CB, Brasil, p. 14
16 de Jul de 2006
Ameaça de blecaute investigada
Abin, PF e serviço de inteligência do Exército apuram plano de sabotagem do edifício da Cemig, discutido por radicais do Movimento dos Atingidos por Barragens. Bem-sucedida, ação colocaria o país às escuras
Lucas Figueiredo
Do Estado de Minas
A Agência Brasileira de Inteligência (Abin), a Polícia Federal, os serviços de informações do Exército e das polícias Militar e Civil de Minas Gerais investigam um plano de sabotagem no edifício sede da Cemig, em Belo Horizonte. O atentado, se levado a termo, teria potencial para provocar blecautes em mais da metade do país.
O alvo seria o Centro de Operação do Sistema (COS), setor da empresa que controla 97% do fornecimento de energia elétrica de Minas e a transmissão de energia que passa por 20 outros estados, além do Distrito Federal. O plano foi descoberto quando militantes radicais alojados no Movimento dos Atingidos por Barragens (MAB) foram flagrados discutindo a viabilidade da ação. Líderes do movimento negam.
A reportagem do Correio /Estado de Minas teve acesso a um documento das investigações, classificado como confidencial, que trata o caso como "ameaça de atentado". O Exército e a PM colocaram tropas de prontidão. Autoridades envolvidas no caso avaliam que, hoje, é próximo de zero o risco de uma sabotagem na Cemig ser bem-sucedida, por causa da grande quantidade de militares, policiais e agentes de inteligência envolvidos na operação. Contudo, o Palácio do Planalto, o Ministério de Minas e Energia e o Palácio da Liberdade foram alertados da ameaça.
Os órgãos envolvidos na apuração ainda tentam descobrir qual a dimensão da ameaça, ou seja, se o plano de sabotagem parou na fase de discussão ou se evoluiu. Mesmo sem saber a real disposição dos mentores do atentado, o caso acabou virando assunto de segurança nacional por dois motivos: o alvo escolhido é ao mesmo tempo frágil e vital.
Luz amarela na estatal
Localizado entre o subsolo e o hall do edifício-sede da Cemig - na avenida Barbacena, no bairro Santo Agostinho, em Belo Horizonte -, o COS é o coração da empresa. Sua função é controlar os sistemas de geração e transmissão da Cemig, ou seja, supervisionar o funcionamento de 54 usinas e de uma rede de distribuição de energia com 367 mil quilômetros de extensão. Além de gerenciar a energia elétrica que abastece Minas, o COS supervisiona a transmissão de energia das regiões Norte, Nordeste e Centro-Oeste para o Sul e o Sudeste, e vice-versa.
Um hipotético colapso do COS deixaria toda essa complexa operação sem um comando central, podendo causar blecautes em nível nacional. "Sem o COS, estaríamos num vôo cego", afirmou o diretor de Geração e Transmissão da Cemig, Elmar de Oliveira Santana. Ele afirma: uma sabotagem no setor pode "parar o país".
Só o fato de ter sido identificada a vulnerabilidade do COS - um setor cuja existência não é de conhecimento amplo - já foi suficiente para acender a luz amarela nos órgãos de segurança e informações.
Outro fator levado em consideração foi o de que a idéia da sabotagem foi discutida por militantes do MAB, um movimento que tem um histórico de ações violentas - entre elas, a invasão e depredação do hall do edifício-sede da Cemig, em 3 de abril. Na ocasião, militantes do MAB e do MST destruíram portas de vidro, computadores e móveis. Um dos depredadores usou um machado, que trazia escondido dentro de uma mochila.
Aquela ação ocorreu a poucos metros do COS. Para chegar ao centro, bastava aos depredadores terem pulado uma catraca, descido uma escada de 28 degraus, arrombado duas portes de compensado e destruído uma parede de vidro.
