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Aperto orçamentário reduz verba e enfraquece política ambiental

Valor Econômico, Brasil, p. A1-A2.
Autor: CHIARETTI, Daniela
04 de Ago de 2022

Aperto orçamentário reduz verba e enfraquece política ambiental
O orçamento dos órgãos que executam a política ambiental no País foi reduzido em 66% em relação aos anos em que o Brasil conseguiu melhor performance no controle do desmatamento, diz estudo

Daniela Chiaretti

04/08/2022

Em 2019, início do governo Bolsonaro, o orçamento destinado à gestão ambiental era de R$ 5 bilhões, o menor valor desde 2005. Os anos seguintes foram de queda contínua e 2022 foi o quarto ano consecutivo de menor orçamento em 17 anos - R$ 3,4 bilhões.

O diagnóstico é de um relatório inédito do Instituto Socioambiental (ISA) em parceria com pesquisadores da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) sobre o financiamento público entre 2005 e 2021 para a gestão ambiental.

O cenário de arrocho orçamentário dos principais órgãos que executam a política ambiental do país mostra uma redução significativa em relação aos anos em que o Brasil conseguiu melhor performance no controle do desmatamento. "Tomando como referência o desmatamento na Amazônia Legal em 2012, que representa a menor taxa da série histórica e a implementação de importantes medidas de gestão ambiental (gestão de áreas protegidas, políticas de comando e controle, monitoramento ambiental, etc), as despesas na função gestão ambiental em 2021 tiveram uma redução de 66%", diz a análise.

Foram analisados os orçamentos na rubrica gestão ambiental do Ministério do Meio Ambiente, do Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio), do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama), do Serviço Florestal Brasileiro (SFB), da Fundação Nacional do Índio (Funai), do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe) e do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra).

"Analisamos a rubrica gestão ambiental destes órgãos. O Inpe, por exemplo, tem muitas atividades. Olhamos o financiamento público no monitoramento do desmatamento e de queimadas", ilustra Camila Rizzini Freitas, da UFRJ, uma das autoras do estudo.

A dotação inicial para o Ministério do Meio Ambiente sofreu queda expressiva em 2020 e 2021, chegando a apenas 40% do valor proposto em 2019. O Valor procurou o MMA mas não obteve retorno até o fechamento da edição.

"O mais grave ao olharmos as rubricas do orçamento aprovado pelo Congresso é o efetivamente executado", diz Antonio Oviedo, assessor do ISA e um dos autores da análise. "Além da redução dos orçamentos dos órgãos responsáveis pela pauta ambiental e indigenista, também foi reduzida a implementação dos recursos. Ou seja: o orçamento ficou menor e o governo não gasta 100% do aprovado".

O caso do Inpe é um dos mais dramáticos. O órgão é referência nos dados de monitoramento do desmatamento e de queimadas pela análise de imagens de satélite. O Prodes, por exemplo, contabiliza o desmatamento da Amazônia e é o dado oficial do Brasil ano a ano desde 1988. Os alertas de desmatamento do Deter contribuíram com a redução do desmatamento em 83% entre 2004 e 2012. Desde 2013, contudo, o órgão sofre uma redução de 74% em suas despesas.

"O Brasil, historicamente, não é um país que prioriza a gestão ambiental no orçamento. Todo o recurso destinado à gestão ambiental fica em torno a 1% a 2% do orçamento do Executivo", diz Oviedo. "O que percebemos, nos últimos três anos, é que o orçamento da gestão ambiental, que já era baixo, teve uma redução de 66% em 2021, para os sete principais órgãos executores da agenda ambiental".

São órgãos que possuem programas ou ações ambientais como fiscalização e monitoramento, implementação de áreas protegidas, gestão de terras indígenas, regularização de territórios quilombolas, controle de qualidade ambiental urbana e rural, por exemplo.

"A agenda do desmonte ambiental não é algo ao acaso, mas uma estratégia que começa com a desorganização dos recursos humanos das agências governamentais e, em um segundo movimento, na redução do orçamento e, portanto, das capacidades de implementação das políticas públicas", segue Oviedo.

O estudo, que contou ainda com o pesquisador Rodrigo Abreu Carvalho, também da UFRJ, levanta o financiamento público da política ambiental brasileira desde 2005. A análise foi feita com base nos dados do orçamento federal do Sistema Integrado de Planejamento e Orçamento (Siop). Os valores estudados foram da dotação inicial - que representa as prioridades do Executivo que envia a Proposta de Lei Orçamentária a ser aprovada pelo Congresso. O segundo eixo da análise são as despesas liquidadas, ou seja, o montante de recursos efetivamente gastos.

Os resultados da análise também mostram queda na execução orçamentária do SFB, o órgão que passou ao Ministério da Agricultura e controla a validação do Cadastro Ambiental Rural (CAR) no sistema. "Estamos em uma fase de validação do CAR e de somar esforços para implementação do Código Florestal", diz Oviedo. "O que temos hoje é muita assimetria no CF. Territórios de populações tradicionais, como quilombos, permanecem invisíveis no cadastro do CAR. Com o corte no orçamento, corremos o risco de validar imóveis privados dentro de quilombos que terão muita dificuldade em validar seus territórios".

Valor Econômico, 04/08/2022, Brasil, p. A1-A2.

https://valor.globo.com/brasil/noticia/2022/08/04/aperto-orcamentario-r…

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