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Atraso de Belo Monte aumenta custos

O Liberal-Belém-PA
Autor: Sônia Zaghetto
24 de Nov de 2002

O atraso de um ano na data de entrada em atividade da hidrelétrica de Belo Monte deverá proporcionar um acréscimo de US$ 267 milhões no custo total de operação do sistema elétrico nacional. A informação consta de relatório feito pela Eletronorte e encaminhado à equipe do futuro governo federal. O estudo informa que, a partir de 2008, a necessidade de expansão do parque gerador brasileiro será de 4,5 mil MW anuais em usinas hidrelétricas, o que corresponde a construir uma usina do porte de Belo Monte a cada dois anos e meio.

O presidente da Eletronorte, José Antonio Muniz Lopes, reuniu-se na terça-feira, 19, com a coordenadora de infra-estrutura do governo eleito, Dilma Roussef. Muniz disse que a coordenadora demonstrou curiosidade sobre o projeto Belo Monte, mas acrescentou que o tema foi tratado superficialmente. Mesmo assim, o presidente da estatal entregou o relatório "A importância de Belo Monte para o setor elétrico brasileiro", onde se garante que sem a expansão do parque gerador não será possível alcançar um cenário de crescimento econômico com desenvolvimento social.

De acordo com o documento, se Belo Monte não entrar em operação em 2008 ou, no máximo, 2009, não haverá como substituí-la, dada a ampla oferta de energia da nova usina. Localizada na região da Volta Grande do rio Xingu, no município de Altamira, Belo Monte terá potência instalada de 11 mil MW e geração média de 5 mil MW. Com esses números, será a maior hidrelétrica brasileira e a quarta maior do mundo."O Brasil não tem alternativas a Belo Monte", afirmou Muniz ao sair da reunião com a equipe de transição.

No ano passado, os estudos de impacto ambiental de Belo Monte, que seriam conduzidos pela Fundação de Amparo e Desenvolvimento da Pesquisa (Fadesp), da Universidade Federal do Pará, foram suspensos por uma liminar do juiz federal Rubens Rollo d'Oliveira, da 3ª Vara, mas então respondendo pela 4ª. A decisão atendeu a pedido do Ministério Público Federal, que move uma ação civil pública questionando o contrato e alegando que caberia ao Congresso autorizar os estudos, já que o empreendimento atinge a aldeia indígena Paquiçamba, da etnia juruna. No início deste mês, o presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), Marco Aurélio Mello, manteve os estudos suspensos.

Na reunião com a equipe de transição, Muniz disse que ainda serão necessários mais dois anos para a elaboração do projeto básico executivo de Belo Monte e entre quatro a cinco anos para a construção da usina, que deverá custar US$ 3 bilhões. A linha de transmissão consumirá outros US$ 2 bilhões.

No documento entregue à equipe do presidente eleito Luiz Inácio Lula da Silva, Belo Monte aparece como a melhor alternativa para o sistema elétrico brasileiro. Os argumentos são a competitividade, o impacto ambiental reduzido e a capacidade de proporcionar a integração entre bacias hidrográficas, garantindo energia no sistema interligado. "É necessário que o projeto - que é excepcional do ponto de vista de engenharia e de custo - continue a ser desenvolvido para que, em 2009, comece a suprir as necessidades do País", afirmou Muniz.

Em outras palavras, o projeto - que foi considerado de interesse estratégico pelo Conselho Nacional de Política Energética - acrescentaria ao Sistema Interligado Brasileiro 4.796 MW médios de energia firme. Com isso, propiciaria aos outros sistemas economizarem na produção de energia local, o que manteria em nível mais alto o volume de água dos reservatórios do Sul, Sudeste e Nordeste durante o período seco. Hoje, esse período é crítico para o sistema interligado devido às vazões baixas que geram risco de racionamento e apagão.

A data mencionada por Muniz - o ano 2009 - não é aleatória. Um estudo elaborado pelo Comitê Coordenador do Planejamento da Expansão dos Sistemas Elétricos (CCPE), do Ministério das Minas e Energia prevê que até 2007 haverá sobre-oferta de energia no País. Entretanto, a partir de 2008 as projeções mostram que será necessário ampliar a oferta de energia implantando novos projetos de geração que reduzam o risco de déficit e o custo de operação do sistema. "Além de Belo Monte serão necessárias outras usinas elétricas para suprir as necessidades do mercado consumidor", analisa Muniz. Os estudos apontam que será preciso construir uma usina equivalente a Belo Monte a cada dois anos e meio, a fim de atender à necessidade de instalar anualmente no País 4.500 MW.

A Eletronorte planejava que a usina estivesse concluída até março de 2009. O relatório aponta que um ano de atraso significaria onerado em US$ 267 milhões o custo total de operação do sistema, devido a substituição de parte da energia de Belo Monte por geração termelétrica. Com a exclusão do Complexo Belo Monte da lista de empreendimentos com possibilidade de entrar em operação nos próximos dez anos implicará em aumento do parque térmico nacional, uma vez que é reduzido o número de empreendimentos hidrelétricos de grande e médio porte com possibilidades de serem viabilizados no período.

