VOLTAR

Assembléia histórica discute defesa de TI Yanomami e o fortalecimento da Hutukara

Instituto Socioambiental - www.socioambiental.org
Autor: Ana Paula Caldeira Souto Maior com equipe da CCPY.
02 de Dez de 2008

A 3ª Assembléia da Hutukara Associação Yanomami (HAY) reuniu cerca de 200 yanomami e yekuana, na comunidade do Ajarani,em Caracaraí (RR), para discutir fiscalização, gestão territorial, saúde e educação. Os indígenas representam 75 aldeias dispersas em 30 regiões, que compõem a Terra Indígena (TI) Yanomami, localizada nos estados de Amazonas e de Roraima.

Considerada histórica, a assembléia da Hutukara foi realizada na comunidade do Ajarani, município de Caracaraí, em Roraima e, além de representantes vindos de diferentes locais da TI Yanomami, contou com a participação de oito yanomami da Venezuela e de representantes da Ayrca (Associação Yanomami do Rio Cauburis e Afluentes), que reúne seis aldeias da região de São Gabriel da Cachoeira, no Amazonas.

O grupo se reuniu durante 15 dias para discutir fiscalização, gestão territorial, saúde e educação, entre outras questões. Estavam presentes diversas lideranças tradicionais, xamãs e também professores e agentes de saúde, que ficaram responsáveis pelo registro da assembléia em quatro línguas yanomami e na língua yekuana.

A 3ª Assembléia a Hutukara Associação Yanomami (HAY) teve início na noite de 22 de novembro, com a realização do wayamou, diálogo cerimonial elaborado por uma dupla de yanomami de regiões diferentes, cujos participantes se revezaram ao longo da noite. Na grande maloca, recém-construída, os índios falavam exaltando as relações de amizade, troca, respeito mútuo e de aliança para a proteção do território comum. O wayamou começou tarde da noite e se prolongou por toda a madrugada.

O foco principal da assembléia foi a proteção da terra indígena e os participantes buscaram, como estratégia, o fortalecimento institucional da HAY, com articulação entre as aldeias em Roraima e no Amazonas, para a defesa do território yanomami.

O presidente da Hutukara, Davi Kopenawa, fez um discurso histórico de como começou o seu trabalho em defesa do povo Yanomami e de criação da Hutukara. Dario Vitório, tesoureiro da HAY e filho de Davi, conduziu dois dias de discussões voltadas para o fortalecimento da associação como um instrumento de defesa do território.

Os desafios do povo yanomami

A região do Ajarani - onde aconteceu a Assembléia - é cortada pela BR-210, a Perimetral Norte, uma estrada construída nos anos 1970 que, apesar de interrompida, deixou marcas da invasão - como desestruturação social, assentamentos de não-índios e invasão de pessoas para pescar e caçar. O Ajarani foi escolhido para discutir as soluções para esses problemas e fortalecer as comunidades indígenas locais. (Leia notícia relacionada).

Os representantes da Ayrca ajudaram a discutir os desafios que estão colocados ao povo yanomami e ressaltaram a importância do fortalecimento de sua representação por meio da Hutukara e da articulação política entre os yanomami de Roraima e os do Amazonas. Falaram ainda dos problemas que os yanomami no Amazonas enfrentam com a falta de consulta prévia para a realização de obras dentro de suas terras, como a construção de abrigos para turistas na região do Pico da Neblina. Os yanomami da Venezuela levaram quatro dias para chegar ao Ajarani e estavam felizes em poder compartilhar experiências.

Entre as ameaças à integridade territorial e ambiental estão a invasão de quase dois mil garimpeiros e a permanência de fazendeiros na região. O administrador da Fundação Nacional do Índio (Funai) em Roraima, Gonçalo Teixeira, informou que o órgão convocou recentemente os ocupantes de terras, com o fim de atualizar o levantamento das benfeitorias em 17 ocupações, para proceder às devidas indenizações. O superintendente do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) no estado informou que o órgão está buscando terras para fazer o reassentamento desses ocupantes.

