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Agricultor constrói estradas no MT

GM, Agribusiness, p. B10
18 de Nov de 2003

Agricultor constrói estradas no MT
Produtores prevêem investir R$ 1 bilhão para pavimentar 2,4 mil quilômetros no estado.

O agricultor Orcival Guimarães, de Lucas do Rio Verde (MT), já perdeu as contas das vezes em que mandou o trator socorrer carretas de soja atoladas na estrada de terra. "Quando chove muito, a estrada fica intransitável", diz o produtor, que na safra passada expediu quase 400 carretas carregadas de grãos para o porto de Paranaguá (PR), distante 2.100 quilômetros.
Para esta safra, a história é outra. Guimarães e um grupo de 250 agricultores se uniram para asfaltar os 96 quilômetros da rodovia que liga Lucas a Tapurah. Cada um deles investiu na moeda que melhor conhece: a soja. Com uma contribuição que varia de 1 a 3 sacas por hectare plantado - e a soja cotada ao preço atraente de R$ 40 a saca -, não foi difícil levantar os R$ 28 milhões necessários para a obra. "No começo, não acreditei que as obras iriam para a frente. Mas hoje, dirigindo sobre este asfalto macio, me tornei um dos maiores defensores desse tipo de iniciativa", diz o agricultor, que deve plantar 8,5 mil hectares de soja e 7,1 mil hectares de algodão nesta safra, uma área equivalente a pouco mais de três Dinamarcas.
Assim como Guimarães, produtores de norte a sul do Mato Grosso, o estado número 1 na produção de soja no Brasil, arregaçaram as mangas e constituíram 25 consórcios para a construção de 21 estradas ligando vastas áreas produtoras às principais rodovias, a BR-163 e a BR-364. As obras são tocadas em parceira com o governo do estado.
Já foram assinados contratos para asfaltar 1.020 quilômetros de estradas nos próximos três anos, dos quais 289,6 quilômetros serão entregues ainda em 2003. "Esse é apenas o começo. Estamos trabalhando duro para fechar novos convênios com agricultores e asfaltar 2.440 quilômetros até 2006", diz Cloves Vettorato, secretário extraordinário de projetos estratégicos do governo do Mato Grosso. Ou seja, serão investidos R$ 1 bilhão, dos quais R$ 350 milhões virão do bolso dos produtores e R$ 650 milhões do Fundo de Transporte e Habitação (Fethab). O curioso é que o Fetahb é composto por contribuições dos agricultores sobre a produção de soja, madeira, boi, algodão e diesel. No caso do agricultor, ele paga R$ 4,50 de imposto por tonelada de soja produzida. "Na prática, o dinheiro do Fethab também vem do bolso do agricultor", diz Guimarães.
Malha rodoviária
Os agricultores vão dar sua contribuição para a melhoria do transporte no Mato Grosso, um dos estados com uma das piores malhas rodoviárias do País: apenas 7,4% dos 26.500 quilômetros de rodovias estaduais foram pavimentados, ou seja, para cada quilômetro de rodovia pavimentada, há outros 13,6 quilômetros de estradas de chão batido. Para se ter uma dimensão da iniciativa dos produtores, essas obras correspondem a 35% do total a ser asfaltado em todo o País em 2003, segundo Vettorato.
As estradas dos produtores tiveram seu trajeto ligeiramente modificado em relação ao projeto original. A rodovia de Lucas a Tapurah, por exemplo, seria de 15 a 20 quilômetros mais curta, porém foi alongada para beneficiar o maior número possível de produtores.
Na época das chuvas, as carretas levavam de 2,5 a 3 horas para percorrer os 96 quilômetros, a uma velocidade de até 40 km por hora. Livres das "costelas" na pista, as carretas poderão fazer o mesmo percurso em uma hora. "Diminui não só o tempo, mas também o frete, que é um dos principais componentes do custo", diz o agricultor Adilton Sachetti. "Essa estrada vale cada centavo. É o melhor investimento do mundo: ele se paga em uma safra", afirma.
Adilton Sachetti, que planta nos municípios de Sapezal e Itiquira, será beneficiado pela pavimentação da MT-299 (Ouro Branco a Itiquira), de 47 quilômetros e distante, respectivamente, 8 e 34 quilômetros de duas de suas nove fazendas.
