VOLTAR

A alma da floresta

CB, Caderno C, p. 3
19 de Abr de 2004

A alma da floresta
Centro Cultural Banco do Brasil no Rio de Janeiro abre hoje, Dia do Índio, coletiva sobre os xamãs, líderes espirituais do povo yanomami

Renata Caldas
Da equipe do Correio

Na data em que se comemora o Dia do Índio, chega ao Brasil exposição inusitada. Yanomami, o espírito da floresta expõe visão particular de 13 artistas de nacionalidades diferentes sobre mistérios que envolvem a parte espiritual dessa comunidade da Amazônia. A exposição tem abertura hoje e vai até 20 de junho no Centro Cultural Banco do Brasil do Rio de Janeiro, sem previsão de passar por Brasília ou São Paulo.

São fotografias, filmes, pinturas, esculturas e instalações. Na mostra, não há ornamentos de plumas ou qualquer artesanato indígena característico. As obras mergulham nos xamãs yanomami. Como líderes espirituais, os xamãs têm atividades como curar, proteger integrantes da comunidade e cuidar de espíritos. Rituais complexos ligados aos mortos constituem um dos pilares desse povo. Os artistas de Yanomami, o espírito da floresta se debruçaram, cada qual com sua particularidade, nesse aspecto.

Para captar o distante ''espírito da floresta'', cinco artistas (dos 13 participantes) foram recebidos pelos yanomami numa casa coletiva dos Watoriki thëripë, os ''habitantes da montanha do vento''. Raymond Depardon, Stephen Vitiello, Gary Hill, Wolfgang Staehle e a brasileira Adriana Varejão conviveram uma semana com os índios, acompanhados pelo antropólogo Bruce Albert, um dos curadores da mostra. Artistas que não tiveram contato direto com os yanomami desenvolveram trabalhos a partir de material produzido pelos índios.

''O que mais me chamou atenção foi a mitologia yanomami. A quantidade de mitos é incrível, deve ser equivalente à mitologia grega, mas não conhecemos. Eles não têm tradição escrita'', observa Adriana Varejão. Para a mostra coletiva, a artista concebeu obras que dialogam com referências xamânicas.

Em pinturas a óleo, Varejão seguiu linha de ''ficção histórica'': ''Desenvolvi o trabalho como se fosse um artista viajante. Incorporei esse personagem citando situações da História, mas com elementos da mitologia yanomami''.

Outras obras utilizam recursos tecnológicos. O músico eletrônico Stephen Vitello, por exemplo, criou dispositivo sonoro com vibrações e vozes referentes ao som da floresta. Com recursos multimídia, Wofgang Staehle apresenta paisagem surreal tomando como referência evocações de visões xamânicas. Naoki Takizawa criou a instalação A floresta dos espelhos, com fusão de imagens mitológicas de animais e plantas. No projeto, os artistas tiveram apoio de Davi Kopenawa, xamã e porta-voz dos yanomami no Brasil.

Engajamento
O ponto de partida do projeto surgiu do trabalho desenvolvido pela fotógrafa suíça naturalizada brasileira Claudia Andujar. Em 2000, durante a Bienal de Artes Plásticas em São Paulo, ela conheceu Hervé Chandès, diretor da Fundação Cartier, curador da coletiva. ''Naquela época, ele conheceu o meu material yanomami, achou interessante e disse que topava fazer exposição, mas precisava de tempo para estruturá-la'', recorda a fotógrafa. Desde o final da década de 1970, Andajur se engaja em questões de proteção ao povo yanomami.

''Não há como explicar o aprendizado que tenho tido com os yanomami. Me sinto à vontade naquele mundo. Ali, me encontrei como ser humano'', diz a artista, que decidiu tornar-se brasileira para facilitar a permanência ao lado dos índios. No Brasil, existem cerca de 13.600 yanomami, divididos em mais de 185 aldeias. A palavra yanomami quer dizer justamente ''ser humano''.

Yanomami, o espírito da floresta ficou exposta em Paris até outubro do ano passado, com organização da Fundação Cartier. No Rio de Janeiro, a mostra faz parte das comemorações dos 15 anos do Centro Cultural Banco do Brasil.

YANOMAMI, O ESPÍRITO DA FLORESTA
Exposição coletiva aberta até 20 de junho. Centro Cultural Banco do Brasil, no Rio de Janeiro (Rua 1o de Março, 66). De terça a domingo, das 10h às 21h. Entrada franca. Informações: (21) 3808-2020.

CB, 19/04/2004, Caderno, p. 3

As notícias aqui publicadas são pesquisadas diariamente em diferentes fontes e transcritas tal qual apresentadas em seu canal de origem. O Instituto Socioambiental não se responsabiliza pelas opiniões ou erros publicados nestes textos. Caso você encontre alguma inconsistência nas notícias, por favor, entre em contato diretamente com a fonte.