G1 BA - https://g1.globo.com/ba/bahia/noticia/2020/07/28/apos-mais-de-40-anos-de-disputa-territorial
Autor: G1 BA
28 de Jul de 2020
Titulação foi assinada nesta terça-feira (28), na superintendência do Incra. Desde meados de 1970, comunidade lutava por reconhecimento das próprias terras, após Marinha construir Base Naval de Aratu.
Depois de mais de 40 anos em disputa territorial, a titulação das terras do Quilombo Rio dos Macacos, que fica em Simões Filho, na região metropolitana de Salvador, foi assinada nesta terça-feira (28), na sede da Superintendência do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra), no Centro Administrativo da Bahia (CAB), na capital.
O Quilombo Rio dos Macacos disputava o território com a Marinha, desde meados de 1970. O conflito começou depois que a Base Naval de Aratu foi construída e a União pediu a desocupação da área pelos quilombolas.
"Essa titulação nos dá mais empoderamento, além daquilo que a gente já entendia que era um direito da gente. É a nossa carta de alforria assinada", disse o pescador e quilombola José de Souza, que vive na comunidade do Rio dos Macacos.
As terras, que agora são de propriedade do quilombo têm 98 hectares e fica na cidade de Simões Filho, na região metropolitana de Salvador. Essa foi a primeira titulação de terras na Bahia, segundo o defensor público federal André Porciúncula, que participou da cerimônia de assinatura.
"Somos uma comunidade carente, desde o passado até hoje. A gente nunca teve nada, porque a Marinha nunca deixou a gente ter nada. Eu nasci em casa de barro, com luz de candeeiro. E até 2017, a gente estava sem energia dentro da nossa comunidade. Todas essas vitórias, para a gente são muito grandes. Pode ser pequena para alguém, mas para nós é grande", disse Olinda Oliveira, que também é quilombola e pescadora.
Longa disputa
Em meio à batalha judicial e entre tentativas de desapropriação, no ano de 2009, os quilombolas pediram uma intervenção do Ministério Público Federal (MPF) para provar que eles são remanescentes de escravizados e, portanto, tinham o direito de posse das terras.
A situação se arrastou por mais três anos e, só em julho de 2012, o Incra classificou a terra do Rio dos Macacos como uma área quilombola. Um relatório técnico foi emitido constatando que a comunidade era centenária e estava no local antes da chegada da Marinha.
O próximo passo seria o reconhecimento das terras pelo próprio Incra e o pedido de certificação da Fundação Cultural Palmares, mas a Marinha entrou com processo judicial e pediu a desocupação do quilombo, dias depois do relatório e a classificação do Incra.
O pedido foi acatado pela Justiça, em agosto de 2012, que determinou que 46 famílias quilombolas saíssem do local, sob pena de retirada compulsória. No mesmo período, a União fez uma proposta para que o Quilombo Rio dos Macacos mudasse de lugar, o que não foi para frente. Na época, o então ministro da Defesa, José Genoíno, disse que "O Brasil não vai abrir mão da Base Naval de Aratu",
Já em 2014, o Incra fez a delimitação das terras dos quilombolas, mas somente três anos após emitir o relatório técnico de que a comunidade era centenária, o instituto reconheceu que a área ocupada era um quilombo. Desde então, os moradores passaram a aguardar a assinatura de titulação das próprias terras.
Violência
Por muitos anos, os quilombolas do Rio dos Macacos denunciaram ações violentas por parte de militares da Marinha, como invasões a residências e agressões, agressões. Em algumas delas, militares chegaram a ser afastados por causa de ações truculentas contra moradores.
O acesso dos quilombolas ao território era controlado pela Marinha, que muitas vezes impedia que visitas chegassem no local, como o Bando de Teatro Olodum, que já foi barrado na entrada. Muitos moradores também relataram agressões nesse acesso à área. Uma delas foi registrada por câmeras de segurança em 2014, quando duas pessoas foram agredidas pelos militares.
Em 2018, a Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH) da Organização dos Estados Americanos (OEA) esteve no quilombo para observar a situação de garantia dos direitos humanos da população no local. Na época, o G1 tentou acompanhar a visitação no local, mas o acesso da imprensa não foi autorizado pela Marinha.
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