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A biomassa na politica energetica brasileira

GM, Opinião, p. A3
Autor: FEROLLA, Sérgio Xavier; HAGE, José Alexandre Altahyde
13 de Mai de 2005

A biomassa na política energética brasileira

Sergio Xavier Ferolla e José Alexandre A. Hage

Mesmo com reservas na faixa de 11 bilhões de barris de óleo, outros insumos terão de ser usados. Os esforços científicos do Brasil para o desenvolvimento de combustíveis alternativos ao petróleo, como o óleo diesel, são importantes para o desenvolvimento nacional. Mas por que é relevante o emprego de pesquisas em biomassa em substituição a alguns hidrocarbonetos? A resposta é que a pesquisa em biomassa pode possibilitar ao Brasil condições político-econômicas para resistir aos tradicionais conflitos nos assuntos de petróleo. Isso porque devem se considerar três características inerentes aos hidrocarbonetos: 1) o fato de que eles são insumos geograficamente concentrados; 2) são finitos em sua exploração; e 3) trata-se de produção altamente controlada por forte oligopólio empresarial.
Embora o governo brasileiro se empenhe nas descobertas de novas jazidas de petróleo, é necessário dizer que tal esforço de autonomia terá resultado limitado. Mesmo que o Brasil tenha reservas prováveis na faixa de 11 bilhões de barris de petróleo, será urgente o emprego de outros insumos, como o álcool, para que se integrem à matriz energética. O Estado não poderá se furtar a contínuas pesquisas no campo da biomassa, ainda que tal ação possa contrariar opiniões de grupos interessados na globalização da energia.
Porque não se sabe se as reservas brasileiras terão condições de atender as necessidades a longo prazo, considerando o crescimento da economia nacional. As jazidas brasileiras terão condições de abastecer o mercado interno em prazo máximo de quatorze anos, o que possibilitará ao País ser auto-suficiente em petróleo por tempo relativamente curto. Depois, o Brasil voltará a ser importador do ouro negro, com tendência a comprá-lo ainda bem mais em virtude da crescente necessidade.
Quando o Brasil voltar a ser importador de petróleo, a situação da política internacional poderá ser muito mais dramática do que a atual; e esse assunto toca o campo energético, cujo papel na atividade política dos países é bastante complexo. Grandes potências ou não, todos os Estados guardam interesses na conformação mundial da energia. Atualmente, nada mais explosivo do que a situação que toca os interesses das grandes potências para manter sua segurança energética.
Pelo menos isso vale para os Estados Unidos, cuja economia depende dos carburantes importados: 25% de todo o consumo mundial de petróleo encontra-se nos EUA; por outro lado, o país detém somente 2,8% das reservas mundiais. E o problema se avoluma porque, lá, 60% da energia primária vem do petróleo.
É o que se pode averiguar no Oriente Médio, zona de grande conflito e instabilidade política em que as grandes potências vislumbram seus interesses na manutenção da produção petrolífera e a Casa Branca concentra grandes esforços militares para manter o transporte de petroleiros. Se a situação energética é delicada ao Hemisfério Norte, que dirá então ao Brasil, país de limitados fatores de poder e projeção internacional? É nesse caso, de grande importância, que se dá o retorno do País à pesquisa de combustíveis da biomassa, considerando os conflitos existentes quando o assunto é petróleo importado.
Assunto desprezado nos últimos quinze anos em virtude da denominada reforma institucional, a pesquisa sobre biomassa não esteve dentre as maiores preocupações da década de 1990. Dava-se a entender que pesquisar novos insumos era um luxo do qual o Brasil não necessitava em face da volumosa oferta de petróleo nas grandes praças comerciais. Grande quantidade a baixo preço denotava a idéia de que a biomassa era um desperdício do erário e uma desconsideração aos recursos do cidadão, que queria algo barato e eficiente.
Unindo-se à opinião de que o Brasil não tinha condições de promover investimentos em biomassa, em uma realidade de petróleo farto e barato, surgiram também grupos e interesses, nacionais ou não, que referendaram o abandono do País à biomassa, considerado assunto menor, que deveria ser relegado em razão de uma nova ordem global benéfica a todos, desde que o Brasil compreendesse as regras da economia internacional. O retorno à pesquisa do álcool e a outros óleos marca igualmente a preocupação de atribuir ao Brasil papel de relevância no sistema internacional, mais expressivo, porque a denominada nova ordem não fora proveitosa a grande parte de países pobres.
É evidente que ninguém é inocente à altura de imaginar que a biomassa legará ao Brasil posição de destaque suficiente para mudar a forma com a qual se moldou a vida internacional. Sabe-se muito bem que esse ambiente é tradicionalmente moldado pelas grandes potências industrializadas. Essa é uma tradição do sistema internacional há muito tempo, pois há vários itens que agregam aos econômicos e sociais das grandes potências, como os militares. E, como foi mencionado, o Brasil não tem condições de mudar tal panorama.
Mas não deixa de ser um grande projeto de desenvolvimento que muito poderá ajudar no desenvolvimento nacional do Brasil, procurando diversificar o uso de combustíveis e promovendo pesquisa em área que sempre apresentou forte teor de prestígio e poder. E o fato de o petróleo ser insumo geograficamente concentrado e finito já seria mais que suficiente para que um país com as dimensões territoriais, ambientais e econômicas do Brasil envide todos os esforços possíveis na elaboração de novos combustíveis da biomassa.
Sergio Xavier Ferolla Brigadeiro-do-ar e engenheiro aeronáutico.
José Alexandre A. Hage - Professor universitário. Pesquisadores do Centro de Estudos Estratégicos Sul-Americano.

GM, 13-15/05/2005, Opinião, p. A3

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