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Ameaça 'invisível'

O Globo, Sociedade, p. 30
30 de Jun de 2016

Ameaça 'invisível'
Degradação da floresta não detectada por satélites é tão perigosa quanto desmatamento

RENATO GRANDELLE
renato.grandelle@oglobo.com.br

Além de regiões completamente devastadas, a Amazônia está repleta de pequenos trechos, invisíveis aos radares e políticas públicas ambientais, onde há extração ilegal de madeira, queimadas e isolamento do resto da mata. Um estudo internacional publicado ontem, na revista "Nature", alerta pela primeira vez para a magnitude deste estrago e mostra que a degradação florestal no bioma é tão ameaçadora - às vezes ainda mais - quanto o conhecido desmatamento.
De acordo com os pesquisadores de 18 instituições, entre as quais 11 brasileiras, a perda de biodiversidade nestas regiões perturbadas é comparável à vista nas áreas desmatadas que costumam ser contempladas pelos satélites. Mesmo as localidades com maior nível de proteção assegurado pelo Código Florestal já teriam perdido entre 46% e 61% de seu valor de conservação.
O levantamento foi realizado em 400 áreas de Paragominas e Santarém, dois municípios do Pará localizados na região de fronteira agrícola da Amazônia. Nelas, os pesquisadores analisaram o impacto das perturbações florestais a 1.538 espécies de árvores, 460 de aves e 156 de besouros, usados como indicadores da qualidade do solo.
- Todas as atenções costumam ser voltadas ao desmatamento. Outras formas de distúrbio à floresta eram ignoradas - lamenta a bióloga Joice Ferreira, coautora do estudo e pesquisadora da Embrapa Amazônia Oriental. - A formação de clareiras, um efeito da degradação, pode não parecer tão drástica, mas os animais não resistem à perda do habitat e a mata perde umidade e torna-se mais vulnerável às queimadas e às mudanças climáticas. Este impacto gradual não é considerado pelos programas de conservação.
Erika Berenguer, coautora do estudo e pesquisadora da Universidade de Lancaster (Reino Unido), destaca que o Pará abriga mais de 10% das espécies de aves do planeta. Muitas são encontradas apenas no estado.
- A degradação atinge principalmente as espécies raras, que circulam em uma área pequena - explica. - Analisamos duas cidades que foram ocupadas em épocas e por motivos diferentes, mas que acabaram sofrendo o mesmo processo degradação e impacto à biodiversidade. É possível que este resultados sejam vistos também em várias regiões do Arco do Desmatamento, assim como em outros países onde há florestas tropicais, como o Congo e a Indonésia.
Segundo o mapeamento, a degradação florestal no Pará resultou em uma perda de espécies equivalente a que ocorreria com o desmatamento de 139 mil quilômetros quadrados.
PROGRAMAS INCOMPLETOS A pesquisadora critica o governo federal por exaltar a redução do desmatamento sem mapear a situação de pequenas áreas no interior da floresta.
- Em 2008, a área degradada por fogo e extração de madeira foi duas vezes maior do que a área desmatada - compara. - Temos uma série de leis que não são postas em prática. Não importa a quantidade da floresta ainda em pé. É preciso assegurar a qualidade desta vegetação.
Hoje, 40% dos remanescentes florestais do planeta estão no Brasil. Por isso o autor principal do estudo e pesquisador da Universidade de Lancaster, Jos Barlow, acrescenta que os resultados devem servir de alerta para a comunidade global:
- O Brasil demonstrou uma liderança sem precedentes no combate ao desmatamento na última década. O mesmo nível de liderança é necessário agora para proteger a saúde das florestas restantes nos trópicos. Do contrário, décadas de esforços de conservação terão sido em vão.

O Globo, 30/06/2016, Sociedade, p. 30

http://oglobo.globo.com/sociedade/sustentabilidade/degradacao-da-amazon…

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