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Agentes Agroflorestais Indigenas: reconhecimento e compromisso


Autor: Marcelo Piedrafita e Txai Terri Vale Aquino
17 de Jun de 2001

Nos últimos cinco anos, vem surgindo novo ator social nas terras indígenas do Acre: o agente agroflorestal indígena. Sua formação, bem como a assessoria às suas atividades nas aldeias, têm sido realizadas pelo Setor de Agricultura e Meio Ambiente da Comissão Pró-Índio do Acre (CPI-Acre), organização não governamental com 22 anos de atuação no estado.
Há hoje 56 agentes agroflorestais em atuação em 15 terras indígenas do Acre e do Sul do Amazonas. Habitadas por 5.400 índios dos povos Kaxinawá, Manchineri, Katukina, Yawanawá, Shawãdawa, Ashaninka e Apurinã, estas terras têm extensão agregada de 1.327.526 ha.
Recursos do Projeto Demonstrativo (PD/A), da Secretaria de Coordenação da Amazônia/MMA e do Instituto de Meio Ambiente do Acre, no âmbito do Plano de Gestão Ambiental Integrada (PGAI), têm sido direcionados para apoiar este projeto inovador de gestão ambiental em terras indígenas da Amazônia brasileira.
Neste período, foram realizados sete cursos de capacitação no Centro de Formação dos Povos da Floresta, que a CPI-Acre dispõe na cidade de Rio Branco, além de quatro oficinas itinerantes em terras indígenas.
A partir de diagnósticos do uso dos recursos naturais e dos conflitos socioambientais nas terras indígenas, os agentes agroflorestais têm coordenado ações práticas voltadas para a vigilância dos limites de seus territórios, a gestão ambiental, cultural e ecologicamente adequada da floresta e a garantia da segurança alimentar nas suas aldeias. Para tal, têm implementado alternativas de produção e manejo agroflorestais, com a construção de viveiros, a produção de mudas, o enriquecimento de capoeiras, terreiros e quintais com árvores frutíferas e espécies de uso cotidiano, a recuperação de áreas degradadas com adubação verde e espécies nativas, técnicas biológicas de combate a pragas, a implantação de hortas orgânicas e o manejo sustentado de palmeiras e palheiras.
Uma vertente marcante da formação dos agentes agroflorestais tem sido a atividade de artes e ofícios, orientada por Renato Antonio Gavazzi, na qual se tem delineado alternativas de reutilização e agregação de valor de madeiras desvitalizadas, antes desperdiçadas como subproduto das atividades agrícolas, ou deixadas nas margens dos rios pelas águas das chuvas. As madeiras são transformadas em obras de arte e mobiliário, com designs étnicos originados em mitos e histórias de antigamente dos povos indígenas acreanos. Tais obras têm sido comercializadas em Rio Branco e outras cidades do país e no ano de 2000 foram expostas no Módulo Artes Indígenas, da Mostra do Redescobrimento Brasil + 500.
Reconhecimento Durante o II Encontro das Culturas Indígenas do Acre e Sul do Amazonas, realizado em abril passado, o governo estadual, a CPI-Acre e a UNI assinaram uma declaração de compromisso, que reconheceu a categoria do agente agroflorestal indígena. Esta iniciativa veio atender antiga demanda do movimento indígena, dos próprios agentes agroflorestais e das organizações não governamentais de apoio.
Há hoje 33 agentes agroflorestais formados pelo programa da Comissão Pró-Índio, portanto, aptos a serem reconhecidos pelo governo estadual. Na declaração, o governador Jorge Viana assumiu o compromisso de assegurar, anualmente, recursos orçamentários para garantir a formação de agentes agroflorestais de 15 terras indígenas, bem como em outras ainda não contempladas pelos cursos de capacitação levados a cabo nos últimos cinco anos pela mencionada entidade. Estão em estudo, por outro lado, mecanismos legais para viabilizar a remuneração dos agentes agroflorestais pelos serviços ambientais e sociais que prestam em suas terras indígenas, com repercussão em todo o estado, no país e no planeta.
No dia 6 de junho passado, esculturas em madeira reciclada feitas por esses agentes agroflorestais indígenas foram um dos grandes destaques no evento Negócios para Amazônia Sustentável, realizado no Jardim Botânico do Rio de Janeiro. Na ocasião, foram vendidas várias esculturas. Uma delas foi comprada pela atriz Cassia Kiss, da rede Globo de televisão, por R$ 4 mil. Outras custaram entre R$ 1 mil e R$ 2 mil.
O evento, patrocinado pela Secretaria de Coordenação da Amazônia do Ministério do Meio Ambiente, marcou o lançamento do Projeto Negócios Sustentáveis, que conta com recursos financeiros do Reino dos Países Baixos, do Programa Piloto para a Proteção das Florestas Tropicais do Brasil (PPG-7) e do governo brasileiro. Este projeto visa estimular o setor empresarial a investir em oportunidades de negócios sustentáveis na Amazônia, ao divulgar experiências bem sucedidas e viabilizar apoio técnico para empreendimentos desta natureza.
Compromisso No dia 4 de junho, teve início no Centro de Formação dos Povos da Floresta o VII Curso de Formação dos Agentes Agroflorestais Indígenas, que terá duração de 45 dias e a participação de 38 agentes de 14 terras indígenas acreanas e uma do sul do Amazonas. Infelizmente, a inadimplência do IMAC junto ao PGAI, de quase 200 mil reais, colocará em risco o andamento de uma série de programas e ações levadas a cabo pelo governo do estado, algumas em parceria com organizações não governamentais e institutos de pesquisa. Tendo em vista o reduzido valor dos recursos previstos para apoiar a realização do VII Curso, alternativas devem ser prontamente mobilizadas para não prejudicar atividades já previstas, que têm grandes benefícios sociais e ambientais e casam com os objetivos de desenvolvimento sustentável tão propagadas pelo Governo da Floresta.
O reconhecimento oficial dos agentes agroflorestais formaliza o apoio do Governo da Floresta para a continuidade da formação destes agentes, com proposta curricular específica, sua legitimação como agentes de fiscalização credenciados, a remuneração de seus serviços sociais e ambientais, bem como o fortalecimento de experiências produtivas que contribuem para a sustentabilidade e vigilância das terras indígenas. Honrar as promessas e acordos formalizados perante as lideranças e organizações indígenas do estado naquela ocasião parece, portanto, passo fundamental para viabilizar mais uma política pública coerente com as atuais demandas e necessidades das populações indígenas acreanas.
Os 38 agentes agroflorestais, presentes ao VII Curso de Formação, estão realizando discussões cotidianas entre si, algumas delas com a assessoria do advogado João Veras e a participação de representantes de outras entidades indígenas, visando criar a sua própria associação ou organização. Querem defender diretamente, junto aos órgãos estaduais e federais responsáveis pelo meio ambiente, cultura e produção, os trabalhos que há cinco anos vêm desenvolvendo em suas terras e florestas.

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