Mudanças na Saúde Indígena

A Hutukara tem apoiado ações yanomami de controle social e se destacado na concepção de um novo modelo de saúde indígena. Em agosto deste ano lideranças yanomami se reuniram com o ministro da Saúde, José Gomes Temporão, e fizeram propostas concretas de modificações.

Os representantes das várias regiões relataram a atual precariedade na assistência à saúde yanomami, como o sucateamento dos postos de saúde, falta de medicamentos, descontinuidade dos trabalhos de vacinação, combate a doenças como malária e oncocercose, além da paralisação, desde 2004, na formação dos agentes de saúde yanomami.

Foi enfática a manifestação de revolta de algumas lideranças com os freqüentes escândalos de corrupção na Fundação Nacional de Saúde (Funasa) relacionados ao desvio de verbas destinadas à saúde indígena. Na presença de Marcelo Lopes, coordenador regional da Funasa, mais de 60 lideranças yanomami cobraram mudanças no atendimento de saúde em suas regiões.

A assembléia se posicionou a favor da decisão de retirada da saúde indígena da Funasa e sua transferência para uma secretaria específica a ser criada no Ministério da Saúde. Para os yanomami, a medida deve ser acompanhada de outras, como manter o subsistema de saúde indígena e realizar a transformação dos Distritos Sanitários Especiais Indígenas (Dseis) em unidades gestoras vinculadas diretamente a essa secretaria. Ressaltaram ainda a necessidade da participação permanente indígena no processo de gestão e de implementação do novo modelo de gestão da saúde e da garantia de continuidade na assistência durante o período de transição da Funasa para a nova secretaria.

Reconhecimento de professores e escolas

Em relação à educação, enfatizaram para o secretário de educação do Estado de Roraima, Luciano Moreira, o compromisso com o reconhecimento da formação dos professores yanomami, que será concluída em 2009 e é realizada pelo Programa Intercultural de Educação da Comissão Pro-Yanomami (CCPY).

Diversas lideranças e professores entregaram documentos e pedidos de reconhecimento e criação de novas escolas no interior da Terra Indígena, além de maior suporte, por parte da Secretaria de Educação, às escolas já reconhecidas. Reivindicam também a contratação de mais professores yanomami para atuar em suas comunidades.

O procurador do Ministério Público Estadual, Edson Damas, apoiou integralmente as reivindicações declarando-as justas, necessárias e urgentes.

Eleição da nova diretoria

Os dois últimos dias da Assembléia foram dedicados à escolha da nova diretoria da Hutukara, promovida por meio de um processo amplamente discutido entre os yanomami. Davi Kopenawa foi reeleito para um novo mandato de dois anos. Para os demais cargos da diretoria foram elegeram-se: Anselmo Xiropino, vice-presidente; Enio Mayanawa e Trento Yanomami, primeiro e segundo secretários; Dário Vitório e Mozarildo Yanomami, tesoureiro e vice; Tino Yanomami e Maurício Yekuana, coordenadores de Terra e Ambiente; Ivan Ninan e Huti Yanomami, coordenadores de Educação e Cultura; e, finalmente, Geraldo Kuesitherë e Paulinho Hesinare, coordenadores de Saúde.

Convidados e participantes

Estiverem na assembléia representantes da Funai, da Funasa, do Incra, do Instituto Brasileiro de Meio Ambiente (Ibama), do Instituto Chico Mendes (ICMBio), do Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia(Inpa), da Embrapa, da Secretaria de Educação do Estado de Roraima, do Ministério Público Estadual, da Prefeitura de Caracaraí, da CAFOD, da Embaixada da Finlândia e da Fundação Rainforest dos Estados Unidos.

A realização do evento contou com o apoio da CESE, da Embaixada da Finlândia, da Diocese de Roraima, da CCPY, do ISA, da Wataniba, da Funai e de integrantes do Dsei Yanomami.

ISA, Ana Paula Caldeira Souto Maior com equipe da CCPY.

As notícias aqui publicadas são pesquisadas diariamente em diferentes fontes e transcritas tal qual apresentadas em seu canal de origem. O Instituto Socioambiental não se responsabiliza pelas opiniões ou erros publicados nestes textos. Caso você encontre alguma inconsistência nas notícias, por favor, entre em contato diretamente com a fonte.