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Acordo bilionário à vista

O Globo, País, p. 3
19 de Jan de 2016

Acordo bilionário à vista
Governo e empresas iniciam negociação para elaborar plano de recuperação do Rio Doce

Leticia Fernandes

BRASÍLIA - O governo federal anunciou nesta segunda-feira que aceita negociar e fechar um acordo para a recuperação do Rio Doce com as empresas envolvidas no desastre ambiental causado pelo rompimento da barragem do Fundão em Mariana (MG). O desastre, considerado o maior da História envolvendo barragens de rejeitos de mineração, deixou pelo menos 17 mortos e duas pessoas desaparecidas. O governo negocia com a Samarco e com suas controladoras: a brasileira Vale e a australiana BHP Billiton.
Após reunião nesta segunda com a presidente Dilma Rousseff e com o presidente da Vale, Murilo Ferreira, que falou em nome das empresas, o advogado-geral da União, Luís Inácio Adams, e a ministra do Meio Ambiente, Izabella Teixeira, disseram que esperam uma definição sobre o acordo, em fase inicial de discussão, até o início de fevereiro. Ainda não foi definido o teor desse acordo, mas o governo considerou o aceno das empresas um sinal "muito positivo". Também participaram da reunião os governadores de Minas, Fernando Pimentel (PT), e do Espírito Santo, Paulo Hartung (PMDB), e os ministros Jaques Wagner (Casa Civil) e Eduardo Braga (Minas e Energia).
- É uma iniciativa de buscar um acordo, e temos de fato a possibilidade de fazê-lo, estamos em processo de conversa com as empresas. Entendemos que esse acordo tem que responder a uma governança efetiva do processo de recuperação, feita basicamente pelo setor privado, um sistema de financiamento claro, que garanta que as ações serão sustentadas economicamente, e a definição de ações que vão mostrar claramente a implementação do processo de recuperação - disse Adams.
Em novembro, procuradores da União, com a procuradoria de Minas e do Espírito Santo, protocolaram ação civil pública cobrando a criação de um fundo de R$ 20 bilhões para reparar os danos causados pela tragédia em Mariana. As três empresas teriam que fazer um depósito inicial de R$ 2 bilhões.
No fim de dezembro, a Advocacia Geral da União (AGU) obteve na Justiça uma liminar em seu favor, determinando que a Samarco deposite os primeiros R$ 2 bilhões em contas judiciais para iniciar, assim, a reparação dos danos ambientais e indenização às pessoas afetadas pelo acidente.
Na mesma decisão, a Justiça decretou indisponíveis as licenças de concessão de exploração da Vale e da BHP, controladoras da Samarco. Segundo a ministra do Meio Ambiente, foi após essa vitória do governo que elas se dispuseram a negociar.
- Entramos na Justiça, a União ganhou a liminar, e, como base da liminar, o juiz estabeleceu uma série de ações. Em função disso, estamos trabalhando juntos para encaminharmos todas elas. As empresas apresentaram hoje (ontem) a proposta de querer fazer um acordo de como vamos recuperar a bacia, qual o modelo de governança, qual o plano de recuperação e como será arrumado o financiamento disso. Nós pedimos como referência 20 bilhões de reais, a primeira parcela é de 2 bilhões - afirmou a ministra.
Antes do encontro, Jaques Wagner telefonou para o presidente da BHP Billiton, Andrew Mackenzie, a fim de abrir um canal de diálogo. Wagner comunicou a Mackenzie sobre a reunião que teria com Dilma naquele dia e pediu-lhe que trabalhasse por um entendimento entre as partes e para um bom gerenciamento do fundo a ser criado. Interlocutores de Wagner disseram que a conversa foi "amigável".
O ministro da AGU disse que o valor de R$ 20 bilhões é uma estimativa, e que essa cifra poderá ser maior. Segundo Adams, o importante não é "sentar numa montanha de dinheiro" e descapitalizar as empresas, mas garantir que ações efetivas sejam postas em prática o mais rapidamente possível:
- R$ 20 bilhões é uma estimativa, não existe número certo, pode ser mais, o importante é o foco nas ações. Nosso objetivo não é sentar numa montanha de dinheiro, mas ter ações - disse.
Também presente à reunião, o advogado-geral de Minas Gerais, Onofre Batista Junior, explicou que a ideia é cobrar ações das empresas envolvidas no rompimento das barragens, mas sem deixá-las sem dinheiro. A proposta é que o fundo seja gerido pela iniciativa privada, com orientação do governo, e verba das empresas envolvidas.
- É uma cobrança para que as empresas executem, mas sem descapitalizá-las. Hoje, você pede 3, 5 ou 10 bilhões e faz uma montanha de dinheiro, mas nós teríamos essa montanha de dinheiro para o setor público sentar em cima e tentar executar, e uma empresa descapitalizada que não faz nada. Essa é a inversão que desenha a proposta - disse o advogado.
Onofre Batista Junior também deixou claro que a disposição para se fazer um acordo não compromete, "em hipótese alguma", a recuperação integral dos danos ambientais causados à bacia do Rio Doce. Ele frisou que o que está em curso é uma junção de esforços para dar celeridade às ações:
- Uma questão que ficou muito evidenciada é que não se abre mão, em hipótese alguma, que a recuperação seja integral e que as medidas compensatórias sejam levadas a cabo. O grande esforço que se faz neste momento é a articulação de todos os esforços para que as ações sejam rápidas. Neste momento, se vê uma abertura das empresas para que se desenhe esse acordo - disse o advogado.

