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Ao Procurador da República em Mato Grosso, Sr. Mário Lúcio de Avelar.

OPAN-Cuiabá-MT
Autor: Andrea Jakubaszko
11 de Out de 2005

A OPAN (Operação Amazônia Nativa) foi convidada, em 1999, pelo então representante do ministério da saúde Sr. Ubiratã Pedrosa (diretor do DESAI) para assumir, em
2000, a saúde indígena no âmbito do Distrito Cuiabá (composto por 12 etnias) na fase de implementação dos DSEIs no País.

Seria aquele, o primeiro momento de empreender um modo de atenção à saúde indígena com caráter de política pública - estritamente vinculado ao SUS - a partir de
um modelo diferenciado, estruturado como sub-sistema (conectado diretamente a instância federal - FUNASA -DESAI / Dep. de Saúde Indígena), fundamentado pelo estatuto
do índio, constituição de 88 e Lei Arouca -Decreto 9.836 de 1999 e, elaborado num longo processo de discussões e diálogos constituídos historicamente pelo Movimento
Indígena e seus diversos parceiros.

Para a OPAN, a saúde indígena não era um tema novo posto que, desde 1969, atua com populações indígenas e dentre suas linhas de ação incluía a saúde indígena através
de programas que variavam desde atenção básica, acompanhamento às referencias, educação para saúde e debates acerca da medicina tradicional e políticas de saúde.
Tudo isto num tempo em que não havia um plano de governo definido como política pública para atendimento desta demanda social.

A Opan sempre entendeu de acordo com diversas instituições governamentais e não governamentais que, a Saúde Indígena é de responsabilidade do Estado. Nesse sentido
aceitou, como parceira, o convite para assumir a atenção à saúde não de todos os povos que integram o DSEI Cuiabá, mas de uma parte deles (Manoki/Irantxe, Enawene
Nawe, Myky e a partir de 2004 Nambikwara) dentre os quais a OPAN já desenvolvia projetos.

A perspectiva de assumir um convênio com o governo federal para execução de tal tarefa apontava (e aponta) na direção de contribuir na estruturação do sub-sistema
distrital através de ações de execução e implementação direta promovendo a contratação e qualificação de um quadro de funcionários aptos para execução de um plano
de trabalho elaborado com base nas prerrogativas do ministério da saúde e formulado em conjunto com cada uma das comunidades atendidas em suas particularidades.

Desse modo, para a OPAN, o convênio possuía um sentido de caráter transitório definido como parcela de contribuição à institucionalização da Saúde Indígena como
política pública garantindo interlocução de qualidade entre a realidade indígena e o sistema estatal e a qualificação e formação de mão de obra especializada e necessária
ao contexto em evidência. Além disso, o principal foco de atenção da OPAN concentrou-se prioritariamente na capacitação adequada dos profissionais de saúde indígena
visando fortalecer a prevenção e autonomia desses povos no que se refere ao cuidado com a sua saúde. Esta prioridade sinalizava constantemente para o caráter transitório
da presença da OPAN como responsável direta pela execução dos planos de trabalho distritais.

Atualmente, a OPAN atende uma população aproximada de 1100 pessoas e conta com 45 profissionais em sua equipe, sendo quase a metade, 21, composta por profissionais
indígenas.

Nesses quase seis anos de convênio enfrentamos dificuldades de diversas ordens, no entanto, registramos alguns aspectos positivos tais como: a baixa taxa de mortalidade
infantil, o bom andamento de programas preventivos como saúde da mulher, desenvolvimento infantil, DSTAids,a estruturação de um banco de dados sobre a saúde dos
povos atendidos, a estruturação dos conselhos de saúde locais, a baixa rotatividade de profissionais, para citar alguns exemplos.

Contudo, nos últimos dois anos, em todo o país, a continuidade deste processo de trabalho tem sido afetada por problemas comuns já existentes mas que têm se intensificado
em grande medida. Para enumerar alguns: ausência de canal para diálogo político, falta de condições mínimas de trabalho como infra-estrutura, veículos, material
permanente, saneamento e, sobretudo, a morosidade burocrática no encaminhamento dos tramites para o repasse dos recursos previstos destinados ao trabalho em área.

