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Amazônia: potencial mineral ainda é desconhecido

O Globo, País, p. 8
05 de Ago de 2019

Amazônia: potencial mineral ainda é desconhecido
Exposta ao garimpo, Amazônia tem potencial mineral desconhecido
Incentivo de Bolsonaro a atividade em terras indígenas acende debate. Especialistas veem riscos na exploração ilegal

Ana Lucia Azevedo

A defesa do garimpo em terras indígenas pelo presidente Jair Bolsonaro , cujo governo trabalha na legalização da exploração nas reservas , e os relatos recentes de invasão de algumas delas por garimpeiros deram protagonismo ao debate sobre a mineração na Amazônia .
Se a corrida pelo ouro, como mostrou reportagem deste domingo do GLOBO , faz aumentar a violência e a concorrência no extrativismo ilegal em áreas como a reserva ianomâmi, vários outros minérios compõem o mapa de riquezas do território da floresta.
É a região mais rica ainda a se conhecer no planeta, embora existam apenas levantamentos de potencial para a maioria da Amazônia Legal e muito pouco tenha sido prospectado através de estudos de campo até hoje.

Sabidamente existem reservas de minerais estratégicos como terras-raras - usadas em equipamentos eletrônicos -, fosfato e potássio - ambos essenciais à agricultura e hoje importados -, ouro, nióbio, cobre, diamantes dentre outros, segundo a Companhia de Pesquisa de Recursos Mineirais, a CPRM/Serviço Geológico Brasileiro.

Este ano, por exemplo, foram identificados pela CPRM no norte do Mato Grosso áreas potencialmente ricas em cobre, um dos minerais mais importantes do mundo, essencial para a indústria eletrônica e com a demanda em alta.

O valor do cobre
Estima-se que nos próximos 50 anos o mundo vai precisar de quantidade de cobre equivalente à que foi produzida nos últimos mil anos para alimentar a industrial eletrônica. O cobre é imprescindível a carros elétricos e celulares, por exemplo. Reservas da Amazônia poderiam colocar o Brasil, hoje dependente de importações, entre os grandes produtores.

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- A Amazônia é rica de quase tudo o que se possa imaginar. O potencial é alto. Mas muito pouco foi de fato foi prospectado. E toda a calha norte do Rio Amazonas é uma incógnita no que diz respeito a levantamentos minerários. Precisamos de investimento em pesquisa e tecnologia para conhecer essas riquezas e poder explorá-las de forma econômica e ambientalmente sustentável - afirma o geólogo Felipe Mattos Tavares, chefe da Divisão de Geologia Econômica da CPRM.

Tanta riqueza se explica no fato de que a maioria dos terrenos que constituem a Amazônia se formou em períodos da história da Terra em que se originaram os principais depósitos minerais. Por isso, diz Tavares, existe chance de encontrar novas Carajás, a província mineral no Pará onde está o maior e de melhor qualidade depósito de ferro do mundo (18 bilhões de toneladas), além de reservas de cobre, ouro, urânio, manganês, níquel, zinco, prata, bauxita, cromo, estanho e tungstênio. É uma região maior que o estado do Rio de pura riqueza. Só o Projeto Salobo, da Vale, em Carajás tem 70 milhões de toneladas de cobre e contribui para reduzir a dependência do Brasil em importações.

- As estimativas são grandiosas. Mas falta conhecer mais. O Alto Rio Negro e a Cabeça do Cachorro têm potencial grande para metais de altíssimo valor. Toda a Calha Norte é de extremo interesse, a última fronteira de exploração mineral do Brasil. Mas ninguém sabe direito o que há lá e a região está coalhada de garimpos ilegais. E temos o desafio de compatibilizar o desenvolvimento com a preservação da floresta. Isso pode ser feito, mas precisa de pesquisa e conhecimento - frisa ele.

No fim do governo Temer, a tentativa de extinção Reserva Nacional do Cobre e Associados (Renca), entre o Amapá e o Pará, chamou a atenção para a riqueza do subsolo da floresta. O manganês e o ouro são até mais importantes lá do que o cobre, diz Bruno Feigelson, consultor do setor e especialista em direito minerário.

A Renca, porém, compreende áreas de sete unidades de conservação, incluindo duas terras indígenas, uma delas a dos Waiãpi, invadida por garimpeiros e que teve o cacique assassinado no mês passado em circunstâncias ainda não esclarecidas. A Renca está fora do alcance da mineração industrial legal e infestada de garimpos ilegais de ouro e urânio, que despejam cianeto, mercúrio e material radioativo nos rios, afirma Leonardo Brito, titular da Delegacia de Meio Ambiente do Amapá até o início deste ano e que adotou formas inovadoras de fiscalizar o desmatamento.

Distinção de atividades
A distinção entre garimpo e mineração industrial é chave para a Amazônia, frisam especialistas. Enquanto o primeiro está associado a condições análogas à escravidão, desmatamento, invasões de terra, prostituição e poluição dos rios, só a segunda tem condições de gerar desenvolvimento, com empregos e impostos, frisam especialistas como Feigelson e Tavares. Um exemplo é Alta Floresta (MT), onde o garimpo de ouro tem vínculo com a expansão da fronteira agrícola.

O diretor da Associação Brasileira de Empresas de Pesquisa Mineral (ABPM), Luis Maurício Azevedo, concorda e diz que o governo precisa ir do discurso à prática:

- Não há estímulo à iniciativa privada para investir e prospectar. Pesquisa mineral é uma atividade de alto risco. A Amazônia sempre foi sedutora, o potencial é enorme, mas sem investimento em infraestrutura e à pesquisa não passará disso.

Ele frisa que os garimpos - além de serem, por vezes, ilegais - não pagam impostos proporcionais, não têm obrigações legais com o meio ambiente e não geram empregos decentes:

- O garimpeiro rico joga cianeto nos rios. O pobre, mercúrio. Isso é trocar veneno de rato por tiro. E é uma competição desleal com as empresas que podem gerar desenvolvimento. Se quisermos falar com seriedade de exploração da Amazônia, o primeiro passo é distinguir mineração e garimpo - salienta Azevedo, que cita falta de investimento em mapeamentos e tecnologia de qualidade:

- O presidente fala em parcerias com os EUA, mas são o Canadá e a Austrália detêm a maior tecnologia minerária - acrescenta.

O relatório 20-F, da Vale, para investidores estrangeiros, por exemplo, destaca a falta de infraestrutura como um risco do investimento em Carajás. A riqueza existe. Mas ainda como no século XVI, continua-se sem saber onde ela está ou deve ser explorada.

O Globo, 05/08/2019, País, p. 8

https://oglobo.globo.com/brasil/exposta-ao-garimpo-amazonia-tem-potenci…

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