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Amazônia se une contra a biopirataria

Página 20-Rio Branco-AC
Autor: Flaviano Schneider
06 de Mar de 2003

Campanha iniciada pela organização acreana Amazonlink ganha nova dimensão com a adesão da entidade GTA

A campanha contra a biopirataria, que vinha sendo tocada solitariamente pela organização acreana Amazonlink.org, agora ganhou dimensão muito maior com a adesão do Grupo de Trabalho Amazônico (GTA), que é formado por 513 entidades de pescadores, seringueiros, agricultores, familiares, castanheiros, quebradeiras de coco babaçu, mulheres, ambientalistas e de assessoria.

Depois de reunido durante três dias em Brasília, o GTA criou, no último dia 26, um grupo técnico para a campanha contra a biopirataria, cumprindo meta definida por seu planejamento participativo que aconteceu em janeiro em Belém (PA). Em Brasília, o grupo procurou apoio com diversos parlamentares e um dos mais significativos foi o do senador Tião Viana que ficou entusiasmado em participar desta batalha, como conta o diretor da Amazonlink, Michael Schmidlehner. O senador Tião Viana reafirmou seu compromisso assumido desde o início de seu mandato no sentido de defesa do patrimônio amazônico, seja genético ou cultural.

Como se sabe, a organização Amazonlink faz aproximação entre produtores regionais e eventuais compradores de produtos da Amazônia. Foi nesta atividade, quando tentou viabilizar a exportação de bombons de cupuaçu para a Alemanha, que descobriu: o nome cupuaçu estava registrado como marca pela multinacional japonesa Asahi Foods, na Europa, nos Estados Unidos e no Japão, o que faz com que nos produtos exportáveis, baseados em cupuaçu, não pode constar o nome desta fruta amazônica cujo nome é de origem indígena e de domínio popular das comunidades da região.

Conta Schmidlehner que a audácia da Asahi Foods foi ainda mais longe já que também tem pedidos de registro de patentes sobre a extração de óleo vegetal e a produção do cupulate. Outra empresa a Cupuaçu International Inc também já pediu o registro destas patentes.

Já começou a reação brasileira

Segundo informação do GTA, as embaixadas do Brasil em Tóquio, Washington e Berlim estão estudando as leis desses países para contestar o registro em órgãos técnicos. A Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa) também já está estudando que medidas adotar tendo em vista que há provas de que o processo de produção do cupulate foi desenvolvido pela Embrapa Oriental, em 1990, no Pará.

O Ministério do Meio Ambiente já anunciou que está estudando a revisão das normas sobre ao acesso e repartição de benefícios da biodiversidade no país. O Instituto Nacional de Propriedade Industrial (INPI) enviou um dossiê para seu similar norte-americano, o USTPO, solicitando o cancelamento de marcas como Cupuaçu, Açaí, Caipirinha e outros.

São muitos os casos recentes de biopirataria como o patenteamento do sangue de povos indígenas como os Suruí e os Yanomami, da bebida milenar Ayahuasca, de óleos como os da copaíba e da andiroba, ou seja, do roubo dos conhecimentos farmacológicos e cosméticos das comunidades nativas e caboclas.

Segundo o GTA este é "o momento propício para reunir todos os movimentos que estão levantando casos de biopirataria e exigir do Brasil o enfrentamento das divergências existentes entre a Convenção da Biodiversidade Ecológica, criada no Rio de Janeiro, em 1992 e as normas sobre patentes da Organização Mundial do Comércio, aprovadas poucos anos depois".

Dentro do espírito da campanha, o GTA quer que as comunidades amazônicas estejam representadas nos grupos de trabalho que tratarão da revisão das estruturas de controle sobre o patrimônio genético e da legislação brasileira referente à sua biodiversidade, além de apoiar as políticas de valorização das sementes e conhecimentos tradicionais.

Campanha terá ato público na festa do cupuaçu

Durante a Festa do Cupuaçu, prevista para acontecer na segunda quinzena de abril, no município de Presidente Figueiredo (AM), vai acontecer um ato público de repúdio contra o patenteamento de seres vivos ou de conhecimentos comunitários no sistema brasileiro e internacional. A reunião da Organização Mundial do Comércio, em setembro no México, também pode ser alvo de um ato público de protesto, como informa o GTA.

A campanha contra a biopirataria prevê ainda a produção de materiais de divulgação, a manutenção de um banco público de dados sobre a atividade dos biopiratas no Brasil e a confecção de materiais didáticos traduzindo toda a problemática para as comunidades tradicionais e indígenas. O GTA está em busca de parcerias com pessoas e instituições dispostas a fortalecer esses esforços.

Todas estas providências - explica o GTA - seguem os princípios definidos pelo Manifesto de Rio Branco realizado em maio de 2002 pelos movimentos Grain e GTA que reuniu produtores rurais da América Latina, África e Ásia para aprofundarem o debate sobre como a globalização das patentes vem prejudicando o controle das comunidades sobre a diversidade biológica que ajudam a manter.

No entender do GTA, desde a derrocada da borracha, depois do transplante de sementes de seringueira para a Malásia, em 1876, esse pode ser o momento mais importante para a Amazônia decidir entre os direitos de suas comunidades e os interesses puramente mercantis sobre suas riquezas naturais e culturais. O GTA alerta: "Muitos outros exemplos passados e recentes comprovam como o controle dos meios de tecnologia e capital está monopolizando o patrimônio de muitos nas mãos de poucos".

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