Na transição do convênio 088 de 2003 para o atual convênio 1331 de 2004, três meses de aguardo foram necessários para que se concluísse a celebração do novo convênio
e o repasse da primeira parcela para dar continuidade aos programas de trabalho. Novamente em 2005, já aguardamos há oitenta dias a autorização de suplementação
do referido convênio entendida como prorrogação.

Em 2004 registramos, ainda, duas paralisações[1] em função de falta de verbas devido aos constantes atrasos no cronograma de desembolso previsto. Trabalhamos durante
todo o ano sem viaturas adequadas e com recursos mínimos visto que, com os atrasos, as parcelas já chegavam em grande parte comprometidas com despesas pendentes
e conserto e manutenção de veículos.

Mesmo atuando em condições precárias e em alguns momentos completamente inviabilizados, sempre, coletivamente, encontrávamos soluções para os problemas e nunca deixaram
de ser atendidas as emergências ou mesmo as providências necessárias aos encaminhamentos de pacientes ou outras eventualidades de urgência. Esta conduta sempre evitou,
de certo modo, a necessidade de um embate frontal entre as dificuldades experimentadas no cotidiano das comunidades e as instâncias governamentais diretamente responsáveis
pela situação. Da mesma forma, a OPAN sempre optou pelo diálogo com todas as esferas envolvidas, pelo zelo com os processos de licitações, prestações de contas[2]
e, principalmente, com o rigor e cumprimento de todos os prazos, regras e pactos acordados seja com as comunidades, fornecedores, seja para com a FUNASA.

Diante disso ocorre que, neste momento vivenciamos uma situação limite pois, nossa última parcela foi recebida em junho. Hoje, além da falta de veículos e infra-estrutura
somam-se às dividas com salários e encargos sociais, luz, telefone, água, aluguel, combustível, alimentação, passagens - notificações de corte, despejo e fim de
créditos na praça.

Havia sido previsto um cronograma de desembolso para os próximos doze meses em quatro parcelas, conforme orientação do próprio DESAI, a primeira e a segunda referiam-se
a este segundo semestre de 2005 a ser repassadas em agosto e novembro respectivamente no valor total para o semestre de R$ 900.000,00. Estamos na segunda quinzena
de outubro e nem o termo de suplementação foi à OPAN ainda encaminhado para assinatura. Com praticamente o semestre de trabalho perdido e os antecedentes aqui já
expostos, as comunidades diretamente afetadas organizam mobilizações no sentido de solucionar esta situação que se tornou insustentável.

Num primeiro momento, em idos de setembro, encaminharam uma comitiva mista de profissionais indígenas e não indígenas para Cuiabá e seguiram um fluxo e uma agenda
de visitas à sede da OPAN, sede do DSEI Cuiabá e sede da coordenação regional da FUNASA. Já naquele momento pensavam em participar o contexto à Procuradoria da República
em Mato Grosso e à imprensa porém, tendo sido recebidos em todas as instâncias e com a notícia de que até a primeira semana de outubro o repasse seria realizado
retornaram ao pólo de trabalho.

Foram informados no início de outubro que o valor da parcela não havia contudo ido a empenho até aquele momento, pois a suplementação ainda não estava assinada.
Organizaram nova mobilização, desta vez em número maior de representação das comunidades e estão em Cuiabá desde 08/10/05 decididos a permanecer o tempo necessário
pressionando todos os envolvidos até o recebimento dos recursos viabilizando a continuidade do trabalho.

Registramos assim para conhecimento do Sr Procurador da República em Mato Grosso o contexto atual ao qual estamos inseridos e agradecemos desde já a atenção dispensada.
A OPAN nunca foi adepta a alardes, sempre manteve como princípios o diálogo e a disposição a parcerias, sempre trabalhou com sobriedade, discrição e responsabilidade
mas, o que temos assistido na Saúde Indígena em todo o país é, de fato, insustentável..

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