Para Sachetti, a matemática que justifica o investimento é simples. Na safra passada, ele pagou R$ 50 pelo transporte de cada uma das 50 mil toneladas de calcário que comprou para correção da acidez do solo. Se a estrada estivesse asfaltada, o custo teria sido 20% menor por tonelada, de R$ 40. Ou seja, Sachetti poderia ter economizado, apenas com o frete, R$ 500 mil numa única safra.
"Só quem está no campo sabe o que é a dificuldade de percorrer estradas de terra todos os dias", diz Guidone Dallastra, de Campo Verde (MT), um dos membros da Associação dos Beneficiários da Rodovia do Desenvolvimento. A associação se reuniu para asfaltar a MT-140, estrada de 87 quilômetros que liga Campo Verde a Nova Brasilândia.
Dallastra sabe do que está falando. Todo ano, na época da colheita do algodão, entre os meses de julho e agosto, logo cedo, às 5 horas da manhã, quando o dia começa a clarear no Mato Grosso, um de seus caminhões percorria a rodovia jogando água na estrada de terra. O objetivo: baixar a poeira. "Se o algodão está muito sujo de terra, ele pode perder até 10% de seu valor. E com esses caminhões passando na estrada e jogando terra nas lavouras, eu não tinha outra alternativa a não ser fazer a poeira baixar", diz.
Fotos de satélites
A operação que está viabilizando a construção das estradas no interior do estado é simples. Primeiro, os produtores rurais, munidos de fotos de satélite, identificaram a localização e o tamanho de cada uma das fazendas que seriam beneficiadas pelo asfalto e as dividiram em três grupos. Agricultores com propriedades localizadas a menos de cinco quilômetros do asfalto teriam que contribuir com uma taxa única de 3 sacas de soja por hectare. Fazendas localizadas a uma distância de cinco a dez quilômetros cooperam com 2 sacas e aquelas situadas de dez a quinze quilômetros do asfalto colaboram com uma saca de soja por hectare.
Para garantir a contribuição efetiva - e sem volta -, os agricultores que aderirem assinam uma Cédula de Produto Rural (CPR), registrada em cartório, em que se comprometem a pagar, em uma determinada safra, o valor previamente acertado.
Depois, eles realizam uma licitação para contratar as empreiteiras que vão tocar a obra. Nesta fase, eles tiveram uma grata surpresa. "O nosso custo por quilômetro é quase um terço da média do governo federal", diz Guidone. O quilômetro dos produtores ficou entre R$ 120 mil e R$ 150 mil. Como comparação, as obras da BR-364, no trecho que liga Sapezal a Comodoro, saíram por R$ 560 mil o quilômetro. Os produtores conseguiram, portanto, uma redução de 70% na comparação com as obras da União.
Além de se livrarem dos buracos, os agricultores esperam que ocorra uma natural valorização de suas terras. "Dependendo da localização, a valorização da propriedade poderá ser de 10%, chegando a até 30%", diz uma fonte do governo.
Que fique claro que nem todos os agricultores aderiram ao programa de construção de estradas. Mas isso não é um empecilho para os consorciados. "Telefonamos para aqueles que ainda não entraram. Não desistimos nunca", diz Guidone.
Dentro dos convênios entre agricultores e governo do estado, os produtores bancam as obras de subbase, base, drenagem, tratamento isolante e até o plantio de grama nas laterais, para evitar que o asfalto se esfacele com as chuvas. Ao Estado cabe fazer o projeto da estrada, o acabamento, ou seja, passar a capa asfáltica, e pagar 50% do diesel usado, com recursos do Fethab.
Expansão da produção
O governo do Mato Grosso espera, com a obra, dar vazão à crescente safra de grãos do estado, notadamente a soja. A produção de soja, que era de 4,97 milhões de toneladas em 1993, pode chegar a 13,7 milhões neste ano-safra. A meta do estado é ambiciosa: chegar a 40 milhões de toneladas nos próximos dez anos.

GM, 18/11/2003, Agribusiness, B10

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