Governo agora decide cobrar de mineradoras seus planos de emergência

Evandro Éboli

BRASÍLIA - Quase três meses após o acidente em Mariana (MG), o Departamento Nacional de Produção Mineral (DNPM) baixou ontem portaria que estabelece prazo de 15 dias para que as mineradoras que operam com barragens no país apresentem ao órgão, vinculado ao Ministério de Minas e Energia, cópias de seus planos de emergência de barragem de mineração. Esses planos já são apresentados por lei às prefeituras e à Defesa Civil. Se não entregarem os documentos ao DNPM nesse prazo, ou se não elaborarem o plano, as empresas poderão ser interditadas.
Dados da Política Nacional de Segurança de Barragens, do DNPM, registram que 402 mineradoras operam no país. As empresas também terão que enviar ao departamento a declaração de condição de estabilidade da barragem. O diretor-geral interino do DNPM, Telton Elberto Corrêa, reconheceu que a medida tem relações com o acidente em Minas Gerais e que se trata de um "ajuste" na legislação. O departamento tem problemas de número de servidores para dar conta de toda fiscalização no país.
- Exatamente (tem relação com Mariana). São ajustes que estamos fazendo na normativa que regula o assunto - disse Telton Corrêa.
A portaria do DNPM determina, como medida preventiva, a interdição provisória das atividades de acumulação de água ou de disposição final ou temporária de rejeitos de mineração para as empresas que não se enquadrarem nas novas exigências. Quem for punido poderá ser liberado a voltar a utilizar as barragens, se cumprir as regras.
- Todas as empresas são obrigadas a apresentar, independentemente do risco, plano de emergência. O que estamos fazendo é disciplinando o que já é determinado. Todas já são obrigadas a apresentar, às prefeituras e à Defesa Civil, esses documentos. Para nós, terão que provar que fizeram isso - disse o diretor do DNPM.
auditoria começa por minas
O departamento anunciou que começou ontem o trabalho da auditoria contratada para avaliar as condições de segurança das 220 barragens de rejeitos em Minas Gerais, que representam mais da metade do total no país. Esse trabalho segue até o final de abril; a empresa contratada é especializada em geotécnica e mecânica de solos.
Telton Corrêa explicou que o trabalho começa em Minas em função do número de empresas desse tipo no estado, que conta com apenas 25 fiscais em seu corpo técnico.
"As condições das 220 barragens serão conhecidas pelo poder público, e depois o trabalho será estendido aos demais estados", afirmou, em nota do Ministério de M&inas e Energia.

PSDB defende licença de barragem; Aécio silencia

Maria Lima

BRASÍLIA - O presidente do PSDB e ex-governador de Minas Gerais, senador Aécio Neves, evitou dar declarações sobre o licenciamento da barragem do Fundão, da mineradora Samarco, concedido quando governava o estado. Quem falou em seu nome foi o PSDB de Minas. Em nota, o partido afirma que em junho de 2015, cinco meses antes do rompimento da barragem, o Conselho Estadual de Política Ambiental (Copam) aprovou o licenciamento para a realização de grandes obras nas barragens.
Segundo o partido, consequências dessa decisão "ainda não são conhecidas". Trata-se do "alteamento" da barragem de Fundão e a sua unificação com a barragem de Germano. "Tais licenciamentos contaram com o aval do Ministério Público Estadual. Isto demonstra que o processo feito anteriormente foi realizado de acordo com a legislação então vigente", diz a nota.
PSDB contesta subsecretário
O PSDB frisa que o atual subsecretário de Meio Ambiente de Minas, Geraldo Vitor Abreu, que deu entrevista ao "Fantástico" no último domingo sobre a ausência de projeto executivo da Samarco, em entrevista ao jornal "Hoje em Dia", de 5 de novembro, atestou a regularidade do licenciamento.
Segundo o PSDB, a Samarco apresentou um projeto básico para a fase de licenciamento prévio, cuja licença foi expedida em 2007, e, depois, apresentou a documentação necessária para se habilitar à fase de licença de instalação e operação. A nota diz que o processo teve parecer técnico e jurídico favoráveis e foi aprovado pelo Copam, instância colegiada que aprova licenças.
Outros órgãos de controle ambiental, como o Sistema Estadual de Meio Ambiente e Recursos Hídricos de Minas Gerais (Sisema) também teriam informado, em 6 de novembro, que a barragem do Fundão estava regular, tendo sido inspecionada por um auditor especialista em segurança de barragens", diz a nota.

O Globo, 19/01/2016, País, p. 3

http://oglobo.globo.com/brasil/acordo-vista-18501493

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