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Autorizados estudos ambientais de Belo Monte

O Liberal-Belém-PA
Autor: Sônia Zaghetto
17 de Abr de 2002

Reviravolta no caso da paralisação dos estudos ambientais do complexo
hidrelétrico de Belo Monte, no Estado do Pará. A Comissão de Constituição e
Justiça (CCJ) da Câmara dos Deputados decidiu, ontem, por unanimidade, que
não é necessário que o Congresso Nacional autorize a realização dos estudos
do empreendimento e entendeu que não existe impedimento para a continuidade
dos trabalhos que estão sendo feitos pela Fundação de Amparo ao
Desenvolvimento da Pesquisa (Fadesp) da Universidade Federal do Pará (UFPA).

O parecer, dado em resposta a uma consulta feita pelo deputado federal
Anivaldo Vale (PSDB-PA), é terminativo (não precisa passar pelo plenário da
Casa) e contraria frontalmente a posição do Ministério Público Federal (MPF)
do Pará, que conseguiu paralisar as obras ao insistir na autorização do
Congresso. Na prática, a decisão deverá repercutir diretamente no Supremo
Tribunal Federal (STF), onde tramita uma ação impetrada pela União pedindo
liminar para dar continuidade à obra. O presidente do STF, ministro Marco
Aurélio Mello, havia determinado diligências. Se for seguida a tradição de
respeito aos limites de atuação dos Poderes da República, a decisão da CCJ
deverá enfraquecer, junto ao STF, a argumentação do MPF, chancelada pelo
procurador-geral, Geraldo Brindeiro. Isso porque os argumentos continuam a
ser pela necessidade de autorização do Congresso para a elaboração dos
estudos.

Na Consulta no 8/2002, apresentada no dia 18 de março de 2002 à CCJ,
Anivaldo Vale questionou sobre a necessidade de autorização do Congresso
para a realização de estudos ambientais e de viabilidade com vistas ao
aproveitamento de recursos hídricos para geração de energia elétrica. Ele
lembrou que a Centrais Elétricas do Norte do Brasil (Eletronorte) estava
desenvolvendo estudos visando a construção do complexo Belo Monte, no rio
Xingu, e que o empreendimento terá papel fundamental no atendimento da
expansão da oferta de energia no mercado nacional, a médio prazo, evitando
colapsos como o que ameaçou o País no ano passado. Em resposta à pergunta de
Vale, o relator na CCJ, deputado Inaldo Leitão (PSDB-PB), foi taxativo: "O
dispositivo constitucional não exige a autorização congressual para a
realização de estudos sobre eventual aproveitamento de recursos hídricos e
minerais em terras indígenas e, mesmo, se dado empreendimento afetará terras
indígenas". Em face do interesse público na consecução do empreendimento, o
relator disse entender que não há impedimento para a continuidade dos
trabalhos. A CCJ acompanhou o parecer do relator e a decisão deverá ser
publicada no Diário da Câmara ainda esta semana, tão logo o presidente da
Casa, Aécio Neves (PSDB-MG), a assine. Nos próximos cinco dias úteis cabe
recurso.

Os estudos ambientais de Belo Monte foram suspensos, por determinação
judicial, depois que o MPF do Pará obteve uma liminar em uma ação civil
pública apresentada na Justiça Federal do Pará. Entre os argumentos do
procurador Felício Pontes estava o da necessidade de o Congresso autorizar a
realização de estudos ambientais quando o empreendimento projetado atingir
terras indígenas, no caso a aldeia Paquiçamba. Segundo o MPF, havia risco de
serem desperdiçados R$ 3,8 milhões dos cofres públicos (valor a ser pago
pela Eletronorte para a Fadesp) caso o Congresso não viesse a autorizar o
EIA/Rima.

Destaque - Na consulta à CCJ, Anivaldo Vale observou que a Constituição
Federal não veda o desenvolvimento dos estudos ambientais, limitando-se a
proibir a prática de atos que tenham por objeto a ocupação, domínio e posse
das áreas indígenas, ou a exploração das riquezas naturais do solo, dos rios
e dos lagos nela existentes. O relator concordou com ele, anotando que a
exigência de autorização do Congresso refere-se à efetiva implantação de
empreendimento que vise aproveitamento de recursos hídricos em terras
indígenas. "Não é o caso", sentenciou.

Vale também alegou que a Eletronorte e a União não estavam contrariando o §
3o do artigo 231 da Constituição, que reconhece o direito dos índios às suas
terras e remete à União o dever de demarcá-las e protegê-las,
resguardando-lhe os bens. "Ao contrário, os estudos de EIA/Rima, suspensos
de forma que consideramos arbitrária pelo MPF e pela Justiça Federal do
Pará, servem para avaliar os eventuais impactos ambientais que sofreria a
terra indígena e assegurar o previsto na Constituição", observou o
parlamentar, que usou como principal argumento o fato de que o complexo Belo
Monte não se situa em área indígena, uma vez que a aldeia Paquiçamba está
localizada a 50 quilômetros do local em que deverá ser construída a barragem
da hidrelétrica.

Com a mesma alegação, Anivaldo Vale questionou a afirmação do MPF sobre o
previsto no parágrafo 6 do mesmo artigo 231 da Constituição, que impede a
exploração de rios existentes em terras indígenas, ressalvado o interesse
público da União, definido em lei complementar.

O parlamentar lembrou, ainda, que, mesmo que o empreendimento estivesse
localizado em área indígena, não existe ainda a lei complementar que
regulamenta o dispositivo constitucional, o que significa que a União pode
definir o que são os "interesses superiores" da sociedade. Também observou
que a ausência da lei não impede a realização dos estudos ambientais: "É
evidente a necessidade pública de geração energética, mesmo porque o
complexo Belo Monte foi reconhecido como de interesse estratégico para o
País pelo Conselho Nacional de Política Energética (CNPE)", contrapôs
Anivaldo Vale, referindo-se à Resolução no 2, do CNPE, datada de 17 de
setembro do ano passado. Ele destacou que o CNPE criou, no dia 4 de março
deste ano, um Grupo de Trabalho para estudar e apresentar um plano de
viabilização do complexo Belo Monte, com a participação de diversos técnicos
dos governos federal e estadual (incluindo os da Eletrobrás e Banco Nacional
de Desenvolvimento Econômico e Social) e membros da sociedade civil.

O relator na CCJ, deputado Inaldo Leitão, citou trecho da argumentação do
MPF na ação civil pública, em que se diz que se faz urgente a "paralisação
do desperdício de recursos por ausência da lei complementar que defina a
existência de interesse público da União" para a realização do
empreendimento.

Complexo hidrelétrico não afeta índios

"Não compartilho do entendimento do Ministério Público Federal". A afirmação
é do relator na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Câmara Federal,
deputado Inaldo Leitão (PSDB-PB), que reafirma que o dispositivo impede a
realização de atos que resultem em ocupação, domínio e posse das terras dos
índios e que, no caso do complexo hidrelétrico de Belo Monte, tratam-se
somente de estudos ambientais visando a construção da hidrelétrica "cujo
empreendimento não afetará diretamente comunidades indígenas e tampouco
ocorrerá ocupação, domínio e posse dessas áreas". Mais adiante, Leitão
também dá razão ao deputado federal Anivaldo Vale (PSDB-PA) ao afirmar que a
inexistência de lei complementar não impossibilita os estudos: "A União
reconheceu o relevante interesse público da obra, em face da necessidade de
expansão da oferta de energia elétrica para atendimento adequado à população
e demais segmentos da sociedade, considerando tratar-se de serviço público,
para o qual exigem-se os requisitos da continuidade e da eficiência em sua
prestação".

Papel - Leitão lembrou que é prerrogativa da administração pública deliberar
sobre a realização de obras e serviços necessários ao atendimento público e
afirmou: "Portanto, sendo indiscutível a necessidade de expansão da oferta
de energia elétrica no mercado nacional, está presente o interesse público
na realização dos referidos estudos com o objetivo de implantação do
complexo hidrelétrico". O relator destacou que a realização desse tipo de
estudo "integra o objeto social das empresas concessionárias de energia
elétrica de controle estatal, como é o caso da Eletronorte" e "trata-se de
importante e verdadeiro investimento dessas empresas, sem os quais torna-se
impossível expandir a produção energética nacional".

Vale também refutou, na consulta, os questionamentos à capacidade da
Fundação de Amparo e Desenvolvimento da Pesquisa (Fadesp) para realizar
estudos da envergadura do EIA/Rima de Belo Monte. Ele informou que a
Universidade Federal do Pará (UFPA) é, dentre as instituições de ensino
superior da Amazônia, a que possui o maior número de mestres e doutores e
que a Fadesp tem utilizado, para os estudos, profissionais de reconhecida
competência, tanto da UFPA como de outros centros de referência de todo o
País. Acrescentou que o Tribunal de Contas da União (TCU) reconheceu a
idoneidade técnica da Fadesp e a regularidade da contratação da fundação
pela Eletronorte.

Em outubro de 2000 foram iniciados os estudos ambientais para a elaboração
do EIA/Rima (Estudos e Relatório de Impacto Ambiental) do empreendimento
Belo Monte. A medida é necessária para qualquer obra de infra-estrutura que
tenha impacto sobre o meio ambiente. Para isso, foi firmado um convênio
entre a Fadesp e a Eletronorte. Somente após o EIA/Rima é que a Agência
Nacional de Energia Elétrica (Aneel) poderá licitar a concessão, uma vez que
o empreendimento só pode ser iniciado após o Projeto Básico Ambiental e a
Licença de Instalação.

O complexo Belo Monte, localizado no município de Altamira, tem previstas
duas usinas: uma com onze mil megawatts de potência; e outra com 182 MW, o
que representa aproximadamente 10% da potência instalada do País. O complexo
custará cerca de US$ 6 bilhões. Para executar a usina, o vencedor da
licitação precisará desembolsar US$ 3,7 bilhão, mais o sistema de
transmissão, orçado em US$ 2,5 bilhão. O plano de desenvolvimento regional
também vai incluir um percentual (aproximadamente 5% sobre o valor investido
na obra) de investimentos por parte do empreendedor.

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