Tranqüilidade
O presidente da Cemig, Djalma Bastos de Morais, explica que, depois que o edifício-sede da empresa foi invadido, a segurança foi reforçada. Sobretudo em pontos vitais para o fornecimento de energia. Na semana passada, as medidas foram duplicadas. Segundo apurou o Correio /Estado de Minas, o plano inclui a o aumento do efetivo de seguranças e a instalação de uma grade de aço na entrada do COS. Num segundo momento, o setor poderá ser transferido da base do prédio para o 21o andar. Outras instalações sensíveis da Cemig espalhadas pelo estado também estão passando pelo mesmo processo.
"As informações que estão chegando de que a empresa poderia voltar a ser alvo de uma suposta sabotagem, com o objetivo de interromper o nosso serviço de fornecimento de energia elétrica para os nossos clientes, nos causam indignação e surpresa, e confirmam a necessidade de ficarmos mais atentos às questões de segurança", disse Morais. "Queremos tranqüilizar a população, informando que a Cemig dispõe de um corpo técnico altamente gabaritado e de equipamentos para garantir o fornecimento seguro de energia para as mais de 18 milhões de pessoas no estado, usuárias do nosso serviço." (LF)
MAB desconhece plano
O coordenador nacional do Movimento dos Atingidos por Barragens (MAB), Joceli Andrioli, nega que militantes da organização tenham se envolvido em um plano para sabotar a Cemig. Ele acusa os órgãos de investigação e segurança, a Cemig e a imprensa de estarem por trás de um plano para desgastar os movimentos sociais. "Não somos terroristas. Os movimentos sociais são legítimos e reconhecidos internacionalmente",
diz.
Ao ser informado de que militantes do MAB eram investigados pelo suposto envolvimento em um plano terrorista, Joceli ri: "Só se eles (os investigadores) estão planejando isso. Esses caras são terroristas."
O líder do MAB confirma que, na próxima semana, a organização fará protestos em todo o país. O objetivo é denunciar os problemas das populações atingidas pela construção de barragens e reivindicar a redução das tarifas de energia elétrica e a isenção da tarifa para famílias de baixa renda. "Vamos fazer essa denúncia para a sociedade brasileira e cobrar dos governos que agilizem a discussão da pauta do movimento", explica.
Em Minas, o MAB fará uma marcha no próximo dia 21, percorrendo 400km. A saída será em Rio Doce (região da Mata), passará por Santa Cruz do Escalvado, Raul Soares, Caratinga, Coronel Fabriciano, Ipatinga, Governador Valadares e Conselheiro Pena até atingir Aimorés (região do Rio Doce), onde a Cemig opera uma usina hidrelétrica em parceria com a Companhia Vale do Rio Doce (CVRD). Segundo Joceli, a marcha não passará por Belo Horizonte.
O MAB foi criado em 1991 com o objetivo de organizar as populações atingidas pela construção de barragens. As represas já causaram problemas graves, como a perda da terra, miséria e mudanças ambientais, para 1 milhão de pessoas. Outras 850 mil serão afetadas até 2015, de acordo com a entidade.
Das reivindicações específicas - como indenização aos atingidos pelas represas e fim da construção de grandes barragens -, o MAB afinou parceria com o MST e passou a abarcar bandeiras mais genéricas, como reforma agrária, mudança do modelo do setor elétrico, reestatização da Vale do Rio Doce e redução das tarifas de energia elétrica. Nos últimos anos, o MAB patrocinou protestos mais radicais, com depredação de patrimônio público e privado, invasão de terras e bloqueio de estradas.
Mais de 100 integrantes do MAB respondem a processos criminais. O próprio Joceli, que chegou a se candidatar pelo PT a vereador em Campo Erê (SC), já foi indiciado por sabotagem, formação de quadrilha e desobediência à ordem legal de funcionário público. Na invasão da Cemig, em abril passado, Joceli estava na linha de frente. (LF)
CB, 16/07/2006, Brasil, p. 14
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