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Bebê indígena morreu por falta de comida, dizem pais

FSP, Brasil, p. A8
28 de Fev de 2007

Bebê indígena morreu por falta de comida, dizem pais
Funasa afirma que deu cesta alimentar à família

Hudson Corrêa
Da agência Folha, em Dourados (MS)

A índia guarani Salete Benites, 20, mãe do bebê Cleison, de dez meses, disse ontem que a criança morreu no domingo por falta de comida na aldeia Bororó, em Dourados (210 km de Campo Grande). Ela afirma que também falta água em sua casa. "Eu não tinha comida para dar para ele", afirmou Salete.
A Folha visitou ontem a aldeia e constatou, porém, que na casa de Salete ainda havia meio pacote de leite em pó, 5 kg de farinha de trigo, ao menos 1 kg de arroz, um saco de açúcar, 3 kg de feijão e uma lata de óleo. Ela disse que, desses alimentos, só consegue comer o arroz, mas não soube explicar os motivos.
A casa é um barraco de terra batida, no matagal, coberto com sapé e onde mal cabe a cama, único móvel. O fogão à lenha fica do lado de fora.
Responsável pela assistência nas aldeias, a Funasa (Fundação Nacional de Saúde) diz que Salete e seu marido, o caiuá Brasil Lopes, 19, receberam no dia 9 uma cesta com 44 kg de alimentos. O casal tem outro filho, Cleimar, 4. No atestado de óbito de Cleison consta "desnutrição severa" como causa da morte. Além de Cleison, a Funasa confirma a morte relacionada a desnutrição neste mês de Nandinho Fernandes, 2.
O médico Zelick Trajber, da Funasa, voltou a afirmar ontem que uma doença, como pneumonia ou diarréia, pode ter matado Cleison. Durante consulta da criança no dia 14, foi constatada "desnutrição moderada", mas a mãe, segundo Trajber, não voltou ao posto. Salete confirma que recebeu a cesta de alimentos no dia 9, mas diz que já não tinha comida no dia 14, quando levou Cleison ao posto de saúde. Ela, porém, entra em contradição. Primeiro disse que recebeu muita água, algo que não alimenta. Em seguida, confirma que o médico do posto deu um saco de leite em pó, que ainda está em sua casa.
O líder da aldeia Bororó, Luciano Arévolo, disse anteontem que pais indígenas trocam cestas de alimentos por bebidas alcoólicas. Ele citou Salete como exemplo. "Eu bebo, sim, mas não de cair. Não fiz isso." "Eu tive o bebê com dois quilos e dez gramas, ele sempre foi desnutrido", disse Salete.

Morte de criança é "inaceitável", afirma ministro

Da sucursal de Brasília

O ministro Patrus Ananias (Desenvolvimento Social) chamou ontem de "inaceitável" o fato de mais uma criança indígena ter morrido por desnutrição em Mato Grosso do Sul. A vítima, a segunda deste ano, foi o bebê caiuá Cleison Benites Lopes, de dez meses, da aldeia Bororó, em Dourados.
Sobre ações a curto prazo, Patrus disse tratar-se de um "processo difícil" por conta da integração de ações de órgãos federais e estaduais.
Para ele, o problema indígena vem desde o descobrimento do país.
"São 505 anos em que o Brasil cometeu desacertos muito graves com a questão indígena. Temos uma dívida social no país que inclui a questão indígena, dos negros e dos pobres. Se der uma olhada na história do Brasil verá que nós começamos com a capitanias hereditárias", disse.

FSP, 28/02/2007, Brasil, p. A8

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