e suco de melancia e tomou uma canja com fiapos de carne de galinha, legumes e arroz amassados. Hospedado por um casal ligado à Igreja Católica em Cabrobó, ele não reclamou de dores nem mal-estar.
Parentes e amigos visitaram ontem. Em Cabrobó, as romarias cessaram. A pequena capela que serviu de abrigo ao bispo durante o jejum, na zona rural da cidade, ficou vazia ontem.
Os quatro lavradores do MPA (Movimento dos Pequenos Agricultores) que haviam aderido à greve de fome na terça-feira, também encerraram o protesto.
Cappio disse pretender descansar nos próximos dias em São Paulo, mas declarou também ter interesse em participar de outras manifestações a favor da revitalização do rio São Francisco.
Pelo menos dois atos estão programados para este fim de semana. Um deles acontecerá hoje à tarde, em São Paulo. O outro está previsto para amanhã, em Juazeiro, cidade baiana localizada às margens do rio.

Família de frade tentou impedir greve de fome
O bispo de Barra (BA), dom Luiz Flávio Cappio, 59, avisou sua família que faria greve de fome contra a transposição das águas do rio São Francisco dois meses antes de iniciar o jejum.
Segundo um sobrinho de Cappio em Guaratinguetá (176 km de São Paulo), o advogado Luís Flávio Godoy Cappio, no início de agosto, o bispo esteve na cidade -onde nasceu- e se reuniu com os três irmãos para informar a eles sua decisão de realizar o protesto.
"Meu tio exigiu que eles não tornassem pública a decisão. Obrigou meu pai e minhas duas tias a jurar, com as mãos sobre a Bíblia, que não comentariam o assunto com ninguém", disse o advogado.
Segundo ele, os irmãos chegaram a implorar para que Cappio desistisse da idéia. "Mas não adiantou. No domingo, dia 25 de setembro, meu tio ligou para o meu pai e avisou que começaria a greve."
O advogado disse que seu pai, João Franco Cappio, embarcou no dia seguinte em direção a Cabrobó (PE), onde o religioso realizou a greve de fome. As duas irmãs do bispo, Rosa Maria e Rita, também seguiram direto para a cidade, onde acompanhariam o sacrifício do irmão caçula durante dez dias. (FÁBIO AMATO)

FSP, 08/10/2005, p. A16

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