Substituição representa mais impactos ao meio ambiente

Substituir os 11 mil MW gerados pelo Complexo Hidrelétrico de Belo Monte sairia caro para o Brasil. O governo federal precisaria construir 42 usinas e 48 pequenas centrais hidrelétricas, mas a um custo significativo para o meio ambiente e para os cofres públicos. A área inundada para a construção dessas usinas seria treze vezes superior ao reservatório da hidrelétrica do rio Xingu e os gastos também superariam bastante os de Belo Monte.

No documento "A importância de Belo Monte para o setor elétrico brasileiro", a Eletronorte aponta as opções energéticas para a substituição da usina no plano de expansão do setor elétrico brasileiro. As alternativas são outras usinas hidrelétricas ou termelétricas movidas a gás natural ou carvão, além das termonucleares. Fontes alternativas de energia - solar, eólica e biomassa - são mostradas como possíveis de ser utilizadas como complementação da geração convencional.

O documento afirma que, como a maioria das hidrelétricas brasileiras mais atrativas do ponto de vista econômico-ambiental já estará construída até o ano 2009, a única opção para substituir Belo Monte será a construção de dezenas de outras hidrelétricas "que causarão, juntas, impacto ambiental negativo superior".

Entre as opções hidrelétricas, foram pesquisados junto à Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) os empreendimentos com potencialidade de viabilização após o ano 2008 e que poderiam funcionar como alternativa a Belo Monte. Algumas das 42 obras listadas já constam do programa de concessão de licitações da agência para 2003 e outros tiveram seus projetos aprovados nos últimos cinco anos, o que permitiria que fossem licitados mais cedo.

O impacto ambiental, entretanto, é bem maior: somente a área inundada de um desses empreendimentos - a hidrelétrica de Araguanã, na fronteira do Pará com o Tocantins - teria um reservatório quatro vezes maior que o de Belo Monte e potência instalada dez vezes menor (960 MW).

No capítulo dedicado às termelétricas, a Eletronorte adverte que esse tipo de usina é altamente poluidora da atmosfera por conta da emissão de partículas após a queima do combustível. As de menor impacto ambiental são as que utilizam gás natural. Entretanto, para obter uma potência similar à de Belo Monte, a estimativa preliminar é que o volume diário de gás natural a ser utilizado seria de nada menos que 42 milhões de metros cúbicos, que corresponde a toda a capacidade do gasoduto Brasil-Bolívia.

"Seria necessário que novas jazidas de gás natural fossem descobertas pela Petrobrás ou que um novo gasoduto fosse construído para importação de gás da Bolívia em quantidades suficientes para ser utilizado na geração termelétrica de substituição a Belo Monte", diz o documento da Eletronorte.

A outra opção para as térmicas - utilização de carvão mineral - além de extremamente poluente e de alto custo (o dobro de Belo Monte), implicaria em gasto extra representado pela construção de linhas de transmissão ligando a região Sul (onde se concentram as jazidas) aos mercados consumidores do Nordeste e do Sudeste.

No caso das usinas termonucleares, que por conta de seu histórico negativo de acidentes radiativos são utilizadas apenas por países com parcos recursos hidrelétricos, a opção para substituir Belo Monte seria a construção de oito usinas equivalentes a Angra II.

Dentre as fontes alternativas, a Eletronorte destaca que seriam necessários 110 milhões de painéis de 100 Watts para produção de energia solar e igual número de baterias para o armazenamento. O custo da energia gerada seria 20 vezes maior que a de Belo Monte, sendo que a energia solar tem restrições por suprir apenas pequenas cargas (períodos de 4 a 6 horas por dia) além de ter sua capacidade reduzida em períodos chuvosos ou muito nublados.

No caso da energia eólica seriam necessários aproximadamente 22 mil aerogeradores (turbinas eólicas) de 500 kW, o que custaria seis vezes mais que a hidrelétrica da Volta Grande do Xingu.

Inundação teria pequeno índice

Em comparação com as dez maiores hidrelétricas brasileiras, Belo Monte teria o segundo menor índice de inundação. A maior hidrelétrica do país, a binacional, Itaipu, gera 12.600 MW e tem uma área inundada de 1.460 Km2. Seu índice de inundação é de 8,6 MW gerados por quilômetro quadrado. A atualmente maior usina brasileira, Tucuruí, já com a segunda etapa em funcionamento, gerará 8.325, mas tem um reservatório de 2.850 km2, o que resulta em um índice de inundação que corresponde a apenas 2,9 MW gerado por quilômetro quadrado de área inundada.

O índice de Belo Monte é de 25,4 MW gerados por cada quilômetro quadrado inundado. A usina perderia somente para a hidrelétrica de Xingó, que gera 3 mil MW e tem um reservatório de 60 quilômetros quadrados.

Outra vantagem apresentada pela Eletronorte é o fato de Belo Monte apresentar um dos mais baixos custos de geração dentre as usinas consideradas nos estudos do governo federal. Somados os investimentos na usina e no sistema de transmissão, o custo de geração de Belo Monte é de US$ 23/MWh. O valor corresponde a uma redução de 32% no custo marginal de expansão da geração no período 2002-2011, estimado em US$ 34/